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"Brasileiro não aguenta ver sucesso'
DENISE MOTA
da Redação
Fábio Barreto está irritado com a
crítica brasileira. Após ter o dialeto de "O Quatrilho" tachado de
"italiano macarrônico", em 96,
questões idiomáticas colocam o
cineasta novamente na mira do
que ele chama de "falta de auto-estima" brasileira.
"Bela Donna", quinto longa do
diretor, pré-estreou em maio, no
8º Cine Ceará, e sua trama vem
sendo criticada, desde então, pelo
excesso de desenvoltura com que
personagens rústicos falam inglês
e português.
O filme -que tem, além de
Eduardo Moscovis, a canadense
Natasha Henstridge (de "Experiência 2", em cartaz em São Paulo) e Andrew McCarthy (de "A
Garota de Rosa Shocking") nos
papéis principais- é uma adaptação de R$ 5,5 milhões de "Riacho
Doce", de José Lins do Rego, filmada em sete semanas e quatro
dias, no Ceará.
Mas, se o inglês garantiu a discórdia entre diretor e crítica, por
conta do elenco internacional Barreto afirma ter vendido "Bela
Donna" para 40 países "antes
mesmo de rodar o primeiro fotograma".
"O crítico brasileiro sofre de colonização. Cinema é indústria, faço filme para o público. Meu negócio é "mainstream' mesmo. Eu
quero é fila", diz.
Leia, a seguir, trechos da entrevista que Fábio Barreto concedeu,
em São Paulo, com exclusividade,
à Folha.
Folha - Da roteirista, Amy Ephron
(de "A Letra Escarlate"), à escalação de atores para os papéis principais, transparece uma preocupação em tornar o filme inteligível
nos Estados Unidos...
Fábio Barreto - A Amy Ephron
é uma roteirista que pesquisa como as pessoas falavam em determinadas épocas, e foi escolhida
por causa disso. A tentativa foi a de
fazer um filme que tivesse aceitação vertical, que fosse interessante
para qualquer tipo de público, de
qualquer nacionalidade.
Folha - No caso brasileiro, a procura dessa "aceitação vertical" não
vai acabar causando estranhamento na platéia, com diversos personagens de baixa instrução falando
inglês, por exemplo?
Barreto - Fiz esse filme porque
a história dele me deu oportunidade de fazer um longa em inglês,
língua que te possibilita penetração em todo o mundo.
Pessoas que trabalham para
gringo, como os pescadores da
história e a empregada de Donna
(interpretada por Letícia Sabatella), têm de saber falar inglês. Se você vai a qualquer praia, encontra
pescador falando inglês, isso nos
anos 40, nos anos 30.
Folha - Seu filme já recebeu críticas por conta disso...
Barreto - Isso é implicância,
brasileiro é assim, não aguenta ver
ninguém fazer sucesso. Fica com
inveja. As pessoas têm isso no Brasil, falta de auto-estima. Os americanos não têm feito a vida inteira
filmes com Cleópatra falando inglês? As pessoas acham que a gente
tem de fazer filme sobre miséria.
Não faço filme para crítico, faço
para o público. Eu quero é fila.
Folha - Quais foram os critérios
de escolha dos protagonistas estrangeiros, uma vez que Henstridge, por exemplo, não tinha experiência em filmes românticos?
Barreto - Antes da Natasha,
tentamos Elizabeth Shue, Cameron Diaz, Uma Thurman. Por problemas de outros trabalhos e cachê, não acertamos. Para o papel
do Andrew, também tentamos James Spader, Matt Dillon, Gary
Oldman. Natasha foi uma das primeiras pessoas que eu mencionei
na ICM, a agência que me ajudou a
levantar o elenco. O Andrew me
foi oferecido e foi ótimo, é um
grande ator, me ajudou com a Natasha. Ela deu muito trabalho.
Folha - O objetivo desse filme é
familiarizar seu nome no mercado
norte-americano?
Barreto - Queria fazer o meu
projeto. Não estou no ponto ainda
de fazer filme de estúdio lá. Para
que eu possa dar as cartas, tenho
de me impor, de fazer um filme
que faça muito sucesso nos EUA.
Eles são os donos do mundo.
Folha - "Bela Donna" está talhado para fazer esse sucesso? Concorrer ao Oscar, por exemplo?
Barreto - Para concorrer ao Oscar, "Bela Donna" tem de enfrentar os filmões de lá, como "O Resgate do Soldado Ryan" etc. Não
pode concorrer como filme estrangeiro, é 85% falado em inglês.
O filme que deve ser indicado pelo Brasil agora é "Central do Brasil". E não acho que "Bela Donna" seja filme para concorrer ao
Oscar, ele é muito "mainstream",
não é dado a arroubos de genialidade. Não agrada ao votante da
Academia, que é velhinho, gosta
de coisa comportada. Mas está entregue às mãos da Pandora, se
acharem que é um longa para indicação, tudo bem.
Não é cansativo estar sempre à
sombra do Oscar, a cada filme?
Barreto - É chato, mas é uma
contingência. Cinema é indústria.
O dia em que eu quiser fazer um
filme de arroubo autoral, o filme
que os críticos querem que eu faça,
eu faço e exibo na minha casa, com
meia dúzia de amigos. Faço filme
para público, para passar no mundo inteiro. Meu negócio é esse, é
"mainstream" mesmo.
O problema, então, é a crítica nacional?
Barreto - É. Ela não vê o filme
brasileiro como algo industrial. O
crítico sofre de colonização, quer
ter o bom gosto cinematográfico
sofisticado do crítico francês, europeu, não é nem o gosto americano. O crítico americano tem o gosto público, não se mistura com
quem faz filme, não vai a festinha.
Ele vai ver o filme no cinema, não é
amigo de ninguém.
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