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ARTES PLÁSTICAS
Retrospectiva de Giacomo Balla tem 102 obras, parte delas de espólio recém-liberado do artista
Pinacoteca se abre para pai do futurismo
FRANCESCA ANGIOLILLO
DA REPORTAGEM LOCAL
"Com uma "super-ultra-fé" indestrutível, até mais ver daqui a
alguns séculos." Bem antes de
cem anos, porém, a Pinacoteca do
Estado e o Instituto Italiano de
Cultura unem-se para ir ao encontro de Giacomo Balla, autor da
conclamação acima.
Esta noite, com a presença do
presidente da Itália, Carlo Azeglio
Ciampi, e do governador de São
Paulo, Mário Covas, o museu abre
suas portas para deixar ver 102
obras que formam uma retrospectiva da produção do artista
nunca antes reunida: "Giacomo
Balla 1894-1946: da "Io, Balla" a
"Ball'Io'".
Parte das peças vem do espólio
recém-liberado do artista e é totalmente inédita. Todo o resto é
empréstimo de coleções particulares, como a da família Rotschild.
O curador da exposição, o italiano Renato Miracco, diz que a
mostra tem um caráter "circular".
Ela parte do divisionismo, que é
figurativo e subsequente ao impressionismo, passa pelo futurismo -uma das vanguardas européias que dominaram o panorama artístico do início do século
20-, pelo qual Balla é conhecido,
e volta ao figurativo, mas já modificado pelo mergulho futurista.
Daí o nome: "Io, Balla" (1894) e
"Ball'Io" (1940) são auto-retratos
do pintor que simbolicamente
abrem e encerram a exposição.
Miracco diz ter se preocupado
em deixar claras as facetas do artista e os conceitos teóricos do futurismo. Para isso, além das clássicas placas didáticas, buscou
criar um ambiente futurista:
mandou gravar uma trilha sonora, trouxe um filme que mostra a
família de Balla, reproduziu vitrines de objetos a partir de originais
da época, pintou tetos e paredes
seguindo os preceitos cromáticos
e decorativos do movimento.
"Tentei fazer uma mostra didática. Não quis fazer dela um espetáculo televisivo, pelo qual o espectador faz "zapping" de um quadro a outro. Se, em cem, ele vir dez
(obras), estou feliz", afirma.
Ruptura drástica
Balla aderiu ao movimento logo
no início -o "Manifesto Futurista" de Marinetti é de 1909; em
1910, Balla firma o manifesto técnico "A Pintura Futurista".
A decisão de deixar uma carreira que começava a dar fama e dinheiro foi radical. Em 1913, leiloou todos os seus quadros anteriores e afirmou querer ver-se livre do "fardo" da experiência. Recomeçou do zero, com um estúdio vazio e branco.
Gesto de genuína assepsia futurista. O movimento, por exemplo,
aderiu à Primeira Guerra Mundial, mas não pela questão política. Balla e seus contemporâneos
viam na guerra a possibilidade de
destruir o antigo para reconstruir,
segundo uma nova visão de mundo -como ele mesmo havia feito
em seu ateliê. "Nem os punks fizeram uma ruptura tão drástica",
comenta o curador.
A segunda sala da mostra pretende expressar tal ruptura. Nela
estão os manifestos futuristas e
uma grande foto (4,90 m x 4,90 m)
do ateliê do pintor. O objetivo é
criar o ambiente para que se compreenda o que será apresentado a
seguir, que nada (ou bem pouco)
tem a ver com a primeira seção,
divisionista e figurativa.
Os três principais questionamentos que embasam o Balla futurista estão aqui representados: a
"linha andamental", relacionada
ao estudo da velocidade; as "compenetrações iridescentes", em que
estuda a representação da luz por
valores cromáticos; a "linha-rumor", com a qual expressa graficamente o som do movimento.
Feita a transição, o visitante passa à terceira sala e ao Balla propriamente futurista, onde estão
aplicadas as teorias que se viram
na sala anterior. Ele assina agora
"Futur Balla" ou "Balla Futur".
As salas seguintes se aproximam da casa de Balla, com quadros que ficaram com a família e
objetos do artista. Isso porque,
não contente em romper com o
sistema de representação vigente,
em 1915, assina com Fortunato
Depero o manifesto "Reconstrução Futurista do Universo".
Não mais cabia ter a mesma casa e vestimentas. "Abandonem
sua casa oitocentesca e deixem
entrar a cor", dizem. E Balla aplicou suas idéias em sua própria
morada: biombos, tapeçarias,
porta-bengalas, pinturas de teto.
A arte aplicada, por sinal, era
fonte de renda para a família, já
que o futurismo nunca deu dinheiro. As filhas Luce e Elica bordavam tapetes, teciam tapeçarias
seguindo os desenhos do pai.
A sexta sala abriga "balfiori" de
Balla. Esses elementos figurativos,
painéis e esculturas feitos de madeira pintada, representam mutações da flor: forma, perfume e
movimentos do desabrochar
marcando o espaço.
A última sala fecha o ciclo. Nos
quadros que ilustram a volta ao figurativo é impossível não notar as
marcas da revolução futurista nos
fundos dos quadros, no uso da
cor, no enquadramento.
Ao centro, o auto-retrato "Ball'Io", de 1940. No verso, Balla escreveu, em 1940: "Se me olho no
espelho, me reconheço; se olho
meu interior, não me reconheço".
Mostra: Giacomo Balla 1894-1946: da Io, Balla a Ball'Io
Quando: hoje, às 19h, para convidados; de terça a domingo, das 10h às 18h
Onde: Pinacoteca do Estado (praça da Luz, 2, tel. 0/xx/11/229-9844)
Quanto: R$ 5 e R$ 2 (quinta grátis)
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