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CRÍTICA
Celebração da boemia oscila entre drama e chanchada
JOSÉ GERALDO COUTO
COLUNISTA DA FOLHA
"Apolônio Brasil" não é
um filme, são dois, justapostos e em briga permanente um
com o outro.
Em nossos dias, um cientista
maluco (José Lewgoy) apodera-se
do cérebro de um músico do passado, Apolônio Brasil (Marco Nanini). Seu objetivo é cloná-lo e
vendê-lo para os "países tristes",
pois descobriu que o tal cérebro
tem um "quociente de alegria" excepcionalmente alto.
A esse argumento de chanchada
(primeira escola de Hugo Carvana e referência explícita aqui)
acrescenta-se, em longos flashbacks evocados pelos amigos de
Apolônio, uma homenagem nostálgica à velha boemia carioca, na
qual o músico era rei.
Nessa sua segunda instância,
"Apolônio Brasil" assume um
tom elegíaco, melancólico, que
nos leva a perguntar o que tem de
"campeão da alegria" um sujeito
que vive alcoolizado e cantando
músicas de fossa.
Quando o filme foi exibido no
Festival de Gramado, elogiou-se
com razão a reconstituição do
ambiente -a boate Golden Night
inspira-se na célebre Night and
Day-, o trabalho de David Tygel
na recriação de canções de época,
a excepcional interpretação de
Nanini e uma sequência em especial: aquela em que um militar linha-dura toma LSD sem saber e
embarca numa viagem lisérgica
numa festa ao som de "Roda Viva".
Pode-se acrescentar outro momento feliz: a cena em que um jovem aspirante a escritor é salvo do
suicídio nuns rochedos à beira-mar por Apolônio, sem saber que
este é seu pai.
Afora isso, "Apolônio" traz um
tom de "déjà vu", de enésima celebração auto-indulgente do "carioca way of life" (como "Bar Esperança", do mesmo Carvana),
da qual fazem parte a apologia do
alcoolismo e o elogio a uma moderada cafajestice.
Mas, com todas as suas fraquezas, "Apolônio Brasil" tem a virtude acessória de ser uma comédia de costumes que passa ao largo das fórmulas de "sitcom" que
parecem estar se tornando hegemônicas no humor da nossa TV e
do nosso cinema.
Apolônio Brasil
Produção: Brasil, 2002
Direção: Hugo Carvana
Elenco: Marco Nanini, José Lewgoy
Quando: a partir de hoje nos cines Belas
Artes, Tamboré e circuito
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