São Paulo, quarta-feira, 10 de setembro de 2008

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Crítica/teatro/"Dois Irmãos"

Peça delicada convida à obra de Hatoum

SÉRGIO SALVIA COELHO
CRÍTICO DA FOLHA

"Dois Irmãos", considerado pelo próprio Milton Hatoum o seu melhor livro, tem um universo bem característico: partindo da vivência do autor, narra a saga de uma família libanesa em Manaus, em um tom que vai da densidade arquetípica de "Grande Sertão: Veredas" ao humor poético de "Cem Anos de Solidão".
Bem resumido pelo dramaturgista Jucca Rodrigues, que mantém a estrutura épica da narrativa por flashbacks, o texto peca às vezes por redundância e literalidade excessiva, mas garante assim a pungente delicadeza do original.
O diretor Roberto Lage, além das marcas precisas, é particularmente feliz na escolha do elenco, tanto pelos tipos físicos quanto por suas personalidades. Jiddu Pinheiro e Gabriel Pinheiro, irmãos que vêm fazendo paralelamente uma carreira notável, são perfeitos para os gêmeos inimigos Omar e Yaqub, com suas caracterizações opostas (Omar/Jiddu, abusado e cínico; Yaqub/Gabriel, tímido e amargo), que diferenciam sua grande semelhança física.
A beleza índia de Vivianne Pasmanter, concentrada e triste, torna vivo o desejo dos irmãos pela criada Domingas, sem nenhuma concessão ao vulgar, enquanto Tatiana Thomé, fazendo a irmã solteirona Rânia, evita qualquer clichê com uma força interna que contrasta com seu tipo frágil.
Rodrigo Ramos como Nael, o filho de Domingas, narrador principal que busca saber qual dos dois irmãos é seu pai, está um pouco preso na responsabilidade de dar o tom pungente à narrativa, em contraste com Bete Correia, que alterna com desenvolto bom humor pequenos e variados personagens. Imara Reis faz a matriarca Zana com ternura solar, e Luiz Damasceno, na pele de Halim, o pai que escapa de qualquer clichê de melodrama por sua bonomia, seu amor sensual pela mulher, sua severidade com que oculta um tímido bom senso, atinge aqui um dos pontos mais altos de sua carreira.
O ponto fraco do espetáculo é o cenário, de Alexandre Toro.
Excessivamente simbólico, impõe que toda a ação ocorra sob gigantescas raízes, o que torna unívoco o tema da busca pelo passado. De qualquer forma, "Dois Irmãos" é um espetáculo marcante, que convida ao mergulho na obra de Hatoum.


DOIS IRMÃOS
Quando: qui. a sáb., às 19h30; dom., às 18h; até 5/10
Onde: Centro Cultural Banco do Brasil (r. Álvares Penteado, 112, tel. 0/xx/ 11/3113-3651)
Classificação indicativa: não recomendado para menores de 14 anos
Quanto: R$ 15
Avaliação: bom



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