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CDS
RARIDADE
Disputado por fãs e colecionadores, disco é relançado pela Trama
Tim "Racional", agora em CD, sobrevive à viagem mística
MARCOS AUGUSTO GONÇALVES
EDITOR DA ILUSTRADA
Em 1975, Tim Maia, já um cantor e compositor de sucesso,
lançou um vinil esquisito. As letras das canções usavam vocabulário esotérico, falavam em "imunização racional" e recomendavam a leitura do "livro de Deus"
-o "Universo em Desencanto".
O disco estava na contramão.
Para o público de MPB, mesmo
aquele menos dogmático e mais
esperto, que se interessava pela
movimentação "black" de Tim,
Cassiano e Hyldon, a pregação
mística soava como um despropósito. Essa percepção era possivelmente acentuada pelo fato de o
país viver sob censura e regime
militar. Se havia uma demanda
por "mensagens", ela estava voltada para a semântica do protesto
político, que se especializava em
driblar censores com truques e artifícios poéticos, exemplarmente
representados em parte da obra
de Chico Buarque.
Havia, além disso, uma concorrência fortíssima, fosse na música
mais politizada ou não. Àquela altura -já se vão 30 anos-, estavam em plena forma, além do
próprio Chico, nomes como Caetano, Gil, Jorge Ben, Milton, Raul
Seixas, Rita Lee, Novos Baianos
etc. Acrescente-se o fato de o disco ter tido uma tiragem pequena e
ter sido logo renegado pelo autor
-e fica fácil entender por que
ninguém deu muita bola para a
viagem do músico carioca.
Mas havia um detalhe fundamental: quem colocasse o LP
"Tim Maia Racional - Volume 1"
no toca-disco e possuísse ouvido
para ir além da papagaiada mística perceberia que se tratava de
uma jóia musical.
"O Tim estava no auge", lembra
o trombonista Serginho, da banda que viria a ser posteriormente
celebrizada com o nome de Vitória Régia. Aos 32 anos, longe da
bebida, do fumo e das drogas, o
cantor estava com a voz tinindo,
límpida e poderosa.
As canções do disco, agora relançado em CD pela Trama, haviam sido escritas para um outro
projeto. Fariam parte de um vinil
a ser lançado pela RCA. Catequizado pela seita, Tim foi à gravadora e mudou o canal de voz das fitas, introduzindo novas letras. A
RCA não gostou, e o disco acabou
saindo por um selo independente,
o Seroma -que reúne as iniciais
de Sebastião Rodrigues Maia, o
nome de batismo da figura.
Segundo Serginho do Trombone, o "Universo em Desencanto"
foi apresentado a Tim pelo músico Tibério Gaspar. "O pai dele, o
professor Gaspar, era da seita.
Outros músicos, como o João Roberto Kelly, também aderiram",
conta. Ele lembra que Tim passou
a desprezar tudo o que fosse considerado "supérfluo": "Ele levou a
gente ao apartamento dele em
Copacabana e pediu para tirarmos tudo o que ele dizia ser supérfluo. Até o forro de gesso do teto a gente arrancou".
A qualidade musical do disco e a
dificuldade de encontrá-lo o
transformaram num produto disputado por fãs e colecionadores.
Não são poucos os que têm cópias
piratas, feitas pelo amigo do amigo ou baixadas da internet. "Tim
Maia Racional" também cruzou
fronteiras e chamou a atenção de
músicos estrangeiros -entre
eles, David Bowie, que, segundo
dizem, adorou o que ouviu.
O CD, de fato, é ótimo. Nem todas as letras são intragáveis. Há algumas menos contaminadas pela
pregação e outras que, mesmo
"racionais", podem ser relidas,
hoje, de maneira divertida.
Mas o verdadeiro conteúdo do
CD está no som, na voz, no incrível talento antropofágico desse
incontrolável, genial e generoso
músico que foi Tim Maia.
Tim Maia Racional
Artista: Tim Maia
Gravadora: Trama
Quanto: R$ 35, em média
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