São Paulo, sexta-feira, 10 de outubro de 2008

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Crítica/"Fatal"

Adaptação de obra de Philip Roth se limita a bons atores e imagens "bonitas"

CÁSSIO STARLING CARLOS
CRÍTICO DA FOLHA

Comparar romances a filmes adaptados virou uma fórmula fixa na qual os longas sempre saem perdendo. "Fatal", baseado em "O Animal Agonizante", de Philip Roth, não escapa dessa "fatalidade". Pode-se argumentar interminavelmente que literatura e cinema são linguagens narrativas distintas, que a riqueza expressiva da primeira sempre estará adiante em relação à delimitação determinada pelas imagens; em resumo, que mimetizar é perda de tempo.
No caso de adaptações como "Fatal", contudo, o que se conserva é apenas o efeito grife de um autor literário (neste caso, de imenso prestígio). O que há de mais autêntico numa obra, seu "espírito", soçobra sob o efeito de uma pátina artística cuja função é emular o que havia de distinto na origem.
Para o roteirista Nicholas Meyer (que assina o roteiro de "Revelações", a desastrosa versão cinematográfica de "A Marca Humana", de Roth), seria preciso se ater ao essencial. E a "essência literária", neste caso, é interpretada como "trama". Então somos entregues ao envolvimento do professor David Kepesch com a irresistível Consuelo, uma aluna 30 anos mais jovem. Os primeiros flertes, a cautela diante do risco de acusação de assédio sexual, a sedução, o envolvimento, a ruptura e o reencontro, todos os passos da paixão estão reconstituídos no filme em sua compulsão de fidelidade.
Nem mesmo a voz literária é descartada, num esforço de preservar a força reflexiva de Kepesch, mantida no filme com uma voz over, fala que comenta as experiências. Tal esforço de fidelidade, no entanto, anuncia a fragilidade da idéia de adaptação nele adotada, sua impotência em converter em cinema a potência expressiva do texto de Roth. O limite disso converte Kepesh (e a vitalidade do desejo, verdadeiro protagonista do romance) num existencialista em crise da meia-idade. Feita essa redução de riscos, a diretora espanhola Isabel Coixet pode exercitar sua especialidade: criar imagens "bonitas" e deixar os atores impregnarem os papéis com seus talentos (e, neste caso, Ben Kingsley e Penélope Cruz valem o ingresso).


FATAL
Produção: EUA, 2008
Direção: Isabel Coixet
Com: Ben Kingsley, Penélope Cruz
Onde: estréia hoje nos cines Espaço Unibanco, UOL Lumière e circuito
Classificação indicativa: não recomendado para menores de 14 anos
Avaliação: regular



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