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"Quis fazer comédia de humor negro"
Marcos Jorge, que estréia em longas com "Estômago", diz que sua comédia "flerta com o grotesco e com a obscenidade"
Título foi rodado em Curitiba e tem como atores mais conhecidos o protagonista João Miguel e o "titã" Paulo Miklos
SILVANA ARANTES
DA REPORTAGEM LOCAL
"Sob a aparência de uma comédia, eu queria fazer um filme
mais profundo", diz o diretor
Marcos Jorge a respeito de "Estômago", seu primeiro longa-metragem, que estréia hoje nos
cinemas.
O viés cômico do filme é dado
pelos embaraços em que se mete o protagonista Raimundo
Nonato (João Miguel), ao tentar se adaptar a uma região (o
sudeste e o sul do país), a um
trabalho (o de chef) e a um estilo de vida (o das grandes cidades) que não são originalmente
os seus. Trata-se de um personagem "ingênuo e ignorante,
mas inteligente", na definição
do diretor do título.
Sem nada no bolso e uma
modesta mala nas mãos, Nonato sai do Nordeste, em busca de
uma nova perspectiva de vida.
Do primeiro emprego -como o
sujeito que frita coxinhas num
boteco de nulas credenciais
gastronômicas-, Nonato consegue pular para a cozinha de
um restaurante italiano (o país
europeu é co-produtor do filme), onde aprende as manhas
da profissão.
A aparente ascensão de Nonato é interrompida por uma
decepção a que ele responde
com um primitivo e criminoso
ato de vingança, indo parar na
prisão. Na cadeia, o agora gourmet busca novamente uma escalada "social", a partir de sua
habilidade na cozinha.
O caráter "profundo" que
Jorge quis dar a essa história
reside num "ensaio sobre a alma humana em relação ao poder". Metaforizado na digestão,
que começa com o prazer do
gosto e termina em excremento, o poder, em "Estômago", decompõe (o humano).
Por isso, "o filme começa
com a boca e termina com a
bunda", aponta Jorge, ciente de
que nem todos os espectadores
se dão conta de sua intenção ao
descrever esse percurso.
A quem o perceba, o cineasta
está "consciente do risco" de
desagradar, não exatamente
pelo discurso, mas pela forma
que o filme assume. "Sei que
flertei de maneira perigosa com
o grotesco e a obscenidade, mas
eu queria fazer um filme visceral, uma comédia de humor negro", afirma ele.
Curitiba
"Estômago" foi filmado em
Curitiba, onde Jorge vive e de
onde saiu também boa parte do
elenco que contracena com
João Miguel. Exceções são as
presenças do carioca Babu Santana e do "titã" Paulo Miklos,
ambos interpretando chefões
do crime.
"A presença de Miklos em
"Estômago" é obviamente uma
homenagem minha ao filme do
Beto Brant ["O Invasor", em que
o ator interpreta o papel-título]", diz o cineasta.
Outros diretores que influenciaram Jorge e a quem ele
procurou prestar tributo em
seu primeiro filme são "o Peter
Greenaway da primeira fase,
em que fez "O Cozinheiro, o Ladrão, sua Mulher e o Amante",
um ótimo filme de cozinha, e o
mestre Sergio Leone".
Jorge chegou a conhecer
Leone, quando foi estudar cinema na Itália, onde morou por
mais de uma década. Em 2001,
o diretor percebeu que "dava
para fazer cinema de novo no
Brasil", após o colapso da produção enfrentado nos anos 90,
e retornou ao país. "Ou voltava
naquele momento, ou não voltava mais."
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