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São Paulo, sexta-feira, 14 de novembro de 2003

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CRÍTICA

Celebração da boemia oscila entre drama e chanchada

JOSÉ GERALDO COUTO
COLUNISTA DA FOLHA

"Apolônio Brasil" não é um filme, são dois, justapostos e em briga permanente um com o outro.
Em nossos dias, um cientista maluco (José Lewgoy) apodera-se do cérebro de um músico do passado, Apolônio Brasil (Marco Nanini). Seu objetivo é cloná-lo e vendê-lo para os "países tristes", pois descobriu que o tal cérebro tem um "quociente de alegria" excepcionalmente alto.
A esse argumento de chanchada (primeira escola de Hugo Carvana e referência explícita aqui) acrescenta-se, em longos flashbacks evocados pelos amigos de Apolônio, uma homenagem nostálgica à velha boemia carioca, na qual o músico era rei.
Nessa sua segunda instância, "Apolônio Brasil" assume um tom elegíaco, melancólico, que nos leva a perguntar o que tem de "campeão da alegria" um sujeito que vive alcoolizado e cantando músicas de fossa.
Quando o filme foi exibido no Festival de Gramado, elogiou-se com razão a reconstituição do ambiente -a boate Golden Night inspira-se na célebre Night and Day-, o trabalho de David Tygel na recriação de canções de época, a excepcional interpretação de Nanini e uma sequência em especial: aquela em que um militar linha-dura toma LSD sem saber e embarca numa viagem lisérgica numa festa ao som de "Roda Viva".
Pode-se acrescentar outro momento feliz: a cena em que um jovem aspirante a escritor é salvo do suicídio nuns rochedos à beira-mar por Apolônio, sem saber que este é seu pai.
Afora isso, "Apolônio" traz um tom de "déjà vu", de enésima celebração auto-indulgente do "carioca way of life" (como "Bar Esperança", do mesmo Carvana), da qual fazem parte a apologia do alcoolismo e o elogio a uma moderada cafajestice.
Mas, com todas as suas fraquezas, "Apolônio Brasil" tem a virtude acessória de ser uma comédia de costumes que passa ao largo das fórmulas de "sitcom" que parecem estar se tornando hegemônicas no humor da nossa TV e do nosso cinema.


Apolônio Brasil  
Produção: Brasil, 2002
Direção: Hugo Carvana
Elenco: Marco Nanini, José Lewgoy
Quando: a partir de hoje nos cines Belas Artes, Tamboré e circuito



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