São Paulo, sábado, 11 de agosto de 2001

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LITERATURA

Autor de "O Carteiro e o Poeta" vem ao Brasil na semana que vem para participar de dois eventos, em MG e RS

Skármeta fala das letras no estrangeiro

FRANCESCA ANGIOLILLO
DA REPORTAGEM LOCAL

O escritor chileno Antonio Skármeta, 60, é simpático, risonho e ocupado. Desde 2000, é embaixador de seu país em Berlim, com a principal tarefa de difundir a cultura do Chile.
Na semana que vem, o autor de "O Carteiro e o Poeta" desembarca em Belo Horizonte, para duas falas, e de lá segue para Passo Fundo, no Rio Grande do Sul (veja quadro nesta página).
Viajante incansável, falou à Folha, por telefone, de Locarno, na Suíça, onde está como membro do júri do festival de cinema local.
"Aliás, começou com um brasileiro, "Bicho de Sete Cabeças"." Como jurado, o embaixador não pôde dar sua opinião sobre o filme de Laís Bodanzky -"mas posso dizer o que todo mundo viu: foi muito bem recebido e mereceu um aplauso emocionado".
Entre outros temas, falou do seu mais novo livro, "La Chica del Trombón" (a menina do trombone). O romance será lançado aqui pela Record, no primeiro semestre de 2002, e compõe uma trilogia com "As Bodas do Poeta", publicado pela mesma editora em 2000, e um volume que ele ainda não comenta, mas que se passa em Nova York e já tem uma primeira versão. Leia a seguir os principais trechos da entrevista.

Folha - Como serão as palestras?
Antonio Skármeta -
Em Minas Gerais, são dois eventos. O primeiro é uma mesa-redonda sobre literatura e os novos meios; o outro é sobre como eu vejo minha própria obra. Pediram que me concentrasse mais em "O Carteiro e o Poeta" e "As Bodas do Poeta". Se der, vou apresentar trechos do filme que eu fiz de "O Carteiro e o Poeta", "Ardiente Paciéncia". Em Passo Fundo estão dando uma ênfase especial à literatura para jovens.

Folha - O sr. lançou este ano "La Chica del Trombón", uma continuação de "As Bodas do Poeta". Pode contar um pouco do livro?
Skármeta -
Ela é levada menina da Europa para o Chile, por um trombonista, porque seus pais desaparecem na Segunda Guerra.
Lá, cria uma relação com uma pessoa que presume-se ser seu avô -não há certeza, mas pouco importa, porque se cria uma relação de carinho e amizade. Ela quer ser independente, não se deixar esmagar como sua avó, na Europa. Seu nome é Magdalena, mas renuncia a ele para chamar-se como a avó: Alia Emar -a protagonista de "As Bodas do Poeta".

Folha - O sr. descende de europeus e nasceu em Antofagasta, para onde Magdalena é levada. O que "La Chica del Trombón" tem de suas lembranças de infância?
Skármeta -
Meus avós vieram da Dalmácia (região da ex-Iugoslávia) e me contavam muitas coisas. O imigrante deixa sua terra muito jovem; tem lá algumas vivências e, justo quando começa a amadurecer, tem de abandonar esse país.
No novo país, é um estranho. Para criar uma identidade, conta coisas. E, contando, recria o mundo que perdeu e dá sentido a seu presente: "Conto, logo existo".
As histórias da minha infância me inquietavam; 50 anos depois, todas essas imagens de meus avós estavam frescas quando escrevi "As Bodas do Poeta" e "La Chica del Trombón" -que termina em 1970, em Santiago, no momento luminoso em que Salvador Allende ganha, com seu socialismo pacífico, as eleições presidenciais.

Folha - É também o momento antes de o sr. mesmo virar estrangeiro, exilado pelo golpe de Pinochet.
Skármeta -
Eu me fui em 73; tenho não só a experiência de meus avós, mas também a minha, que afetou muito minha vida e está nesses dois livros. E também em "O Carteiro e o Poeta", que escrevi no exílio. É a recriação, por alguém muito ferido pela situação, de um modesto paraíso perdido, onde o poeta e o homem do povo dividiam os mesmos sonhos.

Folha - Como diplomata em missão cultural, que autores chilenos o sr. citaria ao leitor brasileiro?
Skármeta -
Alberto Fuguet é um favorito. "Baixo Astral", que saiu no Brasil [Record", é bastante bom. Mas também há outros, e há um grande movimento de literatura de mulheres. Poderia dar 30 nomes. O movimento literário é forte, e quase sempre chilenos são lidos por chilenos, que os mantêm no alto das vendas.

Folha - E como leitor, do que gosta na literatura do Brasil?
Skármeta -
À raiz de sua morte, gostaria de dizer que alegria tive por ler Jorge Amado. Em criança, li "Capitães da Areia". Depois vários, com muita paixão.
Na universidade, líamos Guimarães Rosa. Não era um escritor popular, mas "Grande Sertão: Veredas" me impressionou muito. Também Clarice Lispector.
E, na rua, Vinicius de Moraes, uma sorte lê-lo. Gosto muito de Dalton Trevisan, Erico Verissimo, Ignácio de Loyola Brandão, Nélida Piñon, Lygia Fagundes Telles, Ziraldo, João Ubaldo Ribeiro... São tantos nomes!



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