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GRAMADO 99
"À Sombra dos Abutres", primeiro longa de Leonel Vieira, trata drama político com sobriedade
Portugal surpreende com suspense
JOSÉ GERALDO COUTO
enviado especial a Gramado
O longa-metragem português
"À Sombra dos Abutres", de Leonel Vieira, exibido anteontem à
noite no 27º Festival de Gramado,
surpreendeu positivamente a crítica e o público, ao transformar
um drama político numa eficaz e
angustiante narrativa de suspense.
O filme, ambientado em Trás-os-Montes em 1962, conta a história de um mineiro de carvão comunista, Daniel (Vítor Norte),
que tenta cruzar a fronteira com a
Espanha acompanhado do cunhado e do filho adolescente, ferido a bala por um policial.
No encalço dos três está o mais
sanguinário e frio investigador da
Pide, a polícia política da ditadura
salazarista.
Narrado com extrema economia de meios e uma segura direção de atores, "À Sombra dos
Abutres" serve-se da linguagem
do filme policial norte-americano
sem no entanto se submeter aos
seus clichês (com exceção de um
ou outro deslize) e ao seu ritmo
descerebrado.
Nada é excessivo no filme: nem
os diálogos, nem os tiros, nem a
música. A própria política é tratada de modo sóbrio, sem panfletarismos. Só há uma cena em que o
diretor parece ter perdido a mão e
a contenção: uma cavalgada solitária do protagonista, ferido pela
notícia da morte do filho.
É o primeiro longa-metragem
de Leonel Vieira, 30, que veio a
Gramado para apresentá-lo, mas
já voltou a Portugal, onde prepara
seu novo filme.
Comédia boliviana
O outro longa-metragem exibido anteontem em competição, a
comédia boliviana "El Día que
Murió el Silencio", de Paolo Agazzi, arrancou gargalhadas e suspiros, estes últimos da platéia masculina, encantada com a beleza da
jovem atriz María Laura García,
presente no evento.
O filme é uma comédia de costumes ambientada num povoado
perdido no interior da Bolívia,
que tem a vida transformada
quando chega um forasteiro (Dario Grandinetti) e instala no local
uma rádio.
Pelo microfone da rádio, aberto
a mensagens da população mediante módicos pagamentos, vem
à tona tudo o que estava oculto
pela hipocrisia provinciana: amores, traições, ressentimentos.
A essa trama coletiva contrapõe-se a história tragicômica de
um triângulo amoroso cujo vértice feminino é uma garota (María
Laura García) mantida prisioneira pelo pai atrás dos altos muros
de sua casa.
Os dois homens que se apaixonam por ela são o radialista e um
jovem camponês, os únicos que,
casualmente, tiveram a (in)felicidade de vê-la por cima do muro.
Como numa boa história de
Jorge Amado, lirismo e picardia
andam juntos nessa simpática
crônica de uma província em
confronto com a modernidade
urbana.
A narrativa se perde um pouco
no final. Como se não soubesse
qual o desfecho mais adequado
para sua história, o diretor Agazzi
parece terminar o filme de três
maneiras diferentes, nenhuma
delas satisfatória.
Mas o longa boliviano é candidato forte a pelo menos um Kikito, o de melhor ator, para o argentino Dario Grandinetti, perfeito
em sua caracterização do malandro urbano.
Na sessão Premiére Gramado
de anteontem foi exibido o longa
"Tango", de Carlos Saura, co-produção argentino-espanhola que
concorreu ao Oscar de filme estrangeiro.
Quem viu "Carmen" pode imaginar como é o filme: é só trocar o
flamenco pelo tango, e Madri por
Buenos Aires.
O jornalista José Geraldo Couto viaja a convite da organização do Festival de Gramado
do Cinema Latino e Brasileiro
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