São Paulo, terça-feira, 14 de novembro de 2006

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FERNANDO BONASSI

Historinhas do capitalismo


O negocinho fica sendo jogado de colo em colo sofisticado, para a excitação da elite

É NORMALMENTE um negocinho que não presta, é muito velho ou novo demais e ninguém quer empreender...
Não querem fazer acontecer quer porque só uns poucos precisam mesmo, quer porque muitos não podem parar para pensar mesmo no que precisam, ou ainda porque os que querem não podem e os que podem não querem mesmo pagar o preço determinado da civilização... Isto, é claro, dependendo do ponto de vista, de classe ou da liquidação das imunidades e vulgaridades das autoridades de ocasião.
O tal negocinho fica, assim sendo, jogado de colo em colo sofisticado, para promover a excitação necessária da elite perdulária, passando a ser sonhado como se fosse para o bem público, quando, no máximo, é um mal púbico, estimulado pelas iniciativas mais íntimas e perversas.
Aliás, em boas conversas de privada, dizem-se comunistas, socialistas ou sociais democratas, quando, no fundo, são daqueles partidos tão fascistas de direitos, que têm até vergonha de aparecer para defender o genocídio de excluídos que desejam, já que as leis do bom decoro e a causa imprópria em que procedem os proíbem circunstancialmente de existir tão nazistas quanto gostariam, ou seriam, nas ditaduras que patrocinam, de tempos em tempos, obscuros no tal lugarzinho.
Nesse estadinho de coisas, os imóveis são os bens mais apreciados entre os empreendedores nacionais, pois uma nação que não se move não cria problemas burocráticos para os seus cidadãos empreendedores...
Os reprodutores da mesmice e os produtos importados também são patrimônios louvados, já que os valores locais são altos, compridos e grossos demais para a maioria ousar guardar, pertencendo mais à minoria dos prezados doutores escolados nos diplomas comprados em faculdades de meio período.
O prezado negocinho, invejado, desprezado e esquecido, torna-se lesivo e sai de dentro do armarinho na calada da noite, numas votaçõezinhas secretas, com uisquinhos contrabandeados por diplomatinhas de carreira e salgadinhos tropicais de banqueteiras...
Será por marqueteiros transformado em projetinho de governo ou em emendinha parlamentar por algum minúsculo anão aventureiro, para empenho num orçamento cujo percentual dos caloteiros faz arrepiar o peito das primeiras damas e congelar as costas dos guarda-costas dos traficantes de influência em meio ao tiroteio das facções.
Quanto aos policiais que poderiam conter a desordem, ou nova ordem que fosse, estão preferencialmente contidos dentro dos quartéis blindados como se fossem resistentes atrás de barricadas, onde se confundem uns com os outros, e atiram antes de perguntar, já que as suas próprias fardas suadas viraram alvos premiados.
São cadáveres premidos pelo mesmo salário que os sonegadores pagam aos professores. Assim, com o que ganham para ensinar e defender uma pátria da outra em meio a tantas contradições violentas, mal conseguem vencer as mais frágeis contas nas casas modestas em que vivem, antes que o final do mês acerte-lhes os bolsos em cheio, expulsando-os do supermercado global.
Como os pobres não consomem, não evoluem nessa historinha. Quanto aos consumidores, cujo negocinho pode vir a cativar, forma-se logo um "pool" de interesses a contemplar em torno do interessezinho comum. Os comuns mesmo, aqueles que se parecem como gêmeos na falta de sentido de sua repetição miserável, nem sabem disso, ou do que falam e fazem em seus nomes vãos.
Vão, mesmo sem saber, é financiar a juros mixos os mais altos prejuízos!
O negocinho decola, prospera, é vendido barato, comprado caro e cai de cabeça poucos metros, ou anos depois, na cabeceira da pista...
Pode-se, para dar fim a tanto subsídio tentador, criar uma fundação no exterior, ou mesmo por aqui, já que estão por aqui mesmo as melhores oportunidades para os agenciadores promoverem a "afundação" daquilo que se quer proteger, protelar ou entregar de uma vez aos coiotes da fronteira do capitalismo com o barbarismo, para onde, aliás, estamos indo, com ou sem os "ismos" que os sociólogos dependentes mais bem intencionados desse inferno conceituam mal como os diabos...
Moral dessa história confusa: a elite que vota e financia os programas (sociais, de televisão comercial e de prostituição infantil) ainda pode escolher entre abrir os bolsos e repartir ou erguer os braços e partir. Dessa pra melhor...
Será que esse paraíso fiscal existe?


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