São Paulo, sábado, 12 de abril de 2008

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Livros - Crítica/"Nosso GG em Havana"

Gutiérrez faz paródia a Graham Greene

Cubano Pedro Juan Gutiérrez abandona realismo sujo e autobiográfico para emular o estilo do romancista britânico

JOCA REINERS TERRON
ESPECIAL PARA A FOLHA

Há algo em Cuba que não conseguiu ser destruído pela revolução castrista de 1959: a sua fama de paraíso sexual, já em evidência antes, na ditadura de Fulgencio Batista, e ainda em vigor agora, quando o combalido "El Comandante" passa o boné do totalitarismo ao irmão Raúl. É esse clima afrodisíaco o elemento principal de "Nosso GG em Havana", de Pedro Juan Gutiérrez, embora as iniciais do título (pertencentes ao romancista britânico Graham Greene, personagem do livro) sugiram outro protagonista.
A bandalheira dos clubes e a jogatina de cassinos havanos às vésperas da derrocada do regime de Batista servem de fundo para uma trama tão inusitada quanto improvável: acusado de assassinato, GG, escritor best-seller e católico de carteirinha, é preso no camarim de um teatro de sexo explícito.
Junto dele estão um ator pornô muito bem-dotado cujo nome é Caridad, e um cadáver não identificado. A anedota, graças à natureza do envolvimento do falso GG com Caridad, é inegavelmente boa, mas cessa por aí.
Então o verdadeiro Greene surge em cena para descobrir como seu bom nome foi para as cucuias (apesar dos esforços contrários de seu agente, interessado em lucrar com o episódio). Ele descobre assim (e um tanto desinteressado) a identidade do impostor e aproveita para cair na gandaia. Nesse ínterim, é seduzido por agentes do FBI, da KGB e da organização Habash, encarregada de assassinar criminosos de guerra nazistas, além de fazer amizade com um cafetão.

Estilo de Graham Greene
O breve e parodístico romance de Gutiérrez sugere uma série de possibilidades, mas não parece interessado em nenhuma delas. Com linguagem seca, mas não necessariamente precisa, emula o estilo direto da narrativa de Greene sem alcançar o mesmo efeito. A ironia comedida presente nos livros do britânico converte-se em grossura de menor calibre nas mãos do autor cubano.
Resta apenas o clima de antevéspera do apocalipse capitalista e um eco mal explicado de "Nosso Homem em Havana", romance de Greene homenageado no título. Tudo o mais fica por ser resolvido.
A ser solucionado resta também o enigma da migração de Gutiérrez, notabilizado pelo "realismo sujo" e autobiográfico dos seus livros pertencentes ao ciclo de Havana central (sendo "Trilogia Suja de Havana" seu maior acerto), para uma literatura referencial e reverenciadora. Nada a ver com censurar sua mudança, afinal é salutar que a literatura trafegue com liberdade nesses dias em que não há muita. Com tantos labirintos por aí, porém, nem sempre se acerta o endereço.


JOCA REINERS TERRON é escritor, autor de "Sonho Interrompido por Guilhotina" (Casa da Palavra)

NOSSO GG EM HAVANA
Autor:
Pedro Juan Gutiérrez
Tradução: Paulina Wacht e Ari Roitman
Editora: Objetiva/Alfaguara
Quanto: R$ 25,90 (128 págs.)
Avaliação: regular


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