São Paulo, terça-feira, 11 de setembro de 2001

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MÚSICA

Sambista baiano, que lança primeiro CD aos 79, é tema do programa da TV Cultura esta noite

"Ensaio" apresenta Riachão comovente

CARLOS RENNÓ
ESPECIAL PARA A FOLHA

Identificado como um programa que não cansa de mostrar a importância de nomes da música brasileira de todos os tempos, o "Ensaio", do diretor Fernando Faro, da TV Cultura, contribui na sua edição de hoje (às 23h30) para a descoberta de um singular sambista baiano da velha guarda muito pouco conhecido em âmbito nacional: Clementino Rodrigues, o Riachão.
Autor de "Cada Macaco no Seu Galho", seu maior sucesso, Riachão é um dos principais representantes de uma das bases do samba tradicional da Bahia.
Completará 80 anos em novembro e só agora está lançando seu primeiro CD solo, "Humanenochum" (pelo selo Velas). Apresentou-se há um mês no Sesc Pompéia, em São Paulo, e quem viu não acreditou: foi um show memorável.
É que, em palco, sua figura causa mesmo grande impacto; Riachão dança e se movimenta de forma incessante e impressionante para a sua idade, exibindo muita graça ao sambar. Sua performance, aliada à criação de um figurino próprio, lembra Jackson do Pandeiro, que o gravou, e faz dele um precursor, o avô de Carlinhos Brown.
Naturalmente, ela não será mostrada hoje, pois o programa privilegia as tomadas faciais dos artistas focalizados.

Música e casos
Mesmo assim, eis uma ótima oportunidade de conhecê-lo. Ou de revê-lo cantando e contando coisas interessantes como a gênese de algumas das músicas concisas e precisas, na maioria alegres, que marcam sua obra.
É o caso de "Vida da Semana", a respeito da qual ele explica o uso engraçadíssimo do termo "seca-gás" na canção.
De "Baleia da Sé", uma das razões para ele ter sido chamado de "cronista musical" de Salvador.
Ou de "Judas Traidor", em que, depois de conclamar o fim do personagem-título ("Vamos ver queimar Judas Traidor"), ele nos brinda com este imprevisto, surpreendente verso: "Vamos gargalhar na hora da dor".

Velhinho travesso
Riachão é um velhinho travesso. A melancolia da experiência não lhe tirou uma inocência que lhe dá um ar de menino, encantado e encantador.
Ele é de um outro tempo e às vezes parece de outro mundo. Seus sambas, porém, podem ser incrivelmente atuais. Cássia Eller percebeu isso, ao gravar dele "Vá Morar com o Diabo". Mas ele tem muito mais a dar.
Tendo já me emocionado ao seu lado, ouvindo-o desfilar canções que atestam uma inconfundível voz individual como criador, posso dizer que o formato do "Ensaio", concentrando-se no que o artista canta ou diz, favorece a expressão da emoção passada pelas suas falas e canções.
Um momento particularmente comovente é "Linda Morena", exemplo da versatilidade do compositor, capaz tanto de uma música sertaneja como essa quanto de uma música junina; de um choro quanto de um forró.
"Linda Morena" traz a voz de Sabiá, com quem ele formou uma dupla na rádio baiana, nos anos 40. Outro dueto ocorre em "Só Quero Uma", com Paquito. Co-produtor do seu CD, Paquito é o maior responsável pela atual aparição de Riachão na cena musical brasileira.


Carlos Rennó é jornalista, compositor e produtor musical


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