São Paulo, quarta-feira, 14 de outubro de 2009

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China faz Frankfurt desconvidar dissidentes

Após pressão, organização da Feira exclui escritores críticos ao regime

Apesar do lobby, o Nobel de Literatura Gao Xingjian, a líder uigur Rebiya Kadeer e o artista plástico Ai Weiwei confirmaram presença

RAUL JUSTE LORES
DE PEQUIM

Escritores chineses críticos ao regime comunista de Pequim têm sido "desconvidados" de mesas redondas e debates na Feira de Frankfurt, por pressão do governo chinês.
A China é o país homenageado na atual edição do evento e já ameaçou boicotá-lo se dissidentes fossem convidados.
Cerca de 2.000 editores, escritores, artistas e jornalistas chineses participarão da Feira, que será aberta com apresentação da Filarmônica da China e do pianista Lang Lang - o governo chinês investiu US$ 15 milhões em sua participação, a primeira em um grande evento cultural internacional.
Mas essa pouca tolerância do regime a críticas demonstra o desejo do cada vez mais poderoso regime comunista de exportar a censura para outros cantos do mundo.
Em agosto, o governo chinês tentou impedir o Festival de Cinema de Melbourne (Austrália) de exibir um documentário sobre Rebiya Kadeer, a exilada líder uigur que acusa a China de cometer "genocídio cultural" contra sua etnia.
O festival manteve a exibição. Hackers chineses vandalizaram o site do evento e o governo chinês, então, cancelou missões oficiais à Austrália como forma de retaliação. Cineastas chineses, pressionados pelo Ministério da Cultura, cancelaram a participação em Melbourne.
No ano passado, a Universidade Metropolitana de Londres foi pressionada pela embaixada chinesa no Reino Unido a cancelar uma homenagem que faria ao dalai-lama, líder exilado do Tibete.
A imprensa estatal chinesa lançou um boicote contra a universidade e até chegou a divulgar um "pedido de desculpas" de seu vice-reitor, que foi negado depois. O mesmo aconteceu com a Universidade de Washington, nos EUA.

Dissidentes vão
"A Feira do Livro é um mercado para a liberdade", afirmou o diretor do evento, Juergen Boos realçando que haverá 250 eventos (contra 612 dos patrocinados pelo governo chinês) mostrando "a outra China".
Apesar do lobby chinês, a Feira de Frankfurt receberá um "quem é quem" da dissidência chinesa. O Prêmio Nobel de Literatura Gao Xingjian (exilado e fora da lista oficial), a líder uigur Rebiya Kadeer, acusada de terrorismo por Pequim, o artista plástico Ai Weiwei e o principal assessor do dalai-lama são alguns dos nomes que já confirmaram presença.
A escritora e ambientalista Dai Qing, 62, excluída da lista de um seminário no mês passado por pressão do governo, acabou indo a Frankfurt convidada por uma organização alemã.
"Quase todos os chineses do auditório se foram quando comecei a falar, mesmo alguns que conversam comigo em Pequim", disse Dai à Folha.
"Alguns artistas precisam fazer isso para receber favores do governo. É o que eu chamo de efeito Zhang Yimou", diz ela, em relação ao cineasta, antigo opositor que hoje é queridinho do Partido Comunista, responsável pela cerimônia de abertura da Olimpíada de Pequim.
"A China atrai muitos investidores estrangeiros por ignorar o ambiente e oferecer mão de obra barata. Então, eles precisam retribuir obedecendo a linha oficial. Cada vez menos países e grandes empresas vão querer briga com o Partido Comunista", diz Dai.
"Mas o que adorei ver em Frankfurt é que a liberdade de expressão ainda é valorizada por muitos", afirma.

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