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Roberta Gambarini traz seu jazz improvisado ao Tim Festival
Ás do "scat singing", intérprete italiana diz à Folha ser fã de Leny Andrade
RONALDO EVANGELISTA
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
O mundo do jazz é muito diferente do mundo da música
pop: quando surge um nome
novo, não há revistas semanais,
centenas de blogs, novidadeiros de plantão para anunciar a
descoberta. Em compensação,
o boca-a-boca funciona quase
como numa seita, em que se
passam adiante as últimas descobertas com excitação: "descobri", parecem dizer -como
um segredo compartilhado-
os ouvintes atentos aos amigos
interessados.
A cantora italiana Roberta
Gambarini sentiu isso na pele.
Sem grandes destaques na imprensa, seu nome parece ser invariavelmente evocado acompanhado de exclamações e impressões positivas. E essa corrente do bem das boas novidades se espalhou tanto que trouxe a intérprete ao Brasil: no fim
deste mês, ela se apresenta no
Tim Festival -dia 26, em São
Paulo, 27, no Rio de Janeiro e
29, em Vitória.
Com 30 e poucos anos ("estou sendo deliberadamente vaga"), morando nos Estados
Unidos há nove, com dois discos lançados no país (um deles
gravado ao lado do pianista
Hank Jones), Gambarini conversou com a Folha por telefone, de Nova York, onde mora.
Mostrando intimidade com
o Brasil, ela já se adianta a dizer
que tem parentes e amigos por
aqui e já visitou o país algumas
vezes -uma delas, inclusive,
para cantar, ao lado do trompetista Roy Hargrove, na casa carioca Mistura Fina. E surpresa:
sua cantora favorita é brasileira. Mas nada de obviedades:
Gambarini é fã da pouco conhecida mas universalmente
elogiada Leny Andrade.
"Eu amo a música brasileira", conta. "Meus pais eram
muito fãs de jazz e da música
do Brasil, então isso é algo que
ouço desde pequena. E, na Itália, a música brasileira sempre
foi muito famosa. Eu via constantemente na TV gente como
Elis Regina e Toquinho. E, sem
fazer diferenciações entre estilos e países, posso dizer que minha cantora favorita, por várias
razões, é a Leny Andrade."
Faz sentido: as habilidades
vocais de Gambarini revelam
seu interesse pelo improviso e
pelo uso da voz como um instrumento, especialidades da
nossa Leny.
Mestra do scat
Longe da tendência cool das
mais famosas cantoras de hoje
em dia (leia-se Norah Jones,
Diana Krall, Madeleine Peyroux), passeando pelas oitavas
com naturalidade e encontrando-se entre os estilos de cantoras como Ella Fitzgerald, Sarah
Vaughan e Carmem McRae,
Gambarini é uma mestra moderna do scat singing, aquela
técnica de cantar esticando a
melodia em onomatopéias.
"Cantar em scat singing é
uma coisa natural", explica a
cantora. "Você tem que gostar
daquilo por natureza, tem que
fazer desde pequeno. Você pode depois estudar e desenvolver, mas tem que ser algo natural. Eu costumava fazer isso
desde criança, enquanto ouvia
os discos da Ella. É uma coisa
que acaba tomando toda a sua
vida."
Sem dúvida alguma, o jazz é
algo que parece tomar toda a vida de Gambarini. Pergunte a
ela o motivo de ela ter debandado da Itália para os Estados
Unidos e isso fica claro: "Eu
acredito que a arte do jazz você
aprende estudando, mas também, principalmente, por osmose, estando no palco com
músicos incríveis".
E que lugar melhor para encontrar músicos incríveis do
jazz do que na pátria-mãe do
estilo? E Gambarini estava certa: em pouco tempo, já dividia o
palco com ídolos como Ron
Carter, Wayne Shorter, Jimmy
Heath, James Moody, Slide
Hampton, Hank Jones, Benny
Carter.
Mas é inevitável a pergunta:
as pessoas costumam vê-la como uma cantora de jazz ou uma
cantora italiana de jazz? "Com
músicos, especialmente com os
melhores, não faz diferença de
onde você é", ela responde. "Só
interessa o jeito que você canta.
Para o público, é um pouco diferente, especialmente porque
não há nenhuma cantora italiana de jazz que seja conhecida.
Mas isso não faz diferença: aqui
tem gente do mundo todo, e as
pessoas se comunicam pela
música."
E isso, afinal, esteja você na
Itália, nos EUA ou no Brasil, é
algo que não muda.
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