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"A culpa não é do PT", diz Fagundes
Ator de "Carga Pesada" afirma que nenhum partido tem projeto para a cultura, defende Gil e acha cedo para acusar Lula
Intérprete avalia que o teatro "sempre foi elitista" e defende que a meia-entrada deveria ser extinta para reduzir o preço do ingresso
DA REPORTAGEM LOCAL
Leia a seguir a continuação
da entrevista com Fagundes.
FOLHA - Depois de tantas peças políticas, optou por uma comercial, da
Broadway. Por que a mudança?
ANTONIO FAGUNDES - Não há mudança. Acabei de fazer "Achados e Perdidos", sobre um ex-delegado envolvido com esquadrão da morte, corrupção. Não
acho que "As Mulheres da Minha Vida" não seja um texto político. Não é talvez engajado,
mas fala de relações pessoais.
Todas as peças são políticas.
Você prepara o cidadão para ficar 90 minutos se aliviando da
tensão trazida pela sociedade,
pela má distribuição de renda, e
sair com a cabeça mais fresca.
FOLHA - O sr. fala em ampliar o público. Não há como trabalhar com
um valor de ingresso mais baixo do
que os R$ 40 de "As Mulheres..."?
FAGUNDES - Há o problema da
meia-entrada, que nunca entendi. A cultura tem tão pouca
força política que políticos acabam fazendo média em cima da
gente. O teatro sempre foi elitista, desde a Grécia antiga.
FOLHA - O sr. é a favor de extinção
da meia-entrada?
FAGUNDES - Sou. Talvez, se a
gente abolisse a meia-entrada,
os ingressos não seriam tão altos. Todo mundo paga meia.
Então, como eu faço? Se pusesse o ingresso num valor mais
razoável, estava perdido. E nós
não repassamos ao público a inflação da produção.
FOLHA - O sr., que foi garoto-propaganda do PT, concorda com as críticas que Paulo Autran e Marco Nanini fizeram sobre Gil no ministério?
Acha que ele abandonou o teatro?
FAGUNDES - A crítica pode ser
pertinente dependendo do
contexto. No contexto real, não
existe ministro da Cultura que
consiga fazer o que quer que seja em nenhuma área com 0,1%
da dotação orçamentária. Você
pode chamar o Goethe, que ele
vai ficar fazendo discurso, como o Gil fica cantando. É preciso impedir que as igrejas comprem os teatros, reformar alguns, criar companhias estatais. O problema é financeiro,
vontade política ele tem, mas
de que adianta? Não é culpa do
PT, mas dessa estrutura em que
vivemos desde 1500. Nenhum
partido tem projeto cultural. O
Autran e o Nanini têm razão,
mas não se pode particularizar.
FOLHA - E o PT não poderia ter feito
isso, em sua avaliação?
FAGUNDES - Não esperava isso,
porque não via em nenhuma
plataforma do PT algo voltado à
cultura. O grande mérito do artista ligado ao PT é que já sabia
que não ia ganhar nada.
FOLHA - O sr. voltaria a fazer propaganda para o PT?
FAGUNDES - Não, parei há anos,
quando percebi que o PT chegaria ao poder e que não teria a
chance de me manifestar. Comecei a me sentir desconfortável em apoiar uma pessoa e saber que, se passasse a discordar
dela, não teria espaço para falar. Mas sigo votando no PT.
FOLHA - Que avaliação faz sobre a
crise do mensalão e a responsabilidade do presidente Lula?
FAGUNDES - Estamos muito em
cima do laço para conversar sobre isso. Ainda não é história, é
jornalismo não devidamente
apurado. Tem um monte de
coisa que a gente não sabe e é
prematuro falar contra ou a favor. Preciso deixar a coisa esfriar. A gente sempre soube que
democracia é a eleição entre o
ruim e o pior. É claro que foi um
banho de água fria em todos
nós. Mas, enquanto o sistema
não for reformado, qualquer
partido terá o problema de esbarrar com caras corruptos. No
Congresso, com 550 deputados, quantos são corruptos? Diria 498 e teria dificuldade de
apontar os honestos.
FOLHA - O sr. participou de um movimento da Globo pela defesa da
cultura brasileira. Os críticos dizem
que, na verdade, a emissora pretende manter o controle da produção
de conteúdo artístico do país.
FAGUNDES - A mesma animosidade que existia contra o PT
existe contra a Globo no sentido contrário. Isso é um pecado,
porque a Globo é a maior produtora de TV do mundo. Se tivéssemos a auto-estima alta,
estaríamos nos vangloriando
de ter a Globo. No dia em que a
Globo acabar, vamos entender
o que é TV, vamos sentir falta e
será tarde. As TVs não se arriscam, elas copiam a Globo. Claro
que há erros, mas a culpa talvez
não seja só da Globo, mas do
sistema de comunicação.
FOLHA - O seriado "Carga Pesada"
também vai virar um filme?
FAGUNDES - A gente tem essa
idéia, até porque, de todos os
seriados que viraram filme, o
nosso é o que cabe mais. Mas
ainda é só um desejo, uma nova
luta, como foi da de voltar com
a série. Fiquei dois anos tentando convencer a emissora.
FOLHA - O sr. já ganhou tudo quanto é título: o homem mais sexy, o
bumbum mais bonito...
FAGUNDES - [interrompe] O
bumbum?! Nem "Caras" ousaria chegar a esse nível [risos].
FOLHA - Para isso, perto dos 60
anos, é preciso ser um metrossexual, cuidar da pele, do cabelo etc.?
FAGUNDES - Não, o máximo que
faço é ser limpinho [risos]. Tomo banho todo dia, sou perfumadinho, corto as unhas...
NA INTERNET - Leia a íntegra da
entrevista com Antonio Fagundes
www.folha.com.br/061596
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