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Comida
Alquimia oriental
Curry ganha espaço em festival de restaurante paulistano; saiba a diferença entre o preparo indiano e o tailandês
JANAINA FIDALGO
DA REPORTAGEM LOCAL
Ser uma receita familiar é o
primeiro princípio: cada um
tem a sua combinação de especiarias e ervas que pode variar
até de acordo com a região e a
religião. Pode tanto ser um pó
quanto uma pasta. Sobre o nome também não há consenso.
O que para os ingleses e demais ocidentais ficou conhecido como curry (o clássico pó de
coloração amarela feito a partir
de uma mistura de várias especiarias), para os indianos trata-se do garam massala (em hindi,
garam quer dizer apimentado e
massala, mistura). Os hindus
usam o termo curry para nomear os cozidos que levam tal
composto de condimentos.
Divergências semânticas (ou
históricas) à parte, o prato faz
parte do repertório gastronômico da Tailândia e é a linha
mestra de um festival que começa hoje no Obá, em São Paulo, cuja inspiração vem do
Songkran, o Ano Novo tailandês (comemorado entre os dias
13 e 15). Dos 15 pratos, um terço
é composto por curries.
"Na verdade, curry é o
nome que os ingleses
colocaram no massala indiano, que é
uma mistura de
especiarias torradas e moídas.
Mas curry também pode ser
um prato, como um frango ao
curry, ou uma folha, a kari patta", explica Marcos Eituts, professor de gastronomia do Centro Universitário Senac.
Mistura apimentada
Se é possível dizer que há um
ponto de convergência entre o
preparo indiano e o tailandês,
ele reside no fato de ambos serem ingredientes pilados, geralmente num almofariz, que
dão origem a uma mistura picante.
Enquanto o garam massala
indiano é um pó feito com especiarias secas de personalidade
marcante (como cravo-da-índia, canela e cardamomo), o
curry tailandês é uma pasta que
leva poucas especiarias e muitas ervas e produtos frescos
(capim-limão, pimenta fresca,
folha de limão, galanga etc.).
"O curry tailandês é uma
mistura da China e da Índia, ou
seja, dos produtos frescos e dos
secos. À pasta adicionam-se
molho de peixe, leite de coco e
pasta de camarão", diz Eituts.
"Não se vê curry industrializado na Tailândia. Nos mercados de rua, a pasta crua é preparada e vendida sempre muito
fresca. É homogênea, não se
percebe nem um ingrediente
isolado", diz David Zisman, 59,
dono do Nam Thai, restaurante
presente no Rio de Janeiro e
em São Paulo que também comemorá o Ano Novo do país.
Outra diferença diz respeito
ao modo de preparo. A pasta
usada para fazer o curry tailandês é geralmente frita na gordura extraída do coco fresco ou
cozida num caldo. Já o garam
massala é diluído em óleo.
"Há elementos muito usados
na culinária tailandesa para finalizar o curry que na indiana
não se usa tanto", diz o mexicano Hugo Delgado, sócio do Obá.
"Um deles é o molho de peixe,
que é super salgado e tem um
cheiro horrível, mas quando é
colocado na comida fica divino.
Há também a pasta de camarão, mais fétida ainda, o açúcar
de palmeira, os talos de capim-limão e a raiz de coentro."
E uma curiosidade: enquanto
os tailandeses misturam os ingredientes com um intuito meramente gastronômico, para
obter determinado sabor, aroma e cor, os hindus seguem
uma lógica medicinal ao elaborar o garam massala. Cada elemento tem um propósito.
"A nossa receita é do século
12. Na época do Império Mongol, a Índia foi invadida pelos
muçulmanos. Eles queriam viver muitos anos e pediram aos
cozinheiros hindus uma comida saudável", diz Lakhi Daswani, dono do restaurante de comida indiana Tandoor.
"Os condimentos são medicinais. Tudo tem um fim. Cada um atinge uma parte do corpo."
Leia receitas do Obá e Tandoor
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