São Paulo, Sábado, 13 de Março de 1999
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SAYÃO E VILLA-LOBOS
Juntos até o fim

IRINEU FRANCO PERPETUO
especial para a Folha

Embora tenha brilhado intensamente no Metropolitan de Nova York, a soprano carioca Bidu Sayão teve seu maior êxito fonográfico com uma melodia brasileira: a ária das "Bachianas Brasileiras nº 5", de Villa-Lobos. Sem o segundo movimento, a peça foi gravada em 1945, durante uma viagem do compositor aos EUA, com regência do próprio Villa-Lobos e a participação especial de Leonard Rosa -à época, primeiro violoncelo da Filarmônica de Nova York.
Editado pela Columbia, o disco obteve enorme sucesso, sendo votado, em 1984, para o Grammy Hall of Fame -uma espécie de premiação retroativa para contemplar as melhores gravações da época em que o principal troféu da indústria fonográfica ainda não existia.
A relação entre a cantora e o compositor remontava a um período no qual nenhum dos dois ainda havia atingido fama internacional. Quando Villa-Lobos, em 1924, promoveu concertos em Paris críticos franceses e norte-americanos destacaram o talento da jovem Sayão, louvando a pureza do timbre e a afinação.
Desde então, a soprano interpretou e gravou canções de outros compositores brasileiros, como Ernani Braga, e cantou ainda o papel de Ceci na ópera "Il Guarany", de Carlos Gomes.
Mas sua predileção era mesmo Villa-Lobos, o que acabaria por se revelar na década de 50. A cantora pendurou as chuteiras em 57; no ano seguinte, mal de dinheiro e de saúde, o compositor escreveu, para a Metro Goldwin-Mayer, a trilha sonora do filme "A Flor Que Não Morreu" ("Green Mansions"), de Mel Ferrer, com Anthony Perkins e Audrey Hepburn. Porém, o resultado levado às telas -e malhado pela crítica da época- foi uma versão bastante modificada da partitura de Villa-Lobos, assinada por Bronislaw Kaper.
Irritado, o compositor resolveu mostrar ao mundo como sua música era na realidade, transformando a trilha do filme em "Floresta do Amazonas", poema sinfônico para soprano, coro masculino e orquestra. Para a gravação, sob sua regência, com a Symphony of the Air Orchestra, convidou Bidu Sayão -que, embora resolvida a não mais soltar a voz em público, não podia recusar o convite do amigo.
Foi o canto do cisne de ambos. Villa-Lobos faleceu em 17 de novembro do mesmo ano, e Sayão nunca mais teve motivos para voltar a cantar profissionalmente.


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