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ANÁLISE
Lançamento de DVD com trabalhos de Marina Abramovic, entre outros nomes, se destaca dentro do festival em SP
Videobrasil consegue ir além das performances políticas
ESTHER HAMBURGER
ESPECIAL PARA A FOLHA
Em tempos em que a ação política freqüentemente se confunde com o terror e deixa as telas
de cinema para ganhar a vida em
eventos demonstração -o 11 de
Setembro ainda é o exemplo
maior-, a ênfase do Videobrasil
na performance e em interlocuções no hemisfério Sul faz sentido. Mas, em meio à tônica política
dominante de trabalhos coletivos
e multimídia, esforços autorais de
realização poética em vídeo chamam a atenção.
A marca do festival é a fronteira
tecnológica da linguagem audiovisual. Essa segunda semana,
aberta ontem à noite com a performance do feitoamãos, reúne
vídeos especialmente dedicados à
experimentação.
Além dos 45 curtas que serão
exibidos ou estarão expostos entre hoje e domingo, o evento no
Sesc Pompéia incursiona no terreno das intervenções mais duradouras com o lançamento do primeiro número do "Caderno Videobrasil" -amanhã, às 14h- e
de um DVD com uma antologia
das performances apresentadas
em edições anteriores do festival.
Em retrospectivas, ao vivo e nas
duas publicações, o festival oferece uma ampla revisão da história
recente (a capa do caderno é um
grande pôster que aberto revela
de um lado imagens de "Interdição", de 1979, e do outro, uma
cronologia que estabelece 1896 e
"Ubu Rei", de Alfred Jarry, como
marco inicial do gênero) de manifestações artísticas que negam a
tela, elegem o corpo, muitas vezes
do próprio artista, como suporte
de expressões-ação efêmeras por
natureza.
A série de trabalhos da mestre
no gênero, Marina Abramovic,
com seu então parceiro, Ulay, tematizou nos anos 70 o esgarçamento das relações no nível mais
básico das relações- o amoroso.
Em "Balance Proof", o casal, frente a frente, sustenta, com seus corpos nus, a lâmina de um espelho
de dupla face, que, entre eles, aprisiona cada um na apreciação do
reflexo narcísico de sua própria
imagem.
O conceito é dramático, mesmo
que não apreciado como deveria,
ao vivo, em 1977, na Suíça.
Na entrevista a Ana Bernstein,
que encerra o primeiro volume
do "Caderno Videobrasil", a artista elabora sobre as limitações e
possibilidades da fruição a posteriori. O registro de alguns dos vídeos contemporâneos que compõem a mostra que começa hoje e
segue pela semana é diferente.
"Montevideoaki" documenta
com precisão a associação de som
e movimento na dança do japonês Hiroaki Umeda. O trabalho
salienta a fragmentação extrema
no movimento de um corpo desterritorializado.
Já "man.road.river", curta do
mineiro Marcellus L., vencedor
do Urso de Ouro no Festival de
Oberhausen deste ano, parece
buscar o canvas. O trabalho, considerado minimalista, se aproxima da pintura, forma de expressão que o veio performático nega.
Uma estrada interrompida pelo
leito de um rio que transbordou.
A câmera parada registra a partir
da margem de cá o movimento de
travessia de um homem que vem
do lado de lá. A luz é difusa. Do
personagem, vemos a silhueta escura e pequena contra a luz. O
movimento, sem cortes, em tempo real, é lento. O tom é descolorido. O som ambiente, discreto.
O movimento decidido do homem contrasta com a hesitação
de outros figurantes, um transeunte que retorna, um menino
que brinca com uma pipa, um ciclista que evita a água. O trabalho
se aproxima de um quadro em
movimento. Aqui o documentário se aproxima da poesia.
Esther Hamburger é antropóloga e
professora da ECA-USP
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