São Paulo, quinta-feira, 13 de julho de 2006

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Photo España-06 desbrava a natureza

Nona edição do evento, que acontece em Madri, mostra a tênue barreira entre documental e o artístico

EDER CHIODETTO
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA, EM MADRI

Natureza é o tema da nona edição do Photo España, evento anual que acontece em Madri e arredores, até o próximo dia 23. Mas é a natureza da fotografia documental que parece estar em xeque nas 62 exposições de fotógrafos de 33 países espalhadas pela cidade. Assim como nos dois últimos anos, a curadoria-geral de Horacio Fernández se pautou pela fotografia estritamente documental, em detrimento de abordagens mais experimentais. Estranha a opção, já que hoje o limite entre documento e arte está cada vez mais tênue.
Karl Blossfeldt (1865-1932), no Centro Cultural Conde Duque, é o contraponto histórico mais importante a contemporâneos como o dinamarquês Olafur Eliasson, o canadense Edward Burtynsky e a japonesa Rinko Kawauchi, entre outros. O brasileiro Caio Reisewitz é o único latino-americano selecionado pelo curador para a seção oficial do evento, restrita a 25 mostras.
Blossfeldt fotografou no início do século passado detalhes de flores, folhas e frutos para exemplificar as relações simétricas e matemáticas contidas na natureza. O olhar, objetivo e científico, revelou-se depois, em notáveis composições de formas, linhas e volumes que tendem a uma quase abstração.

Impossível classificar
Documental ou artístico? Na verdade ambos e nenhum. Tentar enquadrar a fotografia, sobretudo a contemporânea, em classificações totalizantes não é mais possível. O documental tende cada vez mais ao subjetivo e a fotografia "artística" vale-se mais do documental, haja vista a produção de Reisewitz, representante do Brasil nas últimas Bienais de Veneza, São Paulo e Buenos Aires.
Fortemente inspirada na produção contemporânea alemã, Reisewitz ocupa dois andares da Casa de América com a mostra "Reforma Agrária". A luz bem estudada e a composição clássica e sintética permitem ao espectador uma observação bastante detalhada. Na série "Aquidauana", o brasileiro fotografa barracos de sem-terra assentados sobre a terra vermelha pós-desmatamento. O barraco é construído com pedaços de plástico, metais e lona, estruturado por ripas de madeira. Ou seja, a madeira que da terra brotou a ela retorna após seguidas intervenções do homem. A árvore derrubada ressurge em pedaços que expõem a fratura do contexto sócio-político e econômico do país. A necessidade de expansão do homem implica necessariamente num atentado contra o ambiente.
Na mesma linha seguem as três mostras abrigadas sob o título "Madre Tierra", no Centro Cultural de la Villa, de Burtynski e Kawauchi além do britânico John Davies, que segundo o curador, formam o eixo conceitual do evento. As imagens de Burtynski flagram a ação do homem transformando e degradando a natureza, em grandes obras de engenharia civil. Frases e legendas simplistas sobre a preservação do planeta, porém, tornam seu discurso monótono, "ecochato". Davies vai na mesma linha fotografando num preto-e-branco formal e tecnicamente impecável a paisagem britânica na era pós-industrial. Para além da denúncia, gênese da fotografia documental, há a possibilidade de se enveredar pela relação do homem com os ciclos da natureza. A poesia também pode ser um pungente gesto político.


O jornalista EDER CHIODETTO viajou a Madri a convite da Galeria Brito Cimino

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