São Paulo, sábado, 14 de agosto de 2010

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CRÍTICA ROMANCE

Com notável segurança, autor coloca amantes para debater religião e ciência

NELSON DE OLIVEIRA
ESPECIAL PARA A FOLHA

René Magritte é um dos poucos pintores surrealistas que também empolgam as crianças e os jovens, sem escandalizá-los. A meninada jamais fica indiferente a seus paradoxos visuais.
Potencializadas por uma técnica figurativa impessoal, suas telas cutucam a reflexão e mais ainda a fantasia.
Steinn (o cientificista) e Solrun (a mística), protagonistas do livro de Jostein Gaarder, gostam muito de um quadro de Magritte, "O Castelo nos Pirineus".
O quadro mostra um gigantesco rochedo pairando na paisagem, com um castelinho no topo. E representa, para o casal, o mundo flutuante em que vivemos. O tema desse romance é a morte e o sobrenatural. Aproveitando a divertida formulação de Monteiro Lobato, podemos dizer que, para Steinn, a morte é ponto final.
Mas, para Solrun, é vírgula ou ponto e vírgula. "O Castelo nos Pirineus", romance epistolar, cutuca a reflexão e a fantasia tanto quanto a pintura da qual herdou o título.
Começa com um reencontro inesperado. Mais de 30 anos depois do rompimento, Steinn e Solrun se reveem, por acaso, no mesmo hotel em que ocorreu a separação.
"Por acaso?" Não para Solrun: "Não me diga que foi mera casualidade. Não diga que não foi orquestrado!". Pelo destino, por forças ocultas, é no que ela acredita.

INVESTIGAÇÃO
O antigo amor volta com força total. Mas, durante a separação, ambos constituíram família. Envelheceram. Não são aqueles mais os jovens inquietos e aventureiros de antes.
Não importa. Um diálogo clandestino tem início. Porém apenas por e-mail. É preciso recuperar o tempo perdido, reviver e reavaliar o motivo do rompimento. Três décadas atrás, um evento grave promoveu a separação dos apaixonados. Um segredo muito bem guardado. É preciso investigá-lo.
Em torno desse segredo, Jostein Gaarder põe em movimento, com notável segurança, os temas permanentes em seus livros: a natureza do conhecimento, a inteligibilidade do universo, a oposição entre essência e aparência, vida e morte.
Solrun, a certa altura, cita o matemático e astrofísico James Jeans: "O universo parece-se mais com uma grande ideia do que com uma grande máquina".
Nas mensagens trocadas pelo casal, o suspense evolui, enquanto sistemas distintos de crenças combatem amorosamente. De um lado a ciência, do outro a religião. O universo-máquina contra o universo-ideia.

NELSON DE OLIVEIRA é autor de "Poeira: Demônios e Maldições" (Língua Geral)


O CASTELO NOS PIRINEUS

AUTOR Jostein Gaarder
EDITORA Companhia das Letras
TRADUÇÃO Luiz Antônio de Araújo
QUANTO R$ 34 (180 págs.)
AVALIAÇÃO ótimo




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