São Paulo, sábado, 14 de abril de 2007

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Crítica/Ambiente

Aziz Ab'Sáber mostra belas paisagens, mas narrativa é árida

"Ecossistemas do Brasil", do intelectual pioneiro, explicita lacuna de livros não-técnicos sobre paisagens nacionais

MARCELO LEITE
COLUNISTA DA FOLHA

Para reciclar velho clichê, o livro "Ecossistemas do Brasil", de Aziz Ab'Sáber, vem mais explicitar do que preencher uma lacuna. São raras, se não inexistentes, as obras não-técnicas dedicadas a apresentar as grandes paisagens nacionais ao público leigo. A lacuna persiste.
O volume da Metalivros conta com vários atrativos para seduzir leitores, a começar pelo autor. Ab'Sáber é um dos poucos intelectuais que se dedica a pensar o país como entidade concreta, em que a natureza física e biológica não compõe mera cenografia, mas é ator central de nosso drama histórico e social. Um pioneiro.
O formato avantajado, a capa dura, o papel diferenciado e as fotos estonteantes de Luiz Claudio Marigo credenciam "Ecossistemas" como legítimo "coffee-table book". Faria bonito em qualquer mesa de centro.
Não fica atrás de outros catataus bilíngües que receberam "apoio institucional" da Lei de Incentivo à Cultura.
O convite para momentos amenos de contemplação da inesgotável biodiversidade se esboroa, contudo, no encontro das ricas imagens com o rigor agreste do texto. Após décadas e décadas de excursões pelo Brasil, o geógrafo deixa claro que não foi a passeio.
Um exemplo em que define o "domínio macropaisagístico e macroecológico" das terras baixas florestadas da Amazônia: "Área marcadamente "zonal", de posição equatorial e subequatorial. Extensão espacial de primeira grandeza, com mais de 2,5 milhões de km 2. Zonas de planícies de inundação labiríntica (rio Amazonas), tabuleiros de vertentes convexizadas, morros baixos mamelonares ou semimamelonizados nas áreas que bordejam a bacia sedimentar amazônica, relevos residuais representados por "pães-de-açúcar", que por diversas vezes durante o Quaternário já foram inselbergs; fases de pediplanação neogênicas e níveis de pedimentação discretamente embutidos; terraços mantidos por cascalheiras ou crostas de laterita, rios negros nos elementos autóctones da drenagem; drenagem extensivamente perene."
O acréscimo de cinco páginas de glossário ao final ajuda, mas não resolve. O texto evidentemente não se dispõe a ser assimilado por qualquer um. Nem mesmo o leigo informado e interessado em vislumbrar panoramicamente o substrato físico da questão ambiental no Brasil conseguirá percorrê-lo sem esforço. Em linha com o glossário, as legendas detalhadas e conceituais que acompanham as fotos não conseguem desfazer certo descasamento entre iconografia e texto. Causa espanto que um livro com esse título não venha acompanhado de um único mapa.
De novo, uma dezena de imagens de satélite oferece só um socorro paliativo ao leitor carente de informação espacial. Revelam o detalhe, não a grande figura. Folheado o volume, resta uma bela sucessão de imagens, mas sem o fio condutor de uma narrativa acessível.


ECOSSISTEMAS DO BRASIL
Autor:
Aziz Ab'Sáber
Editora: Metalivros
Quanto: R$ 170 (300 págs.)
Avaliação: regular


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