São Paulo, sexta-feira, 13 de abril de 2007

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Cinema

Ken Loach vai (novamente) à guerra

Em "Ventos da Liberdade", cineasta inglês retoma um de seus temas prediletos, os efeitos da política sobre o indivíduo

Filme aborda a guerra civil irlandesa pela perspectiva de dois irmãos que ficam em lados opostos na luta pela independência do país


SILVANA ARANTES
DA REPORTAGEM LOCAL

O longa "Ventos da Liberdade", que estréia hoje no Brasil, deu ao diretor inglês Ken Loach a Palma de Ouro no Festival de Cannes do ano passado.
Era a oitava vez que Loach, 70, competia pelo prêmio. Foi a primeira em que venceu. O retrospecto do cineasta em Cannes evidencia algumas de suas características -Loach produz com regularidade, desfruta de prestígio internacional e é adepto da abordagem dos grandes temas pela perspectiva do drama individual.
Em "Terra e Liberdade" (1995), que recebeu o prêmio da crítica, Loach já se havia debruçado sobre uma guerra civil -a espanhola.
No discurso de agradecimento à Palma de Ouro por "Ventos da Liberdade", ele acentuou o principal aspecto de sua obra - que é o de ser indissociável de sua visão política, à esquerda.
"Esperamos que nosso filme signifique um pequeno passo na relação dos britânicos com seu passado imperialista. Se ousarmos dizer a verdade sobre o passado, talvez ousemos dizer a verdade sobre o presente".
Na entrevista a seguir, feita por telefone, de Londres, Loach volta a falar do "império britânico" e de seu filme.

 

FOLHA - O sr. é tido como um cineasta engajado. Com "Ventos da Liberdade", quis relatar um fato histórico para chamar à reflexão sobre o momento atual?
KEN LOACH -
Não é bem assim, porque senão o filme seria uma peça de propaganda. O que tentei fazer foi narrar o que aconteceu e tentar captar a experiência das pessoas que viveram isso, o tipo de escolhas que tiveram de fazer, levando em conta o heroísmo que demonstraram, para lutar por seu país.

FOLHA - Por que decidiu contar essa história pela perspectiva de uma relação familiar, entre dois irmãos?
LOACH -
Os grandes dramas são usualmente histórias de família. Falar da guerra civil numa família me pareceu a maneira mais curta de contar a história e de torná-la dolorosa. Instintivamente, achávamos que precisávamos tratar de uma relação muito próxima que seria rompida pela guerra civil. Quer dizer, eles poderiam ter sido grandes amigos, se tivessem sido irmãos em outro tempo. Outra coisa que eu quis foi que os dois fossem homens íntegros, que não houvesse um bom e um mau. Acho que os dois tinham razão, a seu modo.

FOLHA - Há um paralelo possível entre a guerra civil irlandesa e a Guerra do Iraque?
LOACH -
Há muitos aspectos diferentes entre elas, mas um similar: o fato de haver uma ocupação do exército frontalmente contrária ao desejo do povo. Logo, há uma espiral de violência, porque o exército é atacado e reage com ainda mais violência. Tudo se torna cada vez pior. Uma lição que deveríamos ter aprendido é que uma ocupação militar num país estrangeiro vai ser um desastre. Outro aspecto é que os ingleses estavam na Irlanda como parte do império. A Irlanda era colônia britânica. Americanos e ingleses estão no Iraque como parte do império americano.

FOLHA - O sr. assinou um documento de apoio ao governo Lula...
LOACH -
[Interrompendo] No começo, sim. Acho que houve problemas [no governo]. Não houve? Mas não posso falar como se fosse um especialista, estando no outro lado do mundo.

FOLHA - Qual sua expectativa para o segundo mandato de Lula?
LOACH -
O que posso dizer é que ficamos todos muito felizes no começo, quando Lula ganhou, pela vitória do Partido dos Trabalhadores.
E, depois, bastante tristes, com as cisões no partido. Imagino que seja muito difícil resistir à agenda neoliberal, aos EUA, aos grandes bancos.
Sempre temos esperança de que, quando a esquerda vença, ela continue com uma política de esquerda. Parece que houve problemas nesse sentido.


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