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Crítica/Ambiente
Aziz Ab'Sáber mostra belas paisagens, mas narrativa é árida
"Ecossistemas do Brasil", do intelectual pioneiro, explicita lacuna de livros não-técnicos sobre paisagens nacionais
MARCELO LEITE
COLUNISTA DA FOLHA
Para reciclar velho clichê,
o livro "Ecossistemas do
Brasil", de Aziz Ab'Sáber, vem mais explicitar do que
preencher uma lacuna. São raras, se não inexistentes, as
obras não-técnicas dedicadas a
apresentar as grandes paisagens nacionais ao público leigo.
A lacuna persiste.
O volume da Metalivros conta com vários atrativos para seduzir leitores, a começar pelo
autor. Ab'Sáber é um dos poucos intelectuais que se dedica a
pensar o país como entidade
concreta, em que a natureza física e biológica não compõe
mera cenografia, mas é ator
central de nosso drama histórico e social. Um pioneiro.
O formato avantajado, a capa
dura, o papel diferenciado e as
fotos estonteantes de Luiz
Claudio Marigo credenciam
"Ecossistemas" como legítimo
"coffee-table book". Faria bonito em qualquer mesa de centro.
Não fica atrás de outros catataus bilíngües que receberam
"apoio institucional" da Lei de
Incentivo à Cultura.
O convite para momentos
amenos de contemplação da
inesgotável biodiversidade se
esboroa, contudo, no encontro
das ricas imagens com o rigor
agreste do texto. Após décadas
e décadas de excursões pelo
Brasil, o geógrafo deixa claro
que não foi a passeio.
Um exemplo em que define o
"domínio macropaisagístico e
macroecológico" das terras baixas florestadas da Amazônia:
"Área marcadamente "zonal",
de posição equatorial e subequatorial. Extensão espacial de
primeira grandeza, com mais
de 2,5 milhões de km 2. Zonas
de planícies de inundação labiríntica (rio Amazonas), tabuleiros de vertentes convexizadas, morros baixos mamelonares ou semimamelonizados nas
áreas que bordejam a bacia sedimentar amazônica, relevos
residuais representados por
"pães-de-açúcar", que por diversas vezes durante o Quaternário já foram inselbergs; fases
de pediplanação neogênicas e
níveis de pedimentação discretamente embutidos; terraços
mantidos por cascalheiras ou
crostas de laterita, rios negros
nos elementos autóctones da
drenagem; drenagem extensivamente perene."
O acréscimo de cinco páginas
de glossário ao final ajuda, mas
não resolve. O texto evidentemente não se dispõe a ser assimilado por qualquer um. Nem
mesmo o leigo informado e interessado em vislumbrar panoramicamente o substrato físico
da questão ambiental no Brasil
conseguirá percorrê-lo sem esforço. Em linha com o glossário, as legendas detalhadas e
conceituais que acompanham
as fotos não conseguem desfazer certo descasamento entre
iconografia e texto. Causa espanto que um livro com esse título não venha acompanhado
de um único mapa.
De novo, uma dezena de imagens de satélite oferece só um
socorro paliativo ao leitor carente de informação espacial.
Revelam o detalhe, não a grande figura. Folheado o volume,
resta uma bela sucessão de
imagens, mas sem o fio condutor de uma narrativa acessível.
ECOSSISTEMAS DO BRASIL
Autor: Aziz Ab'Sáber
Editora: Metalivros
Quanto: R$ 170 (300 págs.)
Avaliação: regular
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