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LIVROS/LANÇAMENTOS
"PARIS TO THE MOON"
Um americano em Paris
Associated Press
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Réplica da estátua da Liberdade, em Paris; ao fundo, a Torre Eiffel |
NELSON ASCHER
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS
Durante os últimos cinco
anos, um dos pontos altos da
revista norte-americana "The
New Yorker" foram os artigos de
seu correspondente em Paris,
Adam Gopnik. Estabelecendo-se
na capital francesa em 95, ele tem
escrito sobre assuntos que podem, quase todos, se abrigar sob o
rótulo "modo de vida": desfiles de
moda e a culinária dos restaurantes de primeira linha, as dificuldades diárias em tempos de greve
nos transportes, a disputa por
prestígio entre dois cafés, a Copa
do Mundo etc.
Foi a historiografia francesa que
difundiu a noção de que o exame
inteligente de fatos e ocorrências
aparentemente banais e corriqueiros pode revelar tanto sobre
uma época e/ou lugar quanto o
estudo da economia, diplomacia e
política. Assim, é mais do que
apropriado que um observador se
valha dessa noção para tentar entender não só Paris, mas a França
contemporânea e, por extensão, a
Europa Ocidental posterior à queda do Muro de Berlim e em vias
de algum tipo de unificação.
"Paris to the Moon" (De Paris à
Lua) reúne muitos (mas não todos) artigos de Gopnik publicados na revista "The New Yorker"
e algum material inédito: suas
anotações, uma espécie de entradas de diário, escritas geralmente
na época do Natal e abordando de
forma mais rápida uma variedade
de temas.
Seus melhores textos são simplesmente deliciosos. Num deles,
por exemplo, o autor narra o curioso conflito que se desenvolveu
em torno de uma famosa e tradicional "brasserie" do Quartier Latin, o Balzar, quando foi adquirida
por um grupo francês de fast
food: a intelectualidade que frequentava o estabelecimento promoveu um "sit in", negociou com
o novo proprietário e conquistou
para a "brasserie" uma certa autonomia administrativa e, sobretudo, culinária em relação ao grupo.
Noutro texto, ele discute as razões que determinaram os destinos opostos dos dois principais
cafés do bulevar Saint Germain, o
Flore, que é hoje em dia o mais
"in", e o Deux Magots, o mais
"out". Ao falar da transição da
"vieille cuisine" para a "nouvelle",
bem como as razões pelas quais
esta última fracassou no país de
origem, mas deu certo no exterior, Gopnik convoca recursos
provenientes da história e da sociologia, da psicologia e da antropologia, e suas conclusões são
igualmente úteis no contexto dessas variadas disciplinas.
Quando discute, por outro lado,
a Copa de 98, ele não apenas descreve e analisa alguns jogos ou a
reação francesa aos resultados
destes, mas, o que é mais importante, ajuda a esclarecer os motivos que levam seus compatriotas
americanos, apreciadores de
rugby, beisebol e basquete, a não
verem graça nenhuma no esporte
que o resto do mundo adora.
O fato de que se trata de um observador americano escrevendo
antes de mais nada para seus conterrâneos é especialmente conveniente, pois essa circunstância
impõe a Gopnik a obrigação de
reinscrever a realidade que comenta num outro sistema de referências, traduzindo-a em termos
de uma mentalidade diferente.
Por exemplo, num dos poucos
artigos que foge à rubrica "modo
de vida" (pois trata do julgamento
de Maurice Papon, um alto burocrata francês acusado de colaborar com os alemães durante a
guerra), ao falar sobre o governo
francês para um público que, como o americano, abomina em
princípio a idéia de um governo
grande e centralizado que interfira nas mais diversas esferas, o jornalista se vê forçado a explicar por
que a imensa estrutura administrativa e o funcionalismo público
são considerados, na França, coisas positivas.
É do conjunto de explicações
desse tipo que se pode deduzir em
que o "modelo francês" se distingue do americano e por que, do
ponto de vista do autor, é nisso
que reside seu encanto.
Paris to the Moon
Autor: Adam Gopnik
Editora: Random House (Nova York)
Quanto: US$ 24,95 (342 págs.)
Onde encomendar: www.bn.com,
www.amazon.com,
www.livcultura.com.br
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