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LIVROS
ROMANCE
Mais recente obra do escritor argentino trata dos atentados a instituições judaicas em Buenos Aires nos anos 90
Com ficções, Aguinis incomoda a história
SYLVIA COLOMBO
EDITORA DO FOLHATEEN
Dois livros sobre a intolerância.
O primeiro expõe os horrores da
Inquisição, no século 17, o segundo, os do Terror, no final do 20.
Ambos se passam na América Latina e nascem da pena do mesmo
autor, o argentino Marcos Aguinis, 70. Conhecido pelo best-seller
"O Atroz Encanto de Ser Argentinos" (Bei, 2002), um exame sociológico sobre a tão célebre presunção argentina e as razões pelas
quais os distúrbios políticos e,
principalmente, econômicos
moldaram o "espírito" argentino,
Aguinis aparece agora no Brasil
em sua faceta propriamente literária. "A Saga do Marrano" (1991)
e "Assalto ao Paraíso" (2002) são
romances históricos que buscam
dialogar com os dias de hoje.
O segundo, e mais recente, trata
dos atentados contra instituições
judaicas -embaixada de Israel e
Amia- ocorridos nos anos 90.
De Buenos Aires, Aguinis trocou e-mails com a Folha sobre
ambos. Leia trechos da entrevista.
Folha - Os dois livros tratam do
tema judaico na Argentina. Existe
algum diálogo entre eles?
Marcos Aguinis - Ambos excedem a temática judia, pois referem-se às complexidades humanas e ao fanatismo. "Assalto ao
Paraíso" não tem nenhum personagem judeu, ainda que o pano de
fundo seja o dos atentados contra
instituições judaicas. Já "A Saga
do Marrano" é uma condenação a
todo tipo de discriminação.
Folha - Você toma emprestadas
da realidade algumas coisas, mas
adiciona a elas elementos ficcionais. Como maneja esses recursos?
Aguinis - Em meus romances
históricos trato de não falsear os
documentos, mas preencher os
buracos negros ou aproveitar
contradições. Não se deve enganar o leitor colocando a palavra
"história" quando se trata de uma
invenção. Mas considero legítimo
associar os fatos com cenas ou
personagens que dêem mais consistência a eles, sem distorcê-los.
Folha - A jornalista de "Assalto ao
Paraíso" trabalha em um ambiente
de corrupção. Que idéia tem da imprensa argentina hoje?
Aguinis - A jornalista sofre uma
dificuldade dupla, por ser jornalista e por ser mulher. Mas o que a
motiva é um acontecimento pessoal intenso. Com relação ao desempenho dos meios de comunicação, devo reconhecer que nem
sempre são meritórios e nem
sempre condenáveis. Flutuam.
No caso Amia, atuaram com interesse e equilíbrio, ainda que tenham vacilado diante do poder.
Folha - A história do garoto que
vê sua família ser morta e, por isso,
se torna um terrorista é baseada
em algum personagem real?
Aguinis - A história do terrorista
responde às exigências da literatura. São descritos sucessivos
traumas que terminam por convertê-lo em terrorista. Mas nem
todos os terroristas passaram por
situações traumáticas, e sim por
lavagens cerebrais. O fanatismo
não é conseqüência de se haver
transitado pela miséria, pois há
milhões de excluídos que jamais
mataram ninguém e que nos podem dar lições de solidariedade.
Num romance, tudo deve ter sentido, até a compulsão de matar
inocentes baseado no absurdo de
que Deus aprecia esse crime.
Folha - Como vê o modo como o
caso Amia vem sendo investigado?
Aguinis - O atentado contra a
Amia e o que o precedeu, contra a
embaixada de Israel, permanecem impunes até hoje. E isso é
uma vergonha para os argentinos.
Agora já não existem dúvidas sobre o fator externo, mas falta definir os atores locais, quem foram
os argentinos que participaram
com apoio logístico.
Folha - Você publicou agora na
Argentina "Qué Hacer?". Pode falar um pouco dele?
Aguinis - "Qué Hacer?" tem um
título leninista, mas é o contrário
disso. É a continuação de "O
Atroz Encanto de Ser Argentinos", que faz um diagnóstico de
nossos vícios. Em "Qué Hacer?"
não me refiro ao diagnóstico, mas
sim ao tratamento.
Folha - Qual sua opinião sobre o
governo Kirchner?
Aguinis - O presidente Kirchner
revelou que é um hábil político,
mas não tem fôlego de estadista.
Está imerso em problemas conjunturais, mas nunca deu sinais
de mirar a médio ou a longo prazo. Temo que vire uma outra frustração argentina. Já sofremos
muito, infelizmente. E parece que
essa terrível série não terminou.
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