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August leva Victor Hugo a Hollywood
JOSÉ GERALDO COUTO
da Equipe de Articulistas
Amor e revolução costumam ser
uma mistura explosiva -e é nela
que Bille August evidentemente
aposta para conquistar as platéias
contemporâneas com sua adaptação do romance clássico "Os Miseráveis", de Victor Hugo.
O centro do caudaloso livro, ambientado nas primeiras décadas do
século passado, é a história do pobre Jean Valjean (Liam Neeson),
que vai parar na cadeia por ter
roubado um pedaço de pão.
Animalizado na prisão, Valjean
eleva-se moralmente no contato
com um bispo piedoso, tornando-se um cidadão honrado e socialmente bem-sucedido, mas
sempre sob a sombra da perseguição vingativa do inspetor Javert
(Geoffrey Rush).
No filme de Bille August, esse eixo dramático é mantido. O que ficou de fora foi o envolvimento de
Valjean no movimento republicano e antiabsolutista da época, a
ponto de a última parte, em que
entram em cena as barricadas da
revolução de 1832, parecer um
corpo estranho no conjunto romanesco construído até então.
Como costuma acontecer nas
superproduções de época, a grande história (social e política) serve
apenas como pano de fundo para a
pequena história (dos amores,
ciúmes e vinganças pessoais).
Barricadas como cenário
As barricadas de Paris, aqui, entram como um cenário pitoresco
para o romance entre a filha adotiva de Valjean, Cosette (Claire Danes), e o jovem republicano Marius (Hans Matheson).
A impressão de falsidade hollywoodiana é inevitável. Talvez seja
o fato de todo mundo falar inglês
na França oitocentista, talvez seja
a improvável Uma Thurman fazendo uma operária francesa de
cara suja, talvez seja a música
grandiloquente (daquelas compradas a quilo pelos estúdios americanos) -o fato é que não dá para acreditar muito em "Os Miseráveis", apesar do cuidado na reconstituição de época, dos milhares de figurantes etc.
Narrado no estilo (ou falta de)
característico do diretor, situado
entre o clássico e o acadêmico, o
filme, entretanto, tem um mérito
inegável: torna evidente o sentido
moral (ou religioso ou psicanalítico), e portanto universal, da
via-crúcis de Valjean.
Javert, o algoz, não é senão uma
encarnação da própria culpa do
protagonista. Só quando acertar as
contas com ela, Valjean se sentirá
livre. Não por acaso, a cena em
que isso acontece, à margem do
Sena, é uma das mais efetivas do
filme.
À parte isso, Liam Neeson carrega sobre os ombros não apenas a
culpa de seu personagem, mas o
filme todo. Sorte que é um ator suficientemente forte (em todos os
sentidos) para isso.
Filme: Os Miseráveis
Direção: Bille August
Produção: EUA, 1998
Com: Liam Neeson, Geoffrey Rush, Uma
Thurman, Claire Danes, Hans Matheson
Quando: a partir de hoje, nos cines
Morumbi 5, Estação Lumière 2, Eldorado 6
e circuito
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