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Novas receitas de São Cipriano
CARLOS HEITOR CONY
do Conselho Editorial
Publiquei, meses atrás, aqui
neste mesmo espaço, algumas
receitas de São Cipriano. Saio
de férias e encontro na correspondência e no e-mail as reclamações de leitores querendo
mais e melhor. Não custa atender àquilo que os locutores de
rádio anunciam como "insistentes pedidos". Continuo hoje
a divulgar piedosas receitas do
livro Único e Verdadeiro atribuído ao santo.
Preliminarmente, uma sugestão às autoridades deste país:
na página 300 do precioso livro
há uma infalível receita para
fazer ouro. Acredito que o ministro Malan e o BNDES, preocupados com os nossos lastros,
que obrigam o país a andar de
rastros pedindo dinheiro aos
outros, adquiram o compêndio
de São Cipriano. A receita é
simples, pois o ingrediente principal é a cabeça de bagre colhida à meia-noite das sextas-feiras. Ora, não nos faltam cabeças de bagre de diversos tamanhos e feitios. E quanto às sextas-feiras, nada há a temer: enquanto não reformarem o calendário, elas virão na véspera
dos sábados.
Mas deixemos ao Malan e à
Casa da Moeda a vil preocupação com o vil metal. Nós outros
passemos a feitiços mais salutares e necessários, como este proveitoso "Enquirimanço de São
Cipriano para aquecer mulheres frias".
Ingredientes: raiz de salgueiro: 20 gramas; sementes de saganha brava: duas mãos cheias;
cabelos de uma negra com a
raiz: 20 dúzias; farinha de
amendoim: 30 gramas; cantáridas: três; avelãs: quatro; uma
coruja inteira defumada e passada na máquina: obviamente
uma.
Modo de preparar: tudo moído e bem misturado até fazer
uma bola, a qual deixa-se ao relento por tempo de três noites
sem lua. No fim das três noites,
abre-se um buraco no colchão
da cama da mulher que se deseja aquecer, dizendo este esconjuro: "Pelas chagas de Cristo e
pelo amor que voto a (aqui o
nome fatal da amada), te esconjuro, salgueiro ligado à saganha, aos cabelos da negra, ao
amendoim, às cantáridas e à
coruja defumada! Quero que,
pela virtude de São Cipriano,
essa mulher me ame como eu a
amo!"
A receita é eficientíssima. As
revistas ditas masculinas, dedicadas ao assunto, poderiam fornecer, por mala postal, os ingredientes necessários. Fica difícil
a um morador de Realengo ou
do Brás arranjar no mercado as
cantáridas, a saganha brava
-ou a mansa, que também deve ser difícil de ser identificada
e comprada. Talvez não seja
trabalhoso defumar uma coruja, mas 20 dúzias de cabelos de
uma negra com raiz é problemático. O santo não especificou
de onde essas dúzias devem ser
tiradas, mas alguns interpretadores, ao longo do século 12, garantem que só servem os pêlos
da região pubiana.
Daí que as revistas eróticas, as
sérias e as de vulgar sacanagem,
poderiam criar um serviço de
mailing para ajudar seus leitores. Ganhariam todos.
Garantem também alguns
historiadores da magia que tal
receita fez furioso sucesso na
corte de Pepino, o Breve, que logo se tornaria Pepino, o Grosso,
cujo filho bastardo, Pepino, o
Longo, numa só noite conseguiu possuir 15 mulheres ardentemente apaixonadas por ele.
Também me perguntam sobre
a edificante história de São Cipriano e Elvira no deserto. Essa
sairá em breve. Não perdem por
esperar.
Finalmente, vamos ao que importa. Aqui está a utilíssima receita para "Obrigar a mulher a
confessar se é fiel ou infiel".
Apanha-se mel de abelha ao
meio-dia de uma terça-feira,
unta-se com ele uma cadeira de
braços e obriga-se a mulher a
sentar na cadeira. Feito isso,
bater-se-á na testa da mulher
três vezes, dizendo: "Pelo galo
que traiu São Pedro, diga-me se
tu me trais também!"
A mulher não precisa nem
abrir a boca. Basta que se atente para a cadeira: se no dia seguinte aparecer mosca em cima
do mel, é comprar revólver e
providenciar um bom criminalista como o Evandro Lins e Silva, que em seu tempo de mestre
no tribunal do júri absolvia
qualquer marido traído que fizesse justiça pelas próprias
mãos. Se as moscas, ao invés, recusarem o mel, é que a cara-metade é mais casta do que a Suzana, a casta. É providenciar uma
estátua para ela.
Por machismo, não ensinarei
a recíproca dessa curiosa mágica. As mulheres interessadas em
saber se os amantes e maridos
são fiéis que se munam com os
enquirimanços de São Cipriano. Pois há também a receita
"Para descobrir se o marido é
fiel ou infiel aos deveres contraídos para com sua mulher".
Encerrando, ensinarei a mágica que São Cipriano, muito
antes do advento do striptease,
bolou no deserto, em meio a penitências, "Para se ver dançar
nua a mulher que se deseja".
Lá vai: juntem-se três grãos de
mostarda, duas cantáridas,
uma pedra de enxofre e duas
penas de coruja. Coloque-se tudo num lenço de pessoa asmática e deixa-se o enquirimanço
na bolsa da mulher que se deseja ver dançar nua.
Depois, apague as luzes, dirija
o spotlight para cima da mulher
e aproveite. Quando cansar, suborne a polícia, abra um inferninho ou ofereça o número ao
programa do Faustão.
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