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Tacacá seduz superchef francês Pierre Troisgros
A convite da Folha, ele experimentou e comentou pratos da cozinha brasileira
Um dos mais importantes chefs do mundo, o fundador do restaurante Maison Troisgros é um dos criadores da "nouvelle cuisine"
JANAINA FIDALGO
ENVIADA ESPECIAL AO RIO
"Hummm, muito bom!" Foi
um caldo servido em cuias nas
ruas de Belém e de Manaus, o
tacacá, o alvo da interjeição de
Pierre Troisgros, 78. A convite
da Folha, o fundador do Maison Troisgros, restaurante em
Roanne que ostenta há 38 anos
a cotação máxima do "Guia Michelin", degustou alguns pratos
da cozinha brasileira.
Em visita ao Rio, Florianópolis e São Paulo (onde participou de um encontro no Centro
Universitário Senac), o chef
francês almoçou com a reportagem na última quarta no restaurante Siri Mole, em Copacabana. Entre um prato e outro,
comentou as iguarias degustadas, fez perguntas sobre os ingredientes, o preparo e quis saber se os brasileiros comiam
bobó e tacacá no dia-a-dia.
"É difícil, é mais uma culinária para o turista. O brasileiro
procura mais as cozinhas japonesa, francesa e italiana", responde o também chef Claude
Troisgros, 50, filho de Pierre.
Com o conhecimento de
quem vive há 26 anos no Brasil,
Claude explica ao pai o que é
tacacá. "Este é um prato extraordinário de Belém. Lá, eles
o servem na rua. A base é a
mandioca, e a folha é o jambu."
"Humm, muito bom! É ácido
e anestesia a língua", diz Pierre.
"É normal não descascar os camarões?", pergunta ao filho. "O
camarão seco não dá para descascar", explica Claude.
O que chamou a atenção do
pai Troisgros neste prato de
origem indígena à base de tucupi (o caldo da mandioca) foi a
acidez e a ligeira dormência
que as folhas de jambu provocam na língua. "Está no gene da
família Troisgros gostar de acidez. Quando se é criança, as
mães e as avós escondem as geléias para as crianças não pegarem. No meu caso, não eram as
geléias que a minha mãe escondia, eram os pepinos no vinagre", diverte-se.
"E o jambu foi uma descoberta extraordinária. Lembra
um pouco uma folha que eu uso
muito, a azedinha." (O escalope
de salmão com molho de azedinha é uma das especialidades
de Troisgros e ícone da "nouvelle cuisine", movimento que
ajudou a criar).
E se o prato não é muito ácido, caso do pintado grelhado
com purê de banana-da-terra
servido no almoço, lá vai Pierre
dar o seu toque: espreme umas
gotas de limão sobre o purê.
"É a coisa da acidez. Ele
achou que deveria levantar o
astral da banana", ri Claude.
Pierre dá outra garfada e comenta: "Interessante, principalmente o purê de banana,
que para mim é novo em termos de gosto".
Pierre, que já havia se impressionado com o ardor de um
molho de pimenta deixado sobre a mesa, se interessa pela sedutora pimenta-biquinho que
enfeita o arroz de pequi. "Adorei essa pimenta, é interessante
justamente por não ser muito
apimentada", diz. "Não estou
muito surpreso com o prato. É
um arroz com frango que poderia comer em qualquer lugar. E
o pequi é uma coisa meio sem
personalidade. Disso [aponta
no prato ao lado a pimenta-biquinho ainda não tocada] eu
gostei muito. Deveria colocar
umas seis em vez de uma." Em
seguida, pergunta a Claude:
"Você tem dessa pimenta para
eu levar?". Com a cabeça, o filho acena que não. Acompanhando o movimento do garçom, que retira os pratos, Pierre estica a mão, pinça com os
dedos a pimenta-biquinho rejeitada no prato vizinho e a leva
à boca: "Humm, muito boa!".
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