|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
EUA
Filme reúne luta de Ali e `Woodstock africano'
CLÁUDIA TREVISAN
de Nova York
Qual é o interesse de um documentário sobre uma luta que
aconteceu em 1974 no Zaire? Enorme, quando se trata de Muhammad Ali, o ex-campeão mundial de
box que assombrou o mundo com
sua velocidade no ringue e suas
posições políticas e religiosas.
Estréia hoje nos EUA "When
We Were Kings" (Quando Éramos Reis), filme que revive o histórico confronto entre Ali e o então campeão mundial George Foreman, considerado imbatível.
Ali tinha 32 anos e havia sido
campeão mundial dez anos antes.
Foreman estava com 25, era dono
do título mundial e vinha de uma
série de vitórias que poucos acreditavam que seria interrompida.
O documentário, dirigido por
Leon Gast, demorou 23 anos para
ser concluído. Gast, que é branco,
fez um filme sobre um embate entre negros, em um país negro e
movido por música negra.
Os organizadores da luta realizaram no Zaire uma espécie de
"Woodstock africano": três dias
de música negra com a participação de James Brown, B.B. King,
The Spinners, The Crusades, Miriam Makeba e outros.
"When We Were Kings" reúne
os dois eventos -a luta e o festival-, com cenas das viagens para
o Zaire, a preparação dos atletas e
dos músicos e os embates, no ringue e no palco.
A trilha sonora traz parte dos
concertos realizados no Zaire e
composições de novos grupos. Os
aclamados Fugees fizeram a música "Rumble in the Jungle" especialmente para o filme.
"When We Were Kings" ganhou o prêmio de melhor documentário da Associação Nacional
de Críticos de Filme do país.
A narrativa é do escritor Norman
Mailer, que acompanhou a luta no
Zaire. O cineasta Spike Lee também faz comentários sobre Ali.
Corte no supercílio
A luta estava programada para o
dia 25 de setembro de 1974. Quatro
dias antes, quando os músicos, os
atletas e parte do público já estavam no Zaire, o embate foi adiado
por seis semanas.
Foreman havia cortado o supercílio durante o treinamento e só
poderia lutar depois de o ferimento estar cicatrizado.
Quem pôde saiu do Zaire imediatamente. Ali e Foreman foram
impedidos de deixar o país pelo ditador Mobutu SeSe Seko, o mesmo
que enfrenta uma guerra civil hoje.
Os músicos fizeram o seu
"Woodstock africano". O primeiro dos três dias foi um fracasso. A maioria dos estrangeiros havia deixado o país e a população
local não tinha condições de pagar
os ingressos. A saída foi fazer
shows gratuitos nos dois últimos
dias.
Nas seis semanas que antecederam a luta, o diretor Leon Gast
acompanhou o treinamento de Ali
e Foreman, com atenção especial
para o primeiro.
Vitória
Ali aparece no documentário
com toda sua fúria, autoconfiança,
orgulho negro e irreverência. Desafia Foreman, diz que está melhor
do que estava dez anos antes e afirma que vai vencer. E vence.
"Se você pensa que o mundo ficou surpreso com a renúncia de
Nixon, espere até eu chutar o traseiro de Foreman."
Os dois boxeadores ganharam
US$ 5 milhões cada um pela luta,
pagos pelo ditador Mobutu, que
estava interessado em promover a
imagem de seu país.
Ali já chegou no Zaire como um
rei. Havia sido campeão mundial e
perdido o título em 1967, quando
se recusou a lutar na Guerra do
Vietnã. Também havia se convertido ao islamismo e abandonado o
nome de Cassius Clay.
O ex-boxeador participou da entrevista coletiva sobre o filme, realizada na última segunda-feira em
Nova York. Emudecido pelo Mal
de Parkinson, ele respondeu a apenas uma pergunta, sobre o que havia sentido em ver a luta 23 anos
depois. "Eu me senti velho",
murmurou Ali.
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
|