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"O corpo já não é mais tão importante"
Vito Acconci, referência da body art, fala sobre o fim da era das performances e de como quis "grudar na arquitetura"
Artista norte-americano que agora trabalha como arquiteto dá palestra hoje em festival de performances que vai até domingo no Rio
DA REPORTAGEM LOCAL
Quando se escondeu sob o piso de uma galeria e se masturbou oito horas por dia gritando
fantasias sexuais por entre as
frestas do chão, Vito Acconci
tentou fundir arte e arquitetura. Sêmen foi a argamassa da
construção, um dos pontos de
partida da chamada body art.
"Seedbed", sua obra de 1972,
veio um ano depois que Chris
Burden levou um tiro no braço
em outra ação artística em galeria e pouco antes de despontarem performers como Ana
Mendieta e Marina Abramovic.
"Era a linguagem do tempo,
todos faziam isso na época", diz
Acconci, em entrevista exclusiva à Folha. Ele participa hoje,
no Rio, do festival Presente Futuro Vol. 2, no Oi Futuro.
Se havia então uma "corrente do tempo" ligando o artista a
Burden, Bruce Nauman e até
ao rock de Neil Young, Acconci
está por trás do amálgama de
arte com arquitetura que se
desdobra agora como vertente
turbinada na arte contemporânea. Não à toa, faz tempo que
não se diz artista e comanda
um escritório de arquitetura.
"Minha presença nas performances estava começando a
me incomodar, não queria que
me vissem toda hora, num culto à personalidade", diz Acconci. "Preferi me fundir ao espaço, fazer parte da arquitetura."
Depois de se vendar e ameaçar espectadores com barras de
chumbo e de ações em que tentava abrir à força os olhos bem
fechados de sua namorada,
quis sair de cena e tornar o público em usuário de sua obra.
"Nessa onda de me autoexaminar, descobri que a personalidade não é essa joia preciosa
que tentamos lapidar, o corpo
já não é mais importante", afirma. "Nunca tive um lugar na
arte porque não queria espectadores, queria participantes,
habitantes das minhas obras."
Acconci também morou numa espécie de obra. Viveu anos
no mesmo loft em que Gordon
Matta-Clark testou suas alterações arquitetônicas. Era o artista que ficou conhecido por
furar, rachar e desconstruir
prédios em Manhattan e pelo
mundo. Esse frescor voraz vai
respingar depois nos projetos
arquitetônicos de Acconci.
"Ele fazia suas obras no espaço urbano removendo coisas,
não acrescentando", lembra.
"Arquitetura totalitária"
Acconci então passou a esvaziar galerias e destacar a construção do espaço. Na instalação
"Instant House", visitantes
acionavam um mecanismo que
fazia brotar do piso portas, paredes, janelas. "Queria grudar
na arquitetura a todo custo."
Mas uma vez colado nela,
perguntava o que fazer. Uma de
suas obras era uma mesa no espaço expositivo que se prolongava para fora da janela, uma
espécie de trampolim sobre a
cidade lá embaixo. Sua voz gravada era um discurso sem rumo, como se antecipasse a angústia da vida coagida pela arquitetura e convidasse seu público a mergulhar no asfalto.
"A arquitetura pode ser totalitária", diz Acconci. "Hoje em
dia eu tento dar mais escolhas
aos habitantes das minhas
obras."
(SILAS MARTÍ)
PRESENTE FUTURO VOL. 2
Quando: de hoje a 13/9; programação
em www.oifuturo.org.br
Onde: Oi Futuro (r. Dois de Dezembro, 63, Rio, tel. 0/xx/21/3131-3060)
Quanto: entrada franca
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