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Crítica/DVD
Como no livro original, filme "Lobo da Estepe" é para raros
Obra de 1974 virou cult ao levar para o cinema o romance de Herman Hesse
IVAN FINOTTI
EDITOR-ADJUNTO DA ILUSTRADA
Renegado, esnobado, esquecido, cultuado e, finalmente, lançado em
DVD. Basicamente é esse o caminho tortuoso do filme "O Lobo da Estepe", de 1974, dirigido
e escrito pelo americano Fred
Haines. Trata-se de uma adaptação livre (e como poderia ser
diferente?) do romance de
mesmo nome do germano-suíço Herman Hesse (1877-1962).
Nobel de literatura em 1946,
Hesse havia publicado "O Lobo
da Estepe" em 1927. É, provavelmente, seu principal e mais
controverso romance. A história trata de Harry Haller, um
homem com 47 anos que não
consegue se adaptar à vida na
sociedade. Sente-se aprisionado pelas convenções morais,
assim com seu eu interior, um
lobo selvagem, está aprisionado dentro da casca humana.
Resolve, assim, suicidar-se no
dia em que completar 50 anos.
Em suas andanças pela cidade, porém, depara-se com uma
casa noturna onírica chamada
Teatro Mágico, que só admite a
entrada de "loucos e raros",
pois o preço do ingresso é a sua
mente. Ali, Haller conhece
Hermine e Pablo, que o conduzirão numa balada de sexo sem
amarras e drogas sem culpa, direto ao inconsciente.
Por suas características rebeldes e transgressoras, o romance foi redescoberto pela
contracultura nos anos 60
(chegou a dar o nome à banda
de rock norte-americana Steppenwolf, de "Born to Be Wild").
O filme
Lançado em 1974, após sete
anos de produção tempestuosa,
"O Lobo da Estepe" traz o grande ator sueco Max von Sydow
no papel de Harry Haller. Foi a
única obra dirigido pelo californiano Fred Haines.
O filme, assim como o Teatro
Mágico original, é para raros.
Apesar de trazer uma narração
em off do protagonista, o que
ajuda em muitos momentos,
não há uma linearidade fácil.
O que há é uma explosão de
ideias e técnicas: uma parte da
história se passa em desenhos;
outro momento usa animação
de fotos; imagens se congelam
durante a ação; céus verdes e
árvores cor de laranja; efeitos
especiais pululam por todo
canto. Parte das cenas são gravadas em videoteipe. Usam-se
muitos efeitos especiais de vídeo, como o de cromaqui -no
qual o ator contracena num
fundo azul, no qual mais tarde é
aplicado outro fundo.
Mas essas cenas se tornam
um tanto simplórias quando
vistas hoje. Sumiços e aparições de surpresa, muitas acompanhados por ruídos ridículos
fazem lembrar episódios televisivos de "Os Trapalhões". É
preciso, portanto, dar algum
desconto ao diretor e à década à
qual o filme pertence.
Tudo contribui para dar uma
cara lisérgica, surreal, claustrofóbica, estranha, ao mesmo
tempo em que é underground,
caseira, de fundo de quintal.
As filmagens
Antes do diretor, "O Lobo da
Estepe" foi arquitetado pelo
produtor Melvin Fishman no
final dos anos 60. Apaixonado
pelo livro e por Carl Jung (de
quem Hesse era discípulo),
Fishman queria "o primeiro filme jungiano", mergulhado na
psicanálise, nos símbolos e nas
imagens de sonhos como expressão do inconsciente.
O primeiro diretor convidado foi Michelangelo Antonioni,
que pensou em Walter Matthau e Jack Lemmon para o papel principal, antes de declarar
a obra infilmável.
A MGM sondou atores como
Marlon Brando e James Coburn e escritores como Fred
Haines, cujo roteiro para "Ulisses", de James Joyce, havia sido
indicado ao Oscar em 1968.
Querendo escapar das garras
dos estúdios, Fishman carregou uma equipe de produção
até a Basiléia, cidade suíça onde
"O Lobo da Estepe" havia sido
escrito e, curiosamente, onde
foi descoberto o LSD.
Lá, o obcecado produtor passava horas filmando o escritor
Fred Haines lendo sua versão
do roteiro embaixo de uma
lâmpada de 150 watts. Até Timothy Leary, o guru das drogas, apareceu por lá e foi testado para o papel de Harry Haller. Após sete anos de tentativas, finalmente, Sydow, Dominique Sanda e Pierre Clement
("A Bela da Tarde", de 1967) começaram a filmar, com Haines
na cadeira de diretor.
Terminadas as filmagens, um
financiador assumiu o controle
da obra, o que acarretou em um
ataque cardíaco para Fishman.
Foram feitas 80 cópias com cores erradas (o olho azul de Dominique Sana ficou marrom) e
o filme foi um fracasso. Dois
anos depois, ainda lutando para
ter controle sobre a obra, Fishman teve outra parada cardíaca. Morreu sozinho e triste, como o lobo da estepe planejara.
O LOBO DA ESTEPE
Direção: Fred Haines
Lançamento: Platina Filmes (R$ 20,
em média); 18 anos
Avaliação: bom
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