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Cinema
Ken Loach vai (novamente) à guerra
Em "Ventos da Liberdade", cineasta inglês retoma um de seus temas prediletos, os efeitos da política sobre o indivíduo
Filme aborda a guerra civil irlandesa pela perspectiva de dois irmãos que ficam em lados opostos na luta pela independência do país
SILVANA ARANTES
DA REPORTAGEM LOCAL
O longa "Ventos da Liberdade", que estréia hoje no Brasil,
deu ao diretor inglês Ken
Loach a Palma de Ouro no Festival de Cannes do ano passado.
Era a oitava vez que Loach,
70, competia pelo prêmio. Foi a
primeira em que venceu. O retrospecto do cineasta em Cannes evidencia algumas de suas
características -Loach produz
com regularidade, desfruta de
prestígio internacional e é
adepto da abordagem dos grandes temas pela perspectiva do
drama individual.
Em "Terra e Liberdade"
(1995), que recebeu o prêmio
da crítica, Loach já se havia debruçado sobre uma guerra civil
-a espanhola.
No discurso de agradecimento à Palma de Ouro por "Ventos
da Liberdade", ele acentuou o
principal aspecto de sua obra -
que é o de ser indissociável de
sua visão política, à esquerda.
"Esperamos que nosso filme
signifique um pequeno passo
na relação dos britânicos com
seu passado imperialista. Se
ousarmos dizer a verdade sobre
o passado, talvez ousemos dizer
a verdade sobre o presente".
Na entrevista a seguir, feita
por telefone, de Londres, Loach
volta a falar do "império britânico" e de seu filme.
FOLHA - O sr. é tido como um cineasta engajado. Com "Ventos da
Liberdade", quis relatar um fato histórico para chamar à reflexão sobre
o momento atual?
KEN LOACH - Não é bem assim,
porque senão o filme seria uma
peça de propaganda. O que tentei fazer foi narrar o que aconteceu e tentar captar a experiência das pessoas que viveram isso, o tipo de escolhas que
tiveram de fazer, levando em
conta o heroísmo que demonstraram, para lutar por seu país.
FOLHA - Por que decidiu contar essa história pela perspectiva de uma
relação familiar, entre dois irmãos?
LOACH - Os grandes dramas são
usualmente histórias de família. Falar da guerra civil numa
família me pareceu a maneira
mais curta de contar a história
e de torná-la dolorosa.
Instintivamente, achávamos
que precisávamos tratar de
uma relação muito próxima
que seria rompida pela guerra
civil. Quer dizer, eles poderiam
ter sido grandes amigos, se tivessem sido irmãos em outro
tempo. Outra coisa que eu quis
foi que os dois fossem homens
íntegros, que não houvesse um
bom e um mau. Acho que os
dois tinham razão, a seu modo.
FOLHA - Há um paralelo possível
entre a guerra civil irlandesa e a
Guerra do Iraque?
LOACH - Há muitos aspectos diferentes entre elas, mas um similar: o fato de haver uma ocupação do exército frontalmente
contrária ao desejo do povo.
Logo, há uma espiral de violência, porque o exército é atacado
e reage com ainda mais violência. Tudo se torna cada vez pior.
Uma lição que deveríamos
ter aprendido é que uma ocupação militar num país estrangeiro vai ser um desastre.
Outro aspecto é que os ingleses estavam na Irlanda como
parte do império. A Irlanda era
colônia britânica. Americanos
e ingleses estão no Iraque como
parte do império americano.
FOLHA - O sr. assinou um documento de apoio ao governo Lula...
LOACH - [Interrompendo] No
começo, sim. Acho que houve
problemas [no governo]. Não
houve? Mas não posso falar como se fosse um especialista, estando no outro lado do mundo.
FOLHA - Qual sua expectativa para
o segundo mandato de Lula?
LOACH - O que posso dizer é
que ficamos todos muito felizes
no começo, quando Lula ganhou, pela vitória do Partido
dos Trabalhadores.
E, depois, bastante tristes,
com as cisões no partido. Imagino que seja muito difícil resistir à agenda neoliberal, aos
EUA, aos grandes bancos.
Sempre temos esperança de
que, quando a esquerda vença,
ela continue com uma política
de esquerda. Parece que houve
problemas nesse sentido.
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