São Paulo, quinta-feira, 13 de agosto de 2009

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Festival tenta superar crise de identidade

Nesta noite, Xuxa será a rainha de Gramado, enquanto, na tela, plateia assistirá a um documentário sobre índios

Evento sofre com ausência de público; curadores do festival tentam atrair classe cinematográfica de volta, "mas mudança exige tempo"

Danilo Verpa/Folha Imagem
A atriz global Dira Paes é celebrada durante a abertura do
evento, no domingo


ANA PAULA SOUSA
ENVIADA ESPECIAL A GRAMADO

Hoje é dia de festa da Xuxa no Festival de Gramado. A apresentadora chegará à serra gaúcha à tarde, tirará fotos na Villa de Caras e passará pelo tapete vermelho que, desde 1973, a cidade estende sob o frio de agosto. A homenagem à "rainha dos baixinhos" antecederá a exibição do filme colombiano "Nochebuena" e do documentário brasileiro "Corumbiara", sobre o massacre de índios.
Onde essas coisas se encontram? "Ora, é tudo cinema", diz o presidente do festival, Alemir Coletto. "A Xuxa é uma celebridade com uma história de sucesso na filmografia brasileira e internacional. Todo brasileiro sabe da importância dela para a formação de várias gerações."
Como vem acontecendo desde a abertura, no domingo, a noite de hoje deve ser mais concorrida ao redor do tapete e no saguão do Palácio dos Festivais do que na sala de projeção. Na terça, ao fim do documentário "Cildo", da mostra competitiva, metade da sala estava vazia.
A abertura tampouco foi diferente. Enquanto do lado de fora turistas e fotógrafos se estapeavam por um sorriso de Dira Paes, a homenageada da noite, dentro o clássico "Memórias do Subdesenvolvimento", de Tomás Gutierrez Alea, corria pela tela entre um vaivém de espectadores inquietos.
A jornalista Kaciane Martins, da "Chiques e Famosos" não se espanta. Ao contrário. "Se você fica lá dentro vendo filme, perde o babado." Ela lamenta apenas que o "babado" ande um tanto chocho. "Agora, qualquer um que apareceu numa novela faz sucesso aqui. Foi-se a época em que havia famosos mesmo."

Crise
Perguntado sobre a ausência do público -dentro da sala, mas também fora dela- Coletto discordou da observação. Em seguida, atinou: "Tem as condições climáticas, com aquela chuva de domingo... E tem a gripe." Um olhar sobre o histórico do festival indica, porém, que o H1N1, neste caso, não merece todas as culpas.
A crise de Gramado começa na década de 1990, como espelho da crise do cinema brasileiro. Se a incorporação de filmes latino-americanos à programação deu ao evento um feitio internacional, tornou-o também menos definido. A confusão de identidade atingiu o pico no início dos anos 2000, com uma seleção sem pé nem cabeça e um enxame de atores globais.
O "boom" de celebridades ocorreu no momento em que a Globo Filmes decidiu usar o festival como plataforma de lançamento de suas produções. Mas, por questões estratégicas, a empresa recuou e, então, o festival ficou carente de filmes e de famosos. É aí que, em 2006, entram em quadro os curadores Sergio Sanz e José Carlos Avellar, prestigiados no meio cinematográfico.
"Quando Gramado começou a ser apedrejado, por causa da qualidade dos filmes, a prefeitura entrou em pânico. Procuraram quem pudesse repensar seu formato", conta Sanz. "Chegamos com um projeto radical. Estipulamos uma seleção de filmes mais autorais e indicamos homenageados pouco conhecidos. Não temos nada a ver com a Xuxa. O que estamos tentando fazer é atrair a classe cinematográfica de volta."
Avellar, por sua vez, pondera ser impossível, hoje, discutir cinema sem algum tom de festa. "Não sei se uma metade é incompatível com a outra. O que se pode discutir é em que medida cada uma das coisas acontece", diz. "Fomos chamados a interferir num modelo. Mas não podemos perder um público sem que outro tenha sido conquistado. Mudar as coisas exige um certo tempo."


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