|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
TEATRO
Apresentadora e atriz substitui Carolina Ferraz em peça dirigida por Elias Andreato, em cartaz no Teatro Folha
Galisteu encarna loira virginal no palco
PAULO SAMPAIO
DA REPORTAGEM LOCAL
Adriane Galisteu já é quase do
ramo, mas ainda não chama peça
de "espetáculo", como faz o povo
do teatro. Despretensiosa no ensaio de sua terceira experiência no
palco, ela, que não é boba, entra
em cena reforçando seus álibis.
"Eu recebi a proposta na quarta
[dia 5], passei a noite lendo o texto
e respondi que sim na quinta. Ou
seja, estou ensaiando só há uma
semana", conta ela, que substitui
a atriz Carolina Ferraz a partir de
hoje em "O Rim", peça de Patrícia
Melo baseada em uma história
real.
Galisteu faz Rosário, uma moça
de aproximadamente 30 anos,
virginal, que mora com a mãe entrevada e o irmão homossexual;
trabalha em uma biblioteca e é seduzida por um aproveitador, que
promete se casar com ela. Às vésperas do casamento, ele se declara
impedido por causa de um problema grave nos rins. O irmão homossexual oferece um rim para o
transplante, desde que o noivo,
supostamente rico, produza um
espetáculo sobre Maria Callas. O
aproveitador vende o rim e some.
Os colegas atores elogiam Galisteu com termos do jargão teatral
que parecem especialmente criados para essas ocasiões (pois não
querem dizer muita coisa). Afirmam que ela "imprime singeleza"
ao personagem, "uma delicadeza", "um frescor", "uma personalidade própria".
Como de costume em um ensaio de teatro, todo mundo ali parece viver em um mundo particular, onde os egos devem ser massageados ininterruptamente
-para garantir a segurança de
todos em cena.
Cauteloso, o diretor Elias Andreato diz o que se espera: "Essa
moça foi ótima. Em dois dias estava com o texto decorado, tinha
pegado as marcações e o tempo
do espetáculo. O importante é
que ela quer muito, se empenha, e
uma das principais prerrogativas
de um ator é a disciplina".
Preconceito com quem não
possui formação teatral? Ninguém tem. A veterana Ivone Hoffman, 41 anos de teatro e agora
mãe de Adriane na peça, escolhe
as palavras.
"É muito bonito você ver a pessoa ingressar nesse universo, com
pouca vivência de palco, e fazer
com que a ação aconteça. Por que
você acha que os diretores de cinema gostam tanto de atrizes que
não vêm do teatro? Porque elas
chegam desarmadas, sem cacoetes, se entregam ao personagem
sem resistências."
Ensaio
Evidentemente, todos se negam
a fazer comparações com "a composição" de Carolina Ferraz, já
que "cada ator estabelece uma relação com o personagem".
"Muda o registro de interpretação. São energias diferentes", diz,
vago, Eduardo Reis, que faz o
aproveitador no espetáculo.
"O que importa é querer realizar um trabalho bom. Fiquei surpreso com a Adriane", diz Bruce
Gonlevski, o irmão homossexual
de Rosário.
Adriane Galisteu chega ao teatro por volta da meia-noite, hora
em que o ensaio estava marcado.
Traz seis amigos gays: "Vim com
uma miniplatéia", diz, rindo. Veste uma calça de agasalho e uma
camiseta, ambos pretos; o tênis de
corrida é abóbora. Ela se deita na
boca de cena, relaxada, e o fotógrafo começa a fazer seu trabalho.
"Não, gente, eu estou sem maquiagem", diz ela, já na terceira
pose para a câmera.
O ensaio começa. Lá pelas tantas, Rosário, a moça simples, aparece esfregando o chão de casa
vestindo um twin set (vestido e
casaco curto da mesma cor) rosa-claro. De acordo com um dos
amigos gays que a assiste e é figurinista, trata-se de "um modelinho retrô anos 50". Em outra cena, quando vai sair com o aproveitador, Rosário aparece ainda
mais glamourosa. O amigo-figurinista explica que "a saia branca
evasée, rodada, e o casaquinho
azul royal, justo, fazem um conjunto bem legal". O sapato? "É
normal [muito alto, dourado,
com strass na frente]." Rosário
usa modelos que lembram os de
Grace Kelly em "Alta Sociedade".
"Tentei me enfeiar", diz Adriane, um pouco decepcionada. "Ela
[a Rosário] é tão sem postura no
palco, o cabelo horroroso..."
Como a personagem gosta muito de ler (mora em uma casa cujas
paredes forradas de livros de alto
a baixo fariam o bibliófilo José
Mindlin morrer de inveja), Adriane usa em cena óculos grandes de
armação preta. "Dri, esses óculos
já estão no "Glamurama'", comemora o seu assessor de imprensa,
Nélson Sacho. Os seios de Rosário
parecem maiores que os de
Adriane. Pôs silicone? "Não, é um
sutiã modelador", diz Sacho.
Na composição da moça ingênua, Adriane volta e meia resvala
no teatro infantil, mas isso é um
recurso já bastante comum entre
atrizes modernas. "O papel não é
fácil. A Rosário é muito diferente
de mim", diz a apresentadora.
O problema é que a imagem
aguerrida da apresentadora de
TV eventualmente contamina o
personagem na peça. Não é fácil
acreditar que alguém possa se
aproveitar de Adriane Galisteu
-e, no fim, ainda deixá-la por
outra. Como pode um homem,
com ou sem rim, dispensar uma
loura alta, de olhos verdes, vestindo um twin set e, ainda por cima,
ligeiramente despenteada?
Texto Anterior: Autora de "Harry Potter" ataca modelos Próximo Texto: Frases Índice
|