São Paulo, quarta-feira, 11 de junho de 2008

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Yukio Futagawa cerca com lentes o modernismo

Além de trabalhos, japonês fotografa encontro entre Niemeyer e o português Álvaro Siza na Casa das Canoas, no Rio

Nesta viagem, fotógrafo que conheceu Le Corbusier e Mies Van Der Rohe se encanta com obras de Vilanova Artigas, em SP

SILAS MARTÍ
DA REPORTAGEM LOCAL

A cidade ainda acorda. Yukio Futagawa monta seu tripé e fica na ponta dos pés para fotografar o Auditório Ibirapuera. O japonês que viajou os últimos 50 anos retratando os marcos da arquitetura mundial cerca os prédios como se fossem animais perigosos. Vai e volta, sem olhar no visor da câmera. Segura a respiração até ouvir o barulho do obturador.
Difícil imaginar que este velhinho de 1,60 m, que corre pelo gramado do Ibirapuera como se avistasse leões num safári, é amigo pessoal de Frank Gehry, conheceu Le Corbusier e Mies van der Rohe, descobriu Tadao Ando, principal nome da arquitetura japonesa atual. E cumprimentou Niemeyer pela primeira vez no exílio em Paris, nos anos 60.
Mas só agora está "flutuando". É que ele, considerado o fotógrafo de arquitetura mais importante do mundo, fundador da revista-referência "Global Architecture", acabou de armar um encontro entre o "mestre" Oscar Niemeyer e o premiado arquiteto português Álvaro Siza, no Rio.
Mesmo aos 76, depois de visitar todas as grandes obras e conhecer os principais arquitetos do século 20, saiu da Casa das Canoas beliscando os braços para ter certeza de que não foi um sonho. Durante o encontro, fez 350 fotos em menos de uma hora. Ele não queria uma entrevista, pediu só para registrar tudo com sua câmera.
Talvez quisesse também reparar uma omissão. Nas mais de cem edições de sua revista, nenhuma capa estampou uma obra de Niemeyer -o campeão até hoje, e isso não é surpresa dada a paixão do fotógrafo pelo modernismo, foi Le Corbusier.
No encontro, Siza, que veio ao Brasil inaugurar seu projeto mais recente -a nova sede da Fundação Iberê Camargo, em Porto Alegre-, elogiou a flexibilidade de Niemeyer, que consegue resolver todo um prédio com formas simples. Niemeyer retribuiu dizendo que se impressionava com a forma que Siza trabalhava o concreto.
Juntar arquitetos é meta declarada da carreira de Futagawa, que levou Frank Gehry ao encontro de Philip Johnson, mestre da Escola de Chicago que até então desprezava o canadense-californiano por trás do Guggenheim de Bilbao, e mostrou pela primeira vez a casa Katsura, marco da arquitetura japonesa, a Le Corbusier. Também apresentou o francês vencedor do último prêmio Pritzker Jean Nouvel a Álvaro Siza, que agora se reuniu com Niemeyer, no Rio.
"Foi inesquecível, esse encontro vai ficar para sempre no meu coração", disse Futagawa à Folha, numa conversa no terraço do hotel Unique, projeto de Ruy Ohtake em São Paulo. Ele passara a manhã clicando os prédios de Niemeyer no Ibirapuera e fora ao hotel para retratar sua fachada ao cair da noite, imagem cotada para um número especial de sua revista.

Concreto plástico
"Não, o modernismo não morreu." Futagawa diz que além de rever Niemeyer, descobriu Vilanova Artigas nesta viagem ao Brasil -ficou boquiaberto com a FAU-USP. "É de uma proeza impressionante como ele usa o concreto com força, de forma plástica."
Futagawa confirma que vai lançar em breve um número de sua revista sobre Artigas, além de um livro sobre a obra do arquiteto que considera "definitivo" na história paulista. Mas não será uma retrospectiva. Ele frisa que visitou, por exemplo, 400 obras de Frank Lloyd Wright, algumas mais de 20 vezes, para fechar o foco em 15 -cada uma virou um livro.
"Não existe arquiteto no mundo cujas obras sejam todas boas", afirma. Quando visitou o apartamento de Mies van der Rohe, em Chicago, Futagawa disse que achou desconfortável a cadeira Barcelona. O arquiteto concordou que o móvel até hoje cobiçado não estava entre seus desenhos mais felizes.
Para escolher os melhores trabalhos, na opinião de Futagawa, "é importante respirar o ar que o arquiteto respirou, sentir o cheiro de Le Corbusier, sentir a arquitetura na pele".
No Brasil, acredita que os arquitetos continuam criando projetos de peso, desdobrando preceitos do modernismo de forma original. "Fui contra o pós-modernismo", admite Futagawa. "O modernismo não tem nem cem anos, é muito cedo para declarar sua morte."


Texto Anterior: Mônica Bergamo
Próximo Texto: Frase
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.