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MÚSICA
Sambista baiano, que lança primeiro CD aos 79, é tema do programa da TV Cultura esta noite
"Ensaio" apresenta Riachão comovente
CARLOS RENNÓ
ESPECIAL PARA A FOLHA
Identificado como um programa que não cansa de mostrar a
importância de nomes da música
brasileira de todos os tempos, o
"Ensaio", do diretor Fernando
Faro, da TV Cultura, contribui na
sua edição de hoje (às 23h30) para
a descoberta de um singular sambista baiano da velha guarda muito pouco conhecido em âmbito
nacional: Clementino Rodrigues,
o Riachão.
Autor de "Cada Macaco no Seu
Galho", seu maior sucesso, Riachão é um dos principais representantes de uma das bases do
samba tradicional da Bahia.
Completará 80 anos em novembro e só agora está lançando seu
primeiro CD solo, "Humanenochum" (pelo selo Velas). Apresentou-se há um mês no Sesc
Pompéia, em São Paulo, e quem
viu não acreditou: foi um show
memorável.
É que, em palco, sua figura causa mesmo grande impacto; Riachão dança e se movimenta de
forma incessante e impressionante para a sua idade, exibindo muita graça ao sambar. Sua performance, aliada à criação de um figurino próprio, lembra Jackson
do Pandeiro, que o gravou, e faz
dele um precursor, o avô de Carlinhos Brown.
Naturalmente, ela não será
mostrada hoje, pois o programa
privilegia as tomadas faciais dos
artistas focalizados.
Música e casos
Mesmo assim, eis uma ótima
oportunidade de conhecê-lo. Ou
de revê-lo cantando e contando
coisas interessantes como a gênese de algumas das músicas concisas e precisas, na maioria alegres,
que marcam sua obra.
É o caso de "Vida da Semana", a
respeito da qual ele explica o uso
engraçadíssimo do termo "seca-gás" na canção.
De "Baleia da Sé", uma das razões para ele ter sido chamado de
"cronista musical" de Salvador.
Ou de "Judas Traidor", em que,
depois de conclamar o fim do personagem-título ("Vamos ver
queimar Judas Traidor"), ele nos
brinda com este imprevisto, surpreendente verso: "Vamos gargalhar na hora da dor".
Velhinho travesso
Riachão é um velhinho travesso.
A melancolia da experiência não
lhe tirou uma inocência que lhe
dá um ar de menino, encantado e
encantador.
Ele é de um outro tempo e às vezes parece de outro mundo. Seus
sambas, porém, podem ser incrivelmente atuais. Cássia Eller percebeu isso, ao gravar dele "Vá
Morar com o Diabo". Mas ele tem
muito mais a dar.
Tendo já me emocionado ao seu
lado, ouvindo-o desfilar canções
que atestam uma inconfundível
voz individual como criador, posso dizer que o formato do "Ensaio", concentrando-se no que o
artista canta ou diz, favorece a expressão da emoção passada pelas
suas falas e canções.
Um momento particularmente
comovente é "Linda Morena",
exemplo da versatilidade do compositor, capaz tanto de uma música sertaneja como essa quanto de
uma música junina; de um choro
quanto de um forró.
"Linda Morena" traz a voz de
Sabiá, com quem ele formou uma
dupla na rádio baiana, nos anos
40. Outro dueto ocorre em "Só
Quero Uma", com Paquito. Co-produtor do seu CD, Paquito é o
maior responsável pela atual aparição de Riachão na cena musical
brasileira.
Carlos Rennó é jornalista, compositor e
produtor musical
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