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RETROSPECTIVA
Mostra do italiano vai até quinta, em dois cinemas de SP
Francesco Rosi narra sua busca pela verdade
FRANCESCA ANGIOLILLO
DA REPORTAGEM LOCAL
Ele busca a verdade.
Ao menos é o que conclui o cineasta italiano Francesco Rosi, 78,
ao desenrolar o fio que une o conjunto de seus 17 filmes. Deles, 16
têm cópias novas, que serão exibidas entre hoje e quinta, no Belas
Artes, em São Paulo (faltou só
"Armadilhas de Poder", de 91).
A mostra "Bravo, Rosi!", montada inicialmente para o Festival
do Rio BR 2001, encerrado na segunda passada, permite acompanhar os diversos temas que o realizador pôs sob sua lente, em sua
tentativa de flagrar a realidade.
O programa vai da Máfia de "O Bandido Giuliano" à corrupção da indústria da construção civil de
"Mãos sobre a Cidade", passando
por uma "terrena" fábula napolitana ("Felizes para Sempre") e
por adaptações de romances que,
é Rosi quem confessa, gostaria de
escrever se não contasse suas histórias nas telas de cinema.
Rosi, que costuma dizer que
não é sociólogo nem jornalista,
mas um narrador, voltou-se sobre sua própria obra em entrevista à Folha, por telefone, de Roma.
A seguir, os melhores trechos.
Folha - O que representa para o
sr. a homenagem prestada pela
mostra "Bravo, Rosi!"?
Francesco Rosi - É um grande
prazer, porque sei que há filmes
que nunca foram exibidos no Brasil e agora poderão ser conhecidos. A coisa importante é não só
fazer os filmes, mas que sejam vistos pelo máximo de pessoas.
Folha - Sua obra abrange temas
diversos. O que lhe dá união?
Rosi - O que há em comum é o
testemunho da história do meu
país: o cinema documenta a realidade da qual tira sua inspiração.
Esse é o fio que une todos.
Folha - Algumas vezes, porém, o
sr. adaptou livros, até uma ópera,
nem sempre italianos. Por que escolhe um ou outro caminho?
Rosi - A escolha depende. Os filmes que tirei de livros vêm de livros cujos argumentos sempre
me interessaram. Posso dizer,
sem presunção de minha parte,
que fiz filmes de livros que, se fosse escritor, gostaria de ter criado.
Folha - Como "Felizes para Sempre" se insere em tal conjunto?
Rosi - É uma fábula napolitana,
mas seu autor, dos anos 1600,
Giovanni Battista Basile, escreveu
fábulas realistas. Enquanto as fábulas nórdicas levam a uma evasão da realidade, cheias de gnomos, elfos, nas fábulas meridionais, o máximo com que se sonha
é um belo prato de comida, um almoço: são sonhos terrenos.
Folha - O sr. tem um "modus operandi", uma metodologia que repita sempre?
Rosi - A metodologia é sugerida
pela história do filme. Posso dizer
que, como faço filmes realistas,
adotei como método geral manter-me ligado à realidade, interpretando-a, mas sem alterá-la para torná-la mais cinematográfica.
Quando escolho temas da história
real de meu país, procuro ter rigor, respeito pelos fatos.
Folha - O sr. busca a verdade?
Rosi - Eu trabalho a realidade
para me aproximar da verdade.
Mas não tenho certeza de que um
filme realista chegue a ela. Muitas
vezes a verdade fica escondida pelo poder de modo muito hábil ,
tanto que alguns dos mistérios
que contei ainda estão na escuridão, como em "O Bandido Giuliano" ou "O Caso Mattei".
Folha - "O Bandido Giuliano" ficou de fora de Veneza porque foi
visto como documentário.
Rosi - Acho que foi uma desculpa para não lidar com um filme
incômodo. Quando meu filme
saiu, quase não se falava da Máfia.
Não se havia ainda, no cinema, falado abertamente de cumplicidade entre Máfia e instituições.
Folha - Já se sentiu censurado?
Rosi - Para fazer certos filmes, é
preciso saber como mover-se, para evitar obstáculos. Quando fiz
"O Bandido Giuliano", a primeira
coisa que fiz foi ir a Montelepre,
onde ele nasceu e viveu, e dizer
aos cidadãos: "Venho filmar sob
seus olhos para respeitar ao máximo a verdade". E quase todos
eram não-profissionais, camponeses, atores improvisados. Isso
deu ao filme aquele sabor de forte
verismo que fez com que Veneza
o chamasse de documentário.
Folha - Usar desconhecidos faz os
personagens mais críveis?
Rosi - Há filmes que precisam
ser contados por atores. Outros
não. Por exemplo, a senhora que
faz a mãe de Salvatore Giuliano tinha tidos muitos filhos, um dos
quais tinha uma história semelhante à de Giuliano. Como escolhi camponeses verdadeiros, personagens reais da região, teria sido difícil inserir naquele método
uma atriz, ainda que talentosa.
Folha - Um cineasta deve se concentrar em sua cultura?
Rosi - Eu creio que sim. Mas sem
nunca perder de vista a universalidade. Um problema que interessa ao mundo perde sua origem.
Folha - E como o cinema italiano
de hoje tem tratado deles?
Rosi - Nos últimos anos houve
um certo despertar, de novo, para
os temas da sociedade. Mas insisto: no centro, deve estar o homem, com seus pensamentos,
seus sonhos. Senão, fica árido.
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