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POESIA
Novo livro do autor português vencedor do Prêmio Camões 2001 é lançado em Portugal e na Espanha neste semestre
Eugénio de Andrade cria a partir da sede
SYLVIA COLOMBO
EDITORA-ADJUNTA DA ILUSTRADA
Eugénio de Andrade está com
sede. "Aos 78 anos, ainda é possível desejar, ter sede de algo", diz o
poeta português, vencedor do
Prêmio Camões 2001, divulgado
na última terça-feira em Lisboa.
Esse é o tema de seu mais novo
livro, "Os Sulcos de Sede", que será lançado simultaneamente em
Portugal e na Espanha neste semestre, mas ainda não tem lançamento previsto no Brasil. "O prêmio e o livro por sair são exemplos de que ainda estou sedento
de poesia", diz.
A extensa obra de Andrade
-mais de 30 livros de poesia, três
de prosa, livros infantis, antologias e traduções- não possui
muitas edições brasileiras. A mais
recente é a coletânea "Poemas de
Eugénio de Andrade" (ed. Nova
Fronteira, 99).
Para ele, sua poesia está diretamente vinculada à tradição literária portuguesa. Também os temas
e cenários são os de seu país natal.
Seus versos passeiam entre figueiras e mulheres de trajes negros
dos vilarejos (há muito que são
velhas,/ vestidas de preto até a alma./ Contra o muro defendem-se
do sol de pedra;/ ao lume furtam-se ao frio do mundo).
Eugénio de Andrade, ou José
Fontinhas, seu verdadeiro nome,
nasceu em Póvoa de Atalaia, mas
vive há mais de 50 anos na Foz,
bairro da cidade do Porto junto
ao mar. No começo dos anos 90,
foi criada ali a Fundação Eugénio
de Andrade, para reeditar sua
obra e divulgar a poesia em geral.
"Não tenho vida social absolutamente nenhuma", diz o poeta,
avesso a entrevistas e ao convívio
literário. Para ele, o isolamento é
necessário à criação poética.
Leia abaixo os principais trechos da entrevista que Eugénio de
Andrade concedeu à Folha, por
telefone, da Foz do Douro.
Folha - O sr. foi premiado pelo
conjunto da obra, mas "As Mãos e
os Frutos" (1948) ainda é considerado seu trabalho mais importante. O que acha desse livro?
Eugénio de Andrade - "As Mãos e
os Frutos" foi meu primeiro trabalho publicado e me tornou conhecido internacionalmente. Mas
eu não sinto que devo muito a esse livro. Particularmente, prefiro
os trabalhos da fase mais recente,
como "Branco no Branco" [1984".
Folha - É uma fase marcada pelo
fato de o sr. ter trocado Lisboa pela
Foz, no Porto?
Andrade - Sim, a Foz é um lugar
mais isolado, e eu não gosto de ter
nenhum tipo de convívio literário. Nunca procurei fazê-lo, e isso,
na minha opinião, tem a ver com
a poesia, que requer uma vida
própria, longe desses grupos.
Folha - E o que caracteriza essa
fase em termos de estilo?
Andrade - Acho que reforcei o
uso de uma linguagem mais rigorosa e ao mesmo tempo simples.
A simplicidade é a elegância suprema, o que há de mais difícil para conquistar em arte. Quero a leveza, é o que me parece correto.
Críticos já disseram que minha
poesia é ao mesmo tempo espiritual e fascinada pela matéria.
Folha - E quanto à temática?
Andrade - Bom, aí não há muito
o que inventar. Você sabe que os
os temas de um poeta são sempre
os mesmos, o amor, a morte, a natureza, os animais, compreende?
Portugal está sempre presente,
também. É um pouco difícil definir, pois a poesia não se conta. Eu
não escrevo poemas épicos, e ninguém já os escreve mais, não é?
Folha - O sr. é um admirador de
Camilo Pessanha, mas não gosta de
ser identificado com rótulos literários. Como define suas influências?
Andrade - Não gosto de falar em
influência, para mim essa palavra
não faz sentido. Camilo Pessanha
é um dos quatro grandes poetas
portugueses. Os outros três são
Camões, Cesário Verde e Fernando Pessoa. Por isso, automaticamente sou um devedor deles, assim como me sinto devedor da
poesia grega e da chinesa. Somos
devedores daquilo que lemos.
Folha - Suas antologias são uma
forma de recuperar tais "dívidas"?
Andrade - Sim, construir antologias é algo de que gosto muito. No
ano passado, lancei "Antologia
Pessoal da Poesia Portuguesa",
que vai desde os cancioneiros,
cantigas de amigo até poetas contemporâneos, como Herberto
Helder. São coletâneas feitas a
partir do meu interesse.
Folha - O que o sr. busca quando
faz traduções de escritores como
García Lorca?
Andrade - Faço traduções por
impulso pessoal, nunca por encomenda. Gosto de fazer uma espécie de recriação, claro que traduções são, no melhor sentido, uma
aproximação, e, no pior, uma caricatura. Prefiro tentar alcançar a
primeira, evidentemente.
Folha - O sr. lê literatura brasileira? O que mais o agrada?
Andrade - Quando era jovem,
deu-me a impressão de que havia
um interesse maior pelos romances brasileiros em Portugal. O que
se lia muito era Jorge Amado e
Graciliano Ramos. Para mim,
Guimarães Rosa é melhor prosador da língua portuguesa depois
do Eça de Queiroz.
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