São Paulo, sexta-feira, 11 de janeiro de 2008

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Diretor embaralha pistas do bem e do mal

JEAN-FRANÇOIS RAUGER
DO "LE MONDE"

Falado em quatro línguas e baseado em fatos reais, "A Espiã" mostra a ambigüidade entre o bem e o mal existente em cada pessoa, em plena Segunda Guerra Mundial. O roteiro já havia despertado o interesse do diretor Paul Verhoeven desde os anos 70, mas o projeto só foi retomado agora, quando ele sentiu a necessidade de fazer algo mais pessoal e engajado.
Para ele, a maior dificuldade para realizar o longa não foi financeira, mas dar coesão ao roteiro. A seguir, a entrevista.

 

FOLHA - De quando data a idéia de fazer este filme?
PAUL VERHOEVEN -
É um roteiro no qual eu estava interessado desde o final dos anos 70, bem antes de minha partida para Hollywood. Depois de fazer "O Homem Sem Sombra", senti vontade de fazer algo mais pessoal. E, não sem emoção, reencontrei esse roteiro. O que não teria sido possível realizar nos Estados Unidos é um filme em que são faladas quatro línguas. Minha preocupação foi fazer algo realista e complexo, o que não teria acontecido se todos falassem inglês.

FOLHA - Por que o senhor não fez o filme antes, na Europa?
VERHOEVEN -
A idéia inicial era que o personagem principal fosse o jovem marinheiro, mas não conseguimos encontrar uma maneira pela qual ele poderia ter se infiltrado no quartel-general alemão. Um dia, o roteirista Gerard Soeteman me disse que o personagem bom deveria ser a garota. A dificuldade em concretizar o filme não estava ligada ao orçamento. Era a dificuldade em fazer o roteiro ter coesão.

FOLHA - O que o levou a se interessar por essa história?
VERHOEVEN -
Desde o início, o filme partiu de algumas idéias e do desejo de rodar cenas específicas, especialmente a da prisão onde os colaboradores são submetidos a maus-tratos. Isso é baseado em fatos verídicos. Eu me cerquei de uma documentação enorme sobre a Segunda Guerra Mundial, em que se encontra uma matéria-prima ideal para falar de "bons" que se revelam "maus" e de "maus" que se revelam "bons". O oficial alemão existiu, chamava-se Mundt, era o encarregado de segurança em Haia.

FOLHA - O senhor acha que algumas pessoas podem ficar chocadas, especialmente pelo fato de um oficial ser retratado positivamente?
VERHOEVEN -
Os espectadores holandeses não reagiram assim. Nenhum crítico protestou em nome do respeito pela Resistência. Podem achar chocante, mas não podem afirmar que não tenha sido verdade.

FOLHA - Em seus filmes o senhor observa os personagens como faria um entomologista. Eles ficam presos entre suas aspirações morais e suas pulsões.
VERHOEVEN -
Procuro não ter consciência demais do que faço, nem ouvir demais o que se diz ou escreve sobre meus filmes. Quero continuar a ser inesperado para mim mesmo.


Tradução de CLARA ALLAIN

Texto Anterior: Cinema/estréias - Crítica/"A Espiã": Verhoeven faz jogo com a descrença na narrativa
Próximo Texto: Última Moda - Alcino Leite Neto: Um ícone nas passarelas
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.