São Paulo, terça-feira, 14 de junho de 2011

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CRÍTICA MÚSICA ERUDITA

Kristoff Silva e Quarteto Osesp sondam limites da canção em concerto arrojado

SIDNEY MOLINA
CRÍTICO DA FOLHA

Em programa arrojado e delicado, o Quarteto Osesp justapôs obras dos russos Alfred Schnittke (1934-1998) e Dmitri Shostakóvitch (1906-1975) com a estreia de "Três ou Mais Canções para Voz e Quarteto de Cordas" do jovem Kristoff Silva.
Schnittke é mestre na escrita para cordas, capaz de passar, em poucos compassos, de um "tutti" barroco para um "ostinato" bartokiano.
Seu poliestilismo é denso, e a citação é pretexto gerador que não redunda.
No "Quarteto nº 3" (1983), por exemplo, tudo emerge do "Stabat Mater", de Orlando di Lasso (c.1532-1594), e da "Grande Fuga", de Beethoven (1770-1827).
No "Quinteto com Piano Op. 57" (1940), de Shostakóvitch, o Quarteto Osesp contou com a sonoridade límpida e o senso camerístico do pianista baiano Ricardo Castro. A obra é uma espécie de suíte em cinco movimentos.
A seção central do "Prelúdio" soa como uma "courante" barroca; a "Fuga" é obra da elaboração; o "Scherzo" assemelha-se a uma "Giga"; o "Intermezzo" é uma típica ária para violino; e o "Finale" explora melodias tradicionais russas.
O Quarteto Osesp já é um de nossos principais grupos de câmara: diálogos impecáveis entre o violino de Emanuelle Baldini e a viola de Peter Pas, condução expressiva do violoncelista Johannes Gramsch e som encorpado do violinista Davi Graton.

LIMITES TÊNUES
Faz parte de um organismo como a Osesp explorar também os limites tênues que separam gêneros e linguagens e, por essa razão, a encomenda a Kristoff Silva foi acertada.
Mas, para além, chama a atenção a complexidade poético-musical das canções, que supera a de muitas obras usualmente apresentadas nas salas de concerto.
A metalinguagem de "A Voz e o Verso" (texto de Bernardo Maranhão) reverbera "Parceria" (versos de Mauro Aguiar), enquanto que a "Canção em Quatro Partes" (letra de Makely Ka) mostra habilidade artesanal: os sons do quarteto girando da "falta de espaço, desabrigo" até o grito mal amparado pelo "silêncio mortal".
Dorival Caymmi (1914-2008) talvez tenha sido o primeiro a almejar a canção arquetípica, projeto que se desdobra em Caetano Veloso.
Kristoff Silva aprofunda essas trilhas e, na era do pós-rádio, cabe justamente à Osesp acolher sua voz cristalina.

QUARTETO OSESP E KRISTOFF SILVA
AVALIAÇÃO ótimo




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