São Paulo, quinta-feira, 12 de maio de 2011

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Nelson Rodrigues se perde na tradução, afirma pesquisador

Estudo de americano identifica dificuldade incomum de transposição das obras do autor para a língua inglesa

Ausência do estilo do autor nos textos traduzidos é um dos motivos do insucesso, segundo Alex Watson

MARCELO BORTOLOTI
DO RIO

O pesquisador e tradutor americano Alex Watson mora no Brasil desde 2007 e só teve contato com a obra do escritor e dramaturgo Nelson Rodrigues (1912-1980) depois que aprendeu a língua portuguesa.
Ao lê-lo, ficou intrigado por encontrar, na sua opinião, um dos autores mais geniais da literatura e da dramaturgia brasileira, mas que por algum motivo permanecia ignorado pelo público dos Estados Unidos.
"Sua única tradução comercial teve um impacto mínimo na cultura americana. Apareceu e logo foi esquecida", diz o pesquisador.
A dificuldade de penetração de Nelson Rodrigues nos EUA virou tema de um estudo que Watson desenvolve no departamento de letras da PUC do Rio.
Mesmo antes da conclusão do trabalho, ele já identificou uma dificuldade incomum em traduzir Nelson Rodrigues para a língua inglesa.
Em 2009, pela primeira vez uma editora dos EUA, a Host Publications, teve interesse em fazer uma edição comercial da obra de Nelson Rodrigues, e lançou "A Vida Como Ela É" ("Life Like It Is", em inglês). O resultado das vendas foi pífio.
Watson recolheu artigos produzidos nos EUA, conversou com editores e destrinchou a tradução da obra, feita por Alex Ladd.
Para ele, o que afasta o público americano é a ausência do estilo do autor e de suas expressões características, que se perdem na tradução, e com eles parte do humor e do tempero da obra.

FALSA ANALOGIA
"O problema é que a linguagem do Nelson está muito ligada a um espaço e um tempo específicos, o subúrbio do Rio nos anos de 1950, e transmitir isso para o inglês é complicado", diz Watson.
Um dos contos do livro, "Feia Demais", evidencia a barreira. A expressão "dar com os burros n'água", por exemplo, foi traduzida por "regret it", que literalmente significa arrepender-se. Já a descrição de uma dama com poucos predicados estéticos, que para Nelson é "um bucho", na versão inglesa ficou insossa: "an ugly woman".
Citado no estudo, o tradutor justifica que não bastaria empregar expressões americanas da época, o que poderia criar uma falsa analogia.
"Se eu fosse usar gírias dos EUA associadas aos anos de 1950, como "daddy-o" ou "square", estaria introduzindo um conjunto de imagens e expectativas para o leitor que são radicalmente diferentes da realidade no Brasil na década de 1950", explicou.
Segundo ele, foi melhor usar uma linguagem mais pitoresca sem associá-la a uma época nem a um lugar.
À Folha o tradutor Alex Ladd, que classifica Rodrigues como um grande estilista, disse que tentou manter essa característica, mas que não adiantaria "forçar a barra e querer encontrar a palavra idêntica".


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