São Paulo, sexta-feira, 12 de junho de 2009

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CINEMA/ESTREIAS

Ator faz périplo religioso para filme

Daniel de Oliveira encarna líder profético em "A Festa da Menina Morta", estreia de Matheus Nachtergaele na direção

Visitas a pai-de-santo, pajés e curandeiras marcaram preparação do ator para filme, que teve pré-estreia no Festival de Cannes 2008

FERNANDA EZABELLA
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

Sonhos com exu, cerimônia do daime, visitas a pajés. E, alguns galos mortos mais tarde, nasceu Santinho, ou melhor, Daniel de Oliveira achou o tom de seu personagem messiânico, o mais intenso de sua carreira.
O ator mineiro de 31 anos encarna em "A Festa da Menina Morta" um garoto adorado e temido pela pequena comunidade ribeirinha de Barcelos, a 400 km de Manaus. Ele faz Santinho, líder de um grupo religioso, formado após o aparecimento de um vestido rasgado de uma menina desaparecida.
A preparação para o longa durou alguns meses entre 2006 e 2007, incluindo ensaios no apartamento do diretor Matheus Nachtergaele no Rio e quatro semanas de aclimatação na cidade amazônica. Exercícios de butô e longas improvisações faziam parte do dia a dia do elenco, que tem também Cassia Kiss e Jackson Antunes. "Teve uma improvisação, por exemplo, de quase cinco horas, dentro da casa-santuário do Santinho", lembra Daniel à Folha. "Ficamos tão tomados com aquilo que ninguém queria sair dos personagens depois."
Daniel, que ficou famoso no papel de Cazuza no cinema, também fez uma espécie de périplo religioso para entrar no personagem. Foi a curandeiras e fez até um trabalho com galos a pedido de um pai-de-santo. "Foi um trabalho meio louco, até com matança [de galos], que eu não sou muito chegado, mas fiz por causa [da preparação] do filme", conta. "Essa época foi intensa, sonhava muito."
Daniel ainda se submeteu ao "sacrifício" de depilar as pernas, com ajuda da mulher, a atriz Vanessa Giácomo. "Isso foi o pior", diz, rindo. Também aprendeu a bordar e aparou as sobrancelhas, tudo para ajudar a fazer de Santinho um personagem extremamente feminino, que tem uma relação heterodoxa com o pai e vive paparicado pelas mulheres da região.
"Fui respeitando muito este personagem. Comprei uma briga pesada, não podia titubear [...] porque, se eu errasse, seria ridículo", diz. "Se errasse, acho que até desistiria de ser ator."
O filme se passa em dois dias, um para a preparação da festa dedicada à menina morta, a qual Santinho costuma "ouvir", e outro para a cerimônia em si. No processo de benzer os moradores, Santinho entoa um cântico, bolado pelo próprio Daniel durante um sonho. "Eu só acordei, levantei e escrevi, veio com a melodia e tal."

Próximos filmes
Mas a espiral mística ficou para trás na vida de Daniel, que tem emendado um trabalho no outro desde então, incluindo as minisséries da Globo "Decamerão" e "Som e Fúria".
Sua religião agora é a "Boca do Lixo", filme que está rodando no momento, sobre Hiroito Joanides, marginal ligado a prostitutas e traficantes do centro de SP nos anos 50 e 60.
Enquanto o ator falava com a reportagem, anteontem, fazia a barba dentro de um banheiro caindo aos pedaços no Cambridge Hotel, desativado há muito tempo, mas locação para o longa de Flavio Frederico.
Antes, neste ano ainda, veio outro marginal, desta vez da cena carioca, para o filme "400 Contra 1 - Uma História do Comando Vermelho", de Caco Souza, previsto para estrear no início de 2010. Daniel interpreta William da Silva Lima, um dos fundadores do CV, que passou mais de 30 anos preso.
"Tenho uma quedinha para fazer uns esquisitos", resume Daniel, com um óculos fundo de garrafa e orelhas levemente de abano, após maquiagem, pronto para viver o rei da Boca num prostíbulo paulistano.


A FESTA DA MENINA MORTA
Direção: Matheus Nachtergaele
Produção: Brasil, 2008
Com: Daniel de Oliveira, Dira Paes
Onde: Reserva Cultural, Espaço Unibanco Pompeia e circuito
Classificação: 18 anos




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