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crítica
Morte ganha concretude, mas falta renascimento
PEDRO BUTCHER
CRÍTICO DA FOLHA
Pedro Almodóvar já renasceu algumas vezes
como cineasta. A primeira foi em 1988, com "Mulheres à Beira de um Ataque
de Nervos", que marcou sua
afirmação definitiva fora da
Espanha. A segunda foi em
1995, com "A Flor do Meu
Segredo", quando ele abandonou uma certa ênfase no
humor debochado para se
aprofundar no melodrama.
Esse aprofundamento
chegou ao ápice em "Tudo
sobre Minha Mãe" (1999) e
"Fale com Ela" (2002), duas
obras-primas, mas começou
a dar sinais de desgaste em
"Má Educação" (2004).
"Volver", em vários sentidos, é mais bem resolvido
que "Má Educação", mas
continua apontando para um
certo fastio no exercício melodramático e para a necessidade de um novo renascimento artístico.
Que não haja dúvidas: estamos falando de um dos melhores cineastas em atividade no mundo, e "Volver" ainda está cheio de suas melhores qualidades. Elas aparecem, principalmente, na recusa por um julgamento moralista dos atos de seus personagens; no olhar generoso,
porém não indulgente, sobre
as fraquezas do ser humano;
na composição dos planos e
na escolha da palheta de cores ("Volver" tem uma fotografia especialmente inspirada, de José Luiz Alcaine), e
na excelência da encenação e
da direção de atores.
"Volver" -voltar- marca
a volta do cineasta à região de
La Mancha, onde ele nasceu.
É ali que ele situa boa parte
da saga de sua heroína Raimunda (Penélope Cruz, em
composição visivelmente
inspirada em Sophia Loren).
O filme marca também um
reencontro com Carmen
Maura, atriz-fetiche de sua
primeira fase, com quem ele
não trabalhava desde "Mulheres à Beira...". Nesse reencontro, a morte, em outros
filmes um tema periférico,
assume um papel central.
Em "Volver", a morte ganha uma concretude poucas
vezes vista no cinema. Almodóvar procura traduzir, cinematograficamente, o sentimento que nos enche depois
da perda de uma pessoa querida, aquela espécie de presença que se faz ver pela ausência, pelos signos deixados
pelos mortos, pelos rastros
que ficam sobre a terra com a
ausência do corpo.
Em vários momentos, Almodóvar traduz essa sensação com clareza absoluta, demonstrando o pleno domínio que tem sobre a linguagem. Em outros, parece não
saber muito bem para onde
ir, principalmente quando a
história caminha para seu final, anticlimático. À medida
em que o filme perde o rumo,
perde também a emoção
-algo que não faltava, absolutamente, a "Tudo sobre
Minha Mãe" e a "Fale com
Ela". E que nos deixa aquela
ponta de decepção quando a
projeção chega ao fim.
VOLVER
Direção: Pedro Almodóvar
Produção: Espanha, 2006
Com: Carmen Maura, Penélope
Cruz e Lola Dueñas
Quando: hoje, nos cines Bristol,
Morumbi, Kinoplex Itaim e circuito
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