São Paulo, quarta-feira, 14 de dezembro de 2005

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TV/ANÁLISE

"Direito de Resposta" defende direito à diferença

ESTHER HAMBURGER
ESPECIAL PARA A FOLHA

A idéia de direitos humanos surgiu no século 18; uma idéia inovadora baseada em uma abstração: a de que somos todos iguais.
"Eu" "sou" "diferente" era o bordão pronunciado por partes, sucessivamente, por pessoas anônimas, em um clipe transmitido durante um dos intervalos da primeira edição de "Direito de Resposta". Como um grito de guerra, a frase sintetiza o espírito da coisa.
"Direito de Resposta" é um programa inédito, produzido pelo Ministério Público Federal e seis ONGs de defesa de direitos humanos e direitos dos homossexuais. O programa tem ido ao ar diariamente, às 16h, na Rede TV!, desde segunda, e seguirá até 20 de janeiro. A série resulta de acordo que pôs fim à ação civil pública movida por ONGs que pediam a cassação da concessão da emissora em decorrência da pregação agressiva do apresentador João Kleber, no, ao que parece, finado "Tarde Quente".
Por determinação judicial, o canal chegou a ficar sem sinal em São Paulo por 25 horas. Como parte do acordo, a emissora financia os programas.
A ação é rara. Nos jornais a prática é corrente. Na TV, na seara da política partidária, há ocorrências conhecidas. No âmbito dos costumes, houve muita ação da censura -que procurou, sem muito sucesso, conter a liberalização crescente da sensualidade.
Recentemente o apresentador do SBT Gugu Liberato foi punido em razão de difusão de informações falsas. Essa é provavelmente a primeira vez que um programa é suspenso por perseguir direitos à diferença garantidos por lei.
Na forma, o programa segue o padrão básico da TV: o acento na palavra carrega o conteúdo. Há uma preponderância jovem na equipe, que se traduz em opções de enquadramento e edição.
A apresentação é da simpática, bonita e arguta Anelis Assumpção, do "Atitude.com" (TV Cultura). Na segunda-feira, ela animou a conversa de dois convidados, o jurista Oscar Vilhena e o escritor Ferrez, do Capão Redondo.
Em determinados momentos, entra o quadro "TELE-VISÃO", apresentado por Soninha Francine, numa bem-vinda retomada de suas origens televisivas. Como que para compensar a aridez do assunto, ela enfatiza a dicção clara e pausada das idéias básicas, como a luta contra a criminalidade nos meios de comunicação.
Nos intervalos, animações curtas, produzidas por ONGs e/ou produtoras independentes que atenderam ao chamado, trazem um certo respiro.
A diversidade promete crescer ao longo da temporada de resposta. O programa de abertura tratou de abrir um leque amplo de assuntos que cabem dentro de uma avaliação geral dos avanços e pontos fracos na conquista dos mais diversos direitos humanos no Brasil.
Dentre os temas anunciados para a primeira semana estão a comunicação, a diversidade sexual e a questão racial.
Diante da possibilidade da moda pegar, há notícias de que a TV Record e a Rede Mulher, acusadas em ação semelhante, estariam processando o Ministério Público por "conduta desrespeitosa de magistrados em sessões de julgamento".
O desafio para o grupo de admiráveis combatentes que levou a ação à frente é deixar fluir a criação.
Está mais do que na hora das emissoras que não o fazem justificarem as concessões públicas que exploram. Não há nada de complicado nisso, basta pensar duas vezes antes de produzir programas baratos que bebam exclusivamente no discurso ofensivo.


Esther Hamburger, antropóloga e professora da ECA-USP

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