São Paulo, segunda-feira, 12 de setembro de 2005

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O artista plástico Frans Krajcberg lança compilação de fotografias da natureza brasileira e brada contra as queimadas das florestas do país

Alerta da natureza

Luciana Whitaker/Folha Imagem
Frans Krajcberg, cercado por exemplares de seu livro (que tem formato de folha), em galeria no Rio de Janeiro


LUIZ FERNANDO VIANNA
DA SUCURSAL DO RIO

No livro "A Natureza de Krajcberg", de fotos feitas pelo artista, mais de 90% das imagens são retratos da beleza das matas brasileiras. Mas, quando Frans Krajcberg fala, a matemática se inverte, e quase todas as suas palavras são contra as queimadas, o desmatamento da Amazônia, as agressões ao planeta. "O brasileiro é muito passivo. Diante do que estamos vendo, ouvindo e lendo, não temos o direito de dizer "basta de destruição!'?", brada Krajcberg, 84, polonês de nascimento e brasileiro naturalizado desde 1957.
Ele lança o livro hoje no Rio, na galeria Marcia Barrozo do Amaral, e quarta-feira em São Paulo, na galeria Sergio Caribé. Acompanhando os lançamentos, duas exposições. No Rio, são nove relevos de várias épocas, todos retrabalhados pelo artista. Em São Paulo, são 20 desenhos sobre madeira e mais 20 fotos feitas no pico Itabirito (MG) e no lugar onde vive, Nova Viçosa (BA).
Na Arte 21, galeria vizinha à da mostra de Krajcberg, será aberta também hoje uma exposição de Emmanuel Nassar. O artista paraense vem trabalhando sobre chapas metálicas que recolhe na periferia de Belém, processo semelhante ao de Krajcberg, que cria obras de denúncia a partir de restos de natureza destruída. Mas o material dos dois, como se vê, é quase oposto de tão diferente.
"Nunca houve tanto fogo [queimadas] na Amazônia. E ainda oficializaram o plantio de soja transgênica na região. Já destruíram o Espírito Santo, a Bahia e vão destruir a Amazônia. Onde estão os intelectuais, que não fazem nada? Os artistas parecem mais preocupados com o mercado", critica.
Na condição de artista reconhecido internacionalmente, convidado para falar até no fórum dos países ricos (e mais poluentes) em Davos (Suíça), Krajcberg também dirige sua verve revoltada a ONU, Unesco e todos os que estariam deixando a Terra ser destruída.
"Há provas de reação da natureza a tudo o que fazem contra ela, como isso nos EUA [o furacão Katrina]. Estão acontecendo fenômenos em lugares onde nunca aconteceram. Será por acaso?"
Para compensar, ele se anima com a repercussão da mostra que montou no parque de Bagatelle, em Paris. Inaugurada em junho com a presença do prefeito da cidade, Bertrand Delanoë, a exposição -de 30 grandes esculturas feitas com restos de árvores queimadas- devia ficar até 16 de outubro, mas teve sua duração prorrogada em mais um mês.
"Depois de tantos anos de luta, tive a impressão de que alguma coisa positiva pode estar acontecendo. Vi pessoas chorando, querendo mexer nessa situação", diz ele, que doou obras para o Espaço Krajcberg, criado há dois anos em Paris. O homônimo que ele tenta concluir em Nova Viçosa anda devagar. "Já construí dois prédios, faltam cinco. Mas parei. Eu me sinto humilhado. Nesses anos todos, não recebi do governo da Bahia sequer um "bom dia, o que você faz?'", queixa-se.
O sorriso se abre nos 10% de tempo em que fala das belezas naturais do Brasil, estrelas de "A Natureza de Krajcberg", um livro em formato de folhas de árvore. Depois de tantos compromissos urbanos em 2005, ele quer voltar às matas no próximo ano.
"Tenho fascinação por descobrir novas formas. Isso me anima um pouquinho a viver. No meio da floresta eu sou livre. Ninguém me machuca nem pergunta de que nacionalidade eu sou", empolga-se. No meio da floresta, Krajcberg não entra sem uma máquina fotográfica. Diz ter aprendido que "não existem duas imagens iguais" e capta tudo o que lhe chama a atenção -seu acervo tem mais de 80 mil imagens.
Nem todas as imagens lhe trazem boas recordações. "Uma vez entrei na mata e vi seis índios mortos, pendurados de cabeça para baixo em uma árvore. Fechei os olhos e bati a foto", conta ele, lembrando que cenas como essa e seu passado na Polônia -combateu na Segunda Guerra e perdeu a família no Holocausto- o impedem de fazer uma arte diferente da que faz. "De que outra maneira eu posso mostrar a minha revolta? Se eu gritar na rua, vão me pôr em um hospital de doidos."
NATUREZA DE KRAJCBERG. Editora: GB/Marcia Barrozo do Amaral. Quanto: R$ 80 (120 págs.)

NATUREZA DE KRAJCBERG. Quando: de hoje a 27/9 (de seg. a sex., das 10h às 19h; sáb., das 13h às 18h). Onde: galeria Marcia Barrozo do Amaral (av. Atlântica, 4240/subsolo 129, Copacabana, 0/xx/ 21/2521-5195). Quanto: entrada franca

FRANS KRAJCBERG. Quando: de 14/9 a 15/10. Onde: galeria Sergio Caribé (r. João Lourenço, 79, Vila Conceição, 0/xx/ 11/3842-5135). Quanto: entrada franca


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