São Paulo, sexta-feira, 14 de abril de 2000


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CINEMA - ESTRÉIA

"Gêmeas" comprova que cinema é só ilusão

Regina Agrella/Folha Imagem
Na frente do espelho, Fernanda Torres revive o personagem do filme "Gêmeas", que estréia hoje


LUIZ CAVERSAN
da Reportagem Local

A atriz Fernanda Torres, 34, chega hoje às telas do país em versão dupla face. É verdade: ela faz o papel de Marilena, a casadoira, e também o de Iara, a assanhada, no filme "Gêmeas", direção do estreante Andrucha Waddington para o argumento extraído de conto de Nelson Rodrigues.
No texto e no filme, duas gêmeas idênticas disputam o mesmo homem e... bem, quem conhece Nelson Rodrigues pode imaginar no que vai dar isso.
Na tela, Fernanda Torres dá um show de interpretação, o que, aliás, foi reconhecido pelo Festival de Brasília do ano passado, que lhe deu o prêmio de melhor atriz.
Uma performance que, segundo ela, nada mais é que a revelação pura e simples de como se faz cinema. Ou de como o cinema é pura ilusão.
A ilusão, mais especificamente, de fazer duas personagens com a mesma atriz, sem usar trucagem na montagem da película ou computação gráfica. Apenas recorrendo a uma dublê e às possibilidades de simulação que a arte cinematográfica permite.
Em apenas três rápidos momentos do filme (que tem apenas pouco mais de 1h de duração) há, sim, o truque de montagem que exibe a Fernanda/Iara ao lado da Fernanda/Marilena, ambas de frente.
No restante do filme, é tudo feito na base da ilusão.
"Acho que gêmeos no cinema sempre impressionam o público", disse a atriz em entrevista à Folha uma hora antes da pré-estréia do filme em São Paulo, segunda-feira passada. "Isso deveria ser considerado um gênero: tem ator que faz monólogo, tem o que faz tragédia, o que faz comédia e o que faz gêmeos. Porque causa impacto. Sabe, como os truques de um mágico? O coelho da cartola, o lenço na manga, a mulher cortada ao meio? O papel de gêmeas é assim: uma ilusão."
Para Fernanda, a simulação de diálogos que se deve fazer em situações em que se trabalha com a mesma atriz em dois papéis é a mesma que se faz a todo instante em qualquer filme.
"Isso é a base do cinema: você contracena com a câmera, com um ponto de luz ou contracena com absolutamente nada. E o espectador pensa que você está lá, falando com alguém, e esse alguém está falando contigo."
No caso do atual filme -ela não sabe ao certo, mas acha que é o 20º de sua carreira-, as cenas foram feitas assim: primeiro, ela filmou todos os diálogos de Marilena contracenando com a dublê. Depois incorporou a Iara, com a dublê invertendo o papel. O resultado impressiona pelo sincronismo e verossimilhança, com apenas um ou outro momento menos convincente.
Fernanda afirma que essa "mecânica do cinema" ocorre de maneira diversa do que ela chama de "mecânica do teatro". "No caso do teatro, está tudo centrado no ser humano. Você repete uma cena à exaustão até conseguir criar um determinado clima, que será repetido dali pra frente, em todas as sessões. No cinema é diferente: o que importa é o contexto em que você está atuando, as pessoas e os equipamentos que estão à sua volta."

Nelson e o lugar-comum
Apesar das duas dezenas de filmes e outras tantas peças de teatro em que trabalhou, em "Gêmeas" Fernanda entra em contato com o universo dramático de Nelson Rodrigues pela segunda vez. A primeira foi durante sua participação em dois episódios de "Traição", também produzido pela Conspiração Filmes, também baseado na obra do escritor carioca e também no qual trabalhou sua mãe (Fernanda Montenegro), tendo o irmão, Cláudio Torres, como diretor.
Em "Gêmeas", Fernanda Montenegro faz uma ponta, como mãe das duas moças vividas por sua filha. O papel do pai fica por conta de Francisco Cuoco e o do noivo encalacrado entre as duas moças é de Evandro Mesquita.
De Nelson Rodrigues, Fernanda aponta um paradoxo: "Na verdade, tudo aquilo de que ele trata é lugar-comum. Por exemplo, um homem ficar perdido diante de irmãs gêmeas, desejando as duas. Mas ele vai fundo. Tão fundo que consegue sair do lugar-comum".


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