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São Paulo, quinta-feira, 13 de março de 2003

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TEATRO

Penúltimo dos cinco textos da autora britânica, montado em 98, usa monólogos e tem direção de Rubens Rusche

Sarah Kane evoca arquétipos em "Ânsia"

PEDRO IVO DUBRA
DA REDAÇÃO

Sarah Kane (1971-99) está, de novo, entre nós. Duas semanas após aportarem por aqui Isabelle Huppert e Claude Régy com "4.48 Psychose", chega ao público brasileiro mais uma fração, um quinto da dramaturgia da autora.
Penúltimo dos cinco textos da curta e intensa obra da moça inglesa que se matou aos 28 anos, o inédito no Brasil "Ânsia" ("Crave", de 98) estréia amanhã no Centro Cultural São Paulo em direção e tradução final de Rubens Rusche, com a 3 de Sangue Cia. de Teatro. No elenco, Laerte Mello ("Shopping & Fucking"), Nádia de Lion ("Bilhete"), Bruno Costa ("Gilgamesh") e Solânia Queiroz ("Pobre Super-Homem").
Imediatamente anterior a "4.48 Psychosis" (título original), a peça mostra quatro personagens, ou vozes, sem nomes -A, B, C e M-, que jorram desejos e evocam lembranças em monólogos justapostos de nexos sugestivos, sem indicações de rubrica ou desenhos definidos de sentido.
"Essas vozes também têm uma sexualidade específica, perceptível na própria escrita. Além disso, parecem representar também arquétipos determinados: A é o homem de meia-idade, mas também Autor, Abusador, Anticristo; M é a mulher de meia-idade, a Mãe; B é um jovem e C, uma jovem (boy e child, o rapaz e a criança, respectivamente)", cita Rusche no programa da peça.
Mello, de quem partiu a idéia da montagem, assistiu à estréia mundial de "Crave" cinco anos atrás, em Edimburgo, na Escócia.
"Saí do teatro perplexo e com a certeza de que faria a peça. Comprei o texto de "Ânsia" na saída do teatro e os outros de Sarah publicados até ali. Mas iria estrear "Shopping & Fucking", de Mark Ravenhill. "Ânsia" teria de esperar", recorda o ator.
Rubens Rusche ("Fim de Jogo"), encenador, tradutor e estudioso da obra do irlandês Samuel Beckett (1906-89), uma das influências preponderantes de Kane, conta que a possibilidade de dirigi-la, pelo parentesco com "o território estético da escuridão" beckettiano, deixou-o relutante a princípio, pois buscava plagas mais "solares". Até a solicitação de Laerte Mello.
Após ler as cinco criações da dramaturga e ver ecos de "Play", de Beckett, e de "A Terra Devastada", poema de T.S. Eliot (1888-1965), em "Crave", o diretor buscou atingir um contraponto de silêncio à musicalidade nascida da "paisagem de palavras".
"Sarah Kane nos dá fôlego, uma nova luz de resistência contra a barbárie e a mediocridade. Propõe uma maneira de tentar sempre ressuscitar o teatro, torná-lo vivo", acrescenta. Quanto à tradução, diz que se valeu da experiência com o escritor da Irlanda.
"Ambos são simples, Sarah e ele não complicam. Procurei tomar cuidado com o ritmo, com a métrica. "Crave" não tem tanta gíria, apesar de a linguagem ser cotidiana. Tende mais ao poético."
Único da 3 de Sangue a estar presente no palco (a atriz Paula Lopes faz a assistência de direção), Mello convidou De Lion e Queiroz para a encenação; o trio, depois, tratou de convocar Rusche, que trouxe Costa.
O projeto, acalentado há algum tempo, chegou a ter concretização noticiada para agosto de 2002. O grupo prevê ainda executar a primeira criação de Kane, "Blasted", com direção de Marco Antonio Rodrigues. Cenários e figurinos de "Crave" são de Sylvia Moreira ("Almoço na Casa do Sr. Ludwig"). A cenografia, segundo Rusche, cria nichos que recordam o cimento pelo qual os habitantes das cidades estão rodeados.
Nem Laerte Mello nem Rubens Rusche viram a montagem de Claude Régy. Os ensaios, segundo ator e diretor, atrapalharam a escapada até o Sesc Consolação.


ÂNSIA. Texto: Sarah Kane. Direção: Rubens Rusche. Com: 3 de Sangue Cia. de Teatro. Onde: Centro Cultural São Paulo -0sala Jardel Filho (r. Vergueiro, 1.000, SP, tel 0/xx/11/3277-3611, r. 271). Quando: estréia amanhã, às 21h; sex. e sáb., às 21h; dom., às 20h; até 20/4. 60 min. 12 anos. Quanto: R$ 10.


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