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LITERATURA
Paulo Nogueira, um dos convidados da 1ª Festa Portuguesa de Cabo Frio, divide-se entre origem lusa e brasileira
Feira amplia elo entre países da língua portuguesa
JULIÁN FUKS
DA REPORTAGEM LOCAL
Contrariando as mais recentes e
comprovadas constatações dos
geólogos, os continentes americano, europeu e africano estão se
aproximando, e num ritmo mais
acelerado do que os tais dois centímetros ao ano. Mas não, não por
iniciativa de suas respectivas placas tectônicas, e sim pela vontade
de alguns editores, escritores e
amantes dos livros em geral que,
mais modestos, têm se esforçado
sobremaneira para unir ao menos
os falantes de língua portuguesa.
Exemplo disso, para além das
inúmeras publicações trilaterais
que têm tomado o mercado, é a 1ª
Festa Portuguesa de Cabo Frio,
que começa hoje e vai até domingo, reunindo escritores portugueses, brasileiros e angolanos para
conversar sobre a literatura e tudo
o que orbite em seu entorno
-por exemplo, a língua. Portugal
representado por escritores como
Inês Pedrosa e Helder Macedo. O
Brasil, por Luiz Ruffato, Ivan Junqueira e Adriana Lisboa, entre outros. Dos nascidos em Angola,
Manoel Rui Monteiro e Filipa Melo.
E, no meio deles todos, camuflando-se em diversos sotaques,
uma figura peculiar, híbrida, que
não surpreende tenha se tornado,
com as inevitáveis modificações,
personagem de romance de sua
própria autoria. Trata-se do escritor Paulo Nogueira, nascido em
São Paulo, mas de cá emigrado há
20 anos para Portugal, onde já publicou seis livros e fez por merecer
a alcunha de escritor português,
mesmo nunca tendo adotado essa
outra nacionalidade.
Seu mais recente romance,
"Transatlântico", depois de outros tantos ambientados em Portugal, conta a história de um sujeito que se divide entre essas mesmas origens e, mais complicado
ainda, entre uma mulher brasileira e outra portuguesa. O título,
propositalmente ou não, se não
marca um retorno físico do autor
à sua terra natal, ao menos reflete
o de seus livros. Em junho deste
ano, foi lançado por aqui -em
linguagem minimamente abrasileirada pelo próprio Nogueira-
o romance "O Suicida Feliz" (Planeta, R$ 34,90, 232 págs.), que, diferente do que o autor esperava,
apenas agrava sua esquizofrenia
de nacionalidades. O lançamento
faz parte da coleção "Tanto Mar",
dedicada a autores portugueses.
Na ficha técnica, as diretrizes para
catálogo: "literatura brasileira".
A partir desse limbo privilegiado, é Nogueira quem fala sobre
essa aproximação que tem havido
no mundo das letras: "Indiscutivelmente aumentou bastante o
intercâmbio. Sempre houve cerimoniais de grandes afinidades,
fraternidades, maternidades entre Brasil e Portugal, mas que não
passavam de retórica. Nos últimos tempos, sim, tem havido
uma aproximação clara, principalmente devido à publicação de
uma nova geração de autores portugueses por aqui". E não poupa
palavras para descrevê-la: "É algo
como um miniboom da literatura
portuguesa, não tanto em termos
comerciais, mas em termos críticos e editoriais".
Nogueira também aproveita para relatar diferenças na criação literária dos países, que no mínimo
impediriam que tal movimento
incidisse em confluência total e
absoluta. "O português é mais retraído; o brasileiro, mais comunicativo. O escritor português, então, se ocupa mais das relações
sentimentais. O brasileiro, de modo geral, parece buscar coisas
mais picarescas, com mais verve."
De resto, não se espere dele uma
síntese entre as posições. Nogueira identifica uma tendência do escritor à transnacionalidade, à não
submissão a nichos. Em tempo:
em "Transatlântico", entre a portuguesa e a brasileira, o personagem fica com a finlandesa.
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