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Arte de Emmanuel Nassar, formada por elementos populares e eruditos, ganha retrospectiva
A estética da precariedade
FABIO CYPRIANO
ENVIADO ESPECIAL AO RIO
Se há um artista brasileiro que
consegue reunir de forma original
arte popular e arte erudita em
uma mesma obra, esse artista é o
amazonense Emmanuel Nassar.
Cada um de seus trabalhos é
carregado de elementos da cultura popular -cuja criatividade, segundo o geógrafo Milton Santos
(1926-2002), é fruto da experiência da escassez-, ao mesmo tempo em que cria uma sofisticada
linguagem particular.
"Sua obra contrapõe a sabedoria do povo ao agressivo processo
de globalização que invade a periferia das cidades amazônicas. Entre a farsa e a ironia, Emmanuel
nos revela as engenhocas que driblam a extrema pobreza cada vez
mais confrontada com a extrema
riqueza", diz a curadora Denise
Mattar, responsável pela retrospectiva "A Poesia da Gambiarra",
que é aberta hoje, no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB), no
Rio, com cerca de 40 obras.
A gambiarra no título da mostra
assume o papel de apontar a brasilidade na obra de Nassar, sem
cair num alegorismo. "A gambiarra é de fato uma expressão da
realidade brasileira, expressa na
precariedade e no perigoso, que
pode estourar a qualquer momento, mas mesmo assim funciona, assim como ocorre na obra de
Emmanuel", afirma Mattar.
Tal percurso tem por base um
conceito sintético: "Meu tema sou
eu", costuma dizer Nassar, 54.
"Digo isso pois quero me aprofundar em minhas questões pessoais. Como sou um brasileiro comum, nascido em Capanema, no
Amazonas, vivo num estado de
precariedade, ao mesmo tempo
em que tenho boas oportunidades e posso aproveitá-las."
A mostra, que ocupa quatro salas do CCBB, além de uma instalação no foyer do edifício, apresenta
desde obras produzidas em 1981
até fotografias recentes. "A princípio, comecei a fotografar para ter
referências para obras, mas esse
conjunto ganhou autonomia, e
considero-o uma forma de apropriação", afirma o artista. Entre
elas, há uma bandeira brasileira,
propaganda em um bar, que trocou o "Ordem e Progresso" por
"Rumo ao Penta". Nassar apagou
digitalmente os dizeres e introduziu apenas o "EN", sua assinatura
e marca registrada.
"Essa assinatura assume um lado particular, o "E", de meu nome,
mas também o "N", que significa
que pertenço a uma família, a
uma história. Contraponho assim
o particular e o universal, uma obsessão em meus trabalhos".
Acompanha a exposição um catálogo polpudo, com textos de
Mattar e dos curadores Tadeu
Chiarelli e Paulo Herkenhoff, o
primeiro livro de fôlego sobre o
artista. Depois do Rio, a mostra
segue para o CCBB de Brasília e,
no próximo ano, para São Paulo,
em local a ser definido.
O artista apresenta ainda a instalação "Bandeiras", exposta no
MAM de São Paulo, em 1998, com
parte das 123 bandeiras de cidades do Amazonas, uma colcha de
retalhos que apresenta uma iconografia que incorpora, a partir
da tradição medieval, a flora e a
fauna amazonenses, cruzamento
perfeito do erudito e do popular.
O jornalista Fabio Cypriano viajou a
convite do CCBB
A POESIA DA GAMBIARRA. Curadoria:
Denise Mattar. Onde: Centro Cultural
Banco do Brasil (r. Primeiro de Março, 66,
Centro, Rio, tel. 0/xx/21/3808-2020).
Quando: abertura hoje, às 19h30 (para
convidados); de ter. a dom., das 12h às
20h. Até 21/9. Quanto: entrada franca.
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