São Paulo, segunda-feira, 10 de outubro de 2005

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IMPÉRIO DOS SENTIDOS

CCBB-SP abre na quarta "Erotica", que reúne desde obras de artistas do século 19 até contemporâneos

Exposição examina camadas do erotismo

FABIO CYPRIANO
DA REPORTAGEM LOCAL

No centro do cofre, dois trabalhos de Rosângela Rennó, da série "Afinidades Eletivas", marcam o percurso que a exposição "Erotica" pretende abordar. Nos trabalhos, dois casais heterossexuais têm seus papéis sexuais alterados, conforme se olha para as imagens. Irônica, a obra trata não só de desejos e fantasias mas também de condicionamentos sociais. A arte, aí, busca questionar tais limites.
"Erotica", emprestada do termo inglês, e por isso sem acento, significa uma reunião de imagens eróticas. A mostra que será inaugurada na próxima quarta no Centro Cultural Banco do Brasil, em São Paulo, aborda várias leituras que artistas fizeram do erotismo, do século 19 até o presente, com curadoria de Tadeu Chiarelli.
"Como sou historiador da arte, uso como ponto de partida o surrealismo, que foi o movimento que mais tratou da sexualidade. A partir daí, aplico uma visão alargada do automatismo psíquico usado pelos surrealistas, trato do interesse pelo vulgar, o pornográfico, além de explorar a beleza convulsiva, isto é, a idéia de Bretton que vê a realidade como representação", conta Chiarelli.
Assim, ao redor do cofre, no subsolo do CCBB, Chiarelli apresenta uma série de trabalhos que tratam de relações sexuais, em suas várias possibilidades, heterossexual ou homossexual, tendo como destaque o brasileiro Ismael Nery (1900-1934), ao lado de surrealistas, como Andre Masson, Francis Picabia e Paul Eluard.
"Sempre quis apresentar Nery com a turma dele, ele está no mesmo nível dos surrealistas", conta Chiarelli. Traços urgentes e orgânicos são características comuns desses artistas, marca do automatismo surrealista.
Também nessa seção, uma série de nomes contemporâneas ganha espaço, do jovem artista de Goiânia Pitágoras à megastar da fotografia, Nan Goldin, presente em apenas uma imagem. Como em toda coletiva, certos artistas tornam-se apenas ilustração de teses, quando sua obra em conjunto não é exibida.

Corpo decomposto
Já no segundo andar do centro cultural, Chiarelli apresenta "o interesse fetichista na decomposição do corpo humano", como ele mesmo afirma, em obras que, na maior parte dos casos, representam falos, vulvas ou nádegas, para usar os termos politicamente corretos dos órgão genitais.
Uma licença poética é usada nessa seção, em que o curador apresenta objetos com caráter arqueológico e cerâmicas peruanas pré-colombianas. Tais objetos, possivelmente dedicados a ritos de fertilidade, portanto sem um caráter erótico, ganham, agora, ares pornográficos: "Elas tinham uma função nas tribos que eu, deliberadamente, não estou vendo", conta o curador.
Nesse módulo, os destaques ficam por conta das fotografias de Thomas Ruff e Hans Bellmer -este influenciou os trabalhos com bonecas de Cindy Sherman e abriu caminhos para a compreensão da obra de Robert Mapplethorpe-, além das imagens de terços que se estruturam como falos, de Márcia X.
Numa subseção do módulo, Chiarelli apresenta obras que tratam do voyeurismo, desde o acadêmico Eliseu Visconti, até o mais voyeuristas dos brasileiros, o fotógrafo Alair Gomes, com suas imagens de garotos em Copacabana. Há aí ainda trabalhos de Anita Malfatti e aquarelas recentes do norte-americano Eric Fischl.
Finalmente, o curador dedica o espaço no terceiro andar para o "auto-erotismo", em fotografias de Duane Michaels, sobre o mito de Narciso, e em um vídeo de Tomas Glassford, beijando-se num espelho, entre outros.
No conjunto, "Erotica", apesar do nome, é mostra bem comportada. "Optei por lidar com o menos óbvio. O importante desses trabalhos que estão aí, é que eles instigam o olhar. Acho que até a Sheila Mello está aqui, mas melhor do que nas bancas de revista", diz o curador.

Palavras e imagens
A exposição conta ainda com dois ciclos paralelos, um de conferências e outro de filmes, sem programação divulgada. As conferências ocorrem nos dias 18, 20 e 21 de outubro, às 19h30, e nos dias 6, 8 e 9 de dezembro, no mesmo horário, abordando sempre temas relacionados ao erotismo, a começar pela arte e passando pelos temas história, civilização e cultura brasileira, entre outros.
Como conferencistas, participam pensadores como Nicolau Sevcenko e José Miguel Wisnik, além do próprio curador da exposição. A entrada é gratuita mediante retirada de senha, distribuída meia hora antes do início da palestra.
Depois de janeiro, a mostra segue para os CCBBs do Rio e de Brasília, onde também serão elaborados ciclos de palestras. "Em cada um desses locais, os temas serão diferentes, para que no final da mostra, possamos editar um livro com todas as conferências", conta Chiarelli.


Erotica - Os Sentidos na Arte
Quando: abertura na quarta-feira, dia 12, às 15h; de ter. a dom., das 10h às 21h; até 8 de janeiro
Onde: Centro Cultural Banco do Brasil (r. Álvares Penteado, 112, centro, SP, tel. 0/ xx/11/3113-3651)
Quanto: entrada franca
Patrocínio: BB Seguros - Companhia de Seguros Aliança do Brasil


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