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Dono do "palácio encantado" começou como mascate
do Banco de Dados
O descendente de libaneses João
Saad começou a vida como grande parte da comunidade árabe:
trabalhando como mascate, vendendo cortes de tecidos em cidades do interior. Em poucos anos,
viria a se tornar dono de uma das
maiores redes de rádio e TV do
país, a Rede Bandeirantes.
João Jorge Saad nasceu em 22 de
julho de 1919 em Monte Azul Paulista (SP), hoje Olímpia. Era filho
de Raquel Amate Saad e Jorge
João Saad, que havia começado a
vida no Brasil como mascate. Três
anos depois do seu nascimento,
mudaram-se para São Paulo, e
seu pai abriu uma loja de tecidos
na rua 25 de Março, que reúne lojas de comércio popular.
Depois que concluiu o antigo ginásio (hoje equivalente ao ensino
fundamental), João Saad foi trabalhar com o pai. Aos 17 anos, começou a viajar para vender tecidos no interior de São Paulo e no
sul de Minas Gerais e comprou
seu primeiro carro, um Ford 29.
Com 25 anos, conheceu Maria
Helena Mendes de Barros, filha
do ex-governador de São Paulo
Adhemar de Barros. Casaram-se
dois anos depois e tiveram cinco
filhos: Maria Leonor, João Carlos
-conhecido como Johnny-,
Ricardo, Marisa e Márcia.
Eleito em 1947 governador de
São Paulo, Adhemar de Barros
ofereceu um cartório ao genro,
que, para surpresa do sogro, recusou. Logo depois, Adhemar pediu
que ele fosse resolver alguns problemas na rádio Bandeirantes,
que ele havia comprado de Paulo
Machado de Carvalho, na época
dono da Record.
Em 1950, a rádio apoiou as campanhas vitoriosas de Getúlio Vargas, para a Presidência da República, e de Lucas Nogueira Garcez,
para o governo do Estado. Um
ano depois, João Saad fez um trato com o sogro: ele assumiria definitivamente a rádio e ajudaria
Adhemar de Barros nas suas futuras campanhas.
Quando Adhemar assumiu a
Prefeitura de São Paulo, em 57,
João Saad foi nomeado presidente da CMTC. Foi a sua única passagem por cargo público. Sua gestão durou pouco porque trombava frequentemente com o sogro.
Não aceitava indicação de apadrinhamentos.
Já a rádio Bandeirantes, sob seu
comando, começou a se estruturar como rede. Foram compradas
estações no interior e em outros
Estados. Em 1952, João Saad conseguiu com o presidente Getúlio
Vargas a concessão de um canal
de televisão em São Paulo.
Durante o governo Juscelino
(56-61), a concessão chegou a ser
cancelada e entregue a outro empresário. Mas Saad conseguiu, já
na época do governo João Goulart
(61-64), recuperar a TV.
Em 1967, a TV Bandeirantes começou a operar. O prédio da
emissora, primeiro no país a ser
concebido para receber uma TV,
levou cerca de cinco anos para ser
construído e ficou conhecido como o "palácio encantado". Saad
adiou várias vezes o início das
operações: "Não era ainda o tempo... Inaugurei a estação só em 67,
fincada numa base sólida", disse.
Quando a TV Bandeirantes foi
fundada, já existiam as TVs Cultura, Record e as extintas Tupi,
Excelsior e Paulista.
Dois anos depois, João Saad teria sido aconselhado por uma cartomante a vender a emissora por
prever um incêndio. Em entrevista, ele teria dito que não acreditou
porque achou que ela estivesse a
serviço de algum concorrente.
Coincidência ou não, a empresa
pegou fogo três dias depois. O incêndio, que teria sido criminoso,
destruiu o prédio e todo o equipamento. O prejuízo foi grande, já
que não havia seguro. Mas Saad
soube tirar proveito da situação.
Em vez de comprar novos equipamentos em preto-e-branco, a
Bandeirantes foi a primeira a ter
equipamento para TV em cores e
saiu da crise em vantagem.
A Bandeirantes investiu desde o
início em esporte, filmes e jornalismo. Para Saad, a programação
tinha de ser "eclética". Segundo
ele, não se podia "elevar muito o
nível dos programas, senão não
haverá audiência".
Atualmente, a Rede Bandeirantes é formada por 11 emissoras
próprias e 68 afiliadas que cobrem 94% do território nacional.
É a segunda rede em número de
emissoras do país. Também faz
parte dela o Canal 21, aberto, com
transmissão em UHF.
A Rede Bandeirantes de rádio
cobre cerca de 90% do território
nacional, com oito emissoras AM
próprias e 16 FM.
João Saad tinha não só senso de
oportunidade comercial, mas
também habilidade para transitar
no meio político. Ele adequou seu
discurso público à realidade histórica do momento. Em 1972, por
exemplo, durante o regime militar (1964-85), disse que a censura
oficial "deve e precisa existir, para
a defesa da família, das instituições e do menor".
Apesar de cultivar relações com
políticos mais conservadores, como Paulo Maluf, Orestes Quércia
e José Sarney, durante o regime
militar abriu espaço em sua TV
para longas entrevistas com líderes de oposição, como o então secretário-geral do Partido Comunista Brasileiro, Luís Carlos Prestes, e Leonel Brizola.
Já em 87, em plena redemocratização, pediu em um discurso:
"Menos Estado e mais indivíduo,
menos Estado e mais sociedade,
menos Estado e mais liberdade".
Saad classificava sua emissora de
"apolítica". "A dívida que tinha
com meu sogro paguei mil vezes.
Depois, a Bandeirantes não fez
mais campanha política", dizia.
Nas campanhas para eleições de
presidente, governador ou prefeito, a Bandeirantes liderou os debates e abriu espaço para a oposição se manifestar.
João Saad era conhecido na
Bandeirantes por ter sempre a
porta aberta para funcionários de
qualquer escalão.
Também tinha a fama de cobrar
de seus auxiliares erros cometidos
no noticiário da rádio Bandeirantes nos horários mais improváveis, inclusive de madrugada.
Podia acompanhar toda a programação da emissora porque era
caseiro, avesso às badalações. Seu
passatempo preferido era visitar
suas fazendas e, enquanto a saúde
permitia, costumava fazer esses
passeios pilotando o próprio
avião.
Em 1985, teve uma de suas fazendas, a Vereda Grande, desapropriada pelo Incra. Foi a primeira fazenda em Minas Gerais a
ser desapropriada para a reforma
agrária.
Em maio de 1993, João Saad foi
operado pelo cardiologista Adib
Jatene para o implante de quatro
pontes de safena -único problema sério de saúde que teve nos
seus 80 anos de idade. Três anos
depois, sua mulher, Maria Helena, morreu de câncer.
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