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Última Moda
ALCINO LEITE NETO - ultima.moda@folha.com.br
Comme Geraldo
A grife Comme des Garçons cria linha de camisetas com fotos do artista brasileiro Geraldo de Barros
Pouca gente imaginaria um
encontro tão improvável. Mas
ele aconteceu. A supercultuada
estilista Rei Kawakubo, da grife
Comme des Garçons, se encantou com o trabalho do artista
plástico brasileiro Geraldo de
Barros (1923-1998) e está lançando uma linha de cinco camisetas que estampam fotos feitas por ele nos anos 40 e 50.
As camisetas estarão à venda
nas lojas da grife a partir de janeiro, com preços entre US$
150 e US$ 200 (cerca de R$ 177
a R$ 265). Kawakubo usou trabalhos em que o artista desenhava gatos e outras figuras em
negativos fotográficos que reproduziam imagens de muros.
"Logo que vi as fotos, eu as
achei muito poderosas e belas",
disse a estilista à Folha, numa
entrevista por e-mail -outra
surpresa, pois a discreta Kawakubo raramente fala com a imprensa e é avessa aos assédios
da mídia. Aos 65, ela permanece um dos talentos mais criativos e inquietos da moda, após
ter revolucionado a estética
fashion nos anos 80.
No design das camisetas,
junto às fotos, Kawakubo
acrescentou listras pretas ou
vermelhas e estampou o nome
de Geraldo de Barros em diferentes formatos.
"Levei um susto ao ver o nome dele com tanto destaque",
afirma a artista plástica Fabiana de Barros, filha de Geraldo.
As experimentações da
Comme des Garçons com o trabalho de Barros não vão parar
por aí. Em 2008, Kawakubo
lança também uma série de camisas que estampam os trabalhos mais geométricos do artista, da série "Fotoformas".
FOLHA - Quando foi que a sra. entrou em contato pela primeira vez
com a obra de Geraldo de Barros e o
que mais a tocou no trabalho dele?
REI KAWAKUBO - Foi numa livraria maravilhosa que há em Tóquio, e logo que vi as fotos eu as
achei muito poderosas e belas.
FOLHA - Por que decidiu criar uma
linha de camisetas com as imagens?
KAWAKUBO - Eu realmente
amei as fotos e estou sempre
procurando alguma coisa nova
e forte para as minhas coleções.
FOLHA - Que critério a sra. utilizou
para selecionar as imagens e por
que decidiu usar o próprio nome de
Geraldo de Barros nas camisetas?
KAWAKUBO - Escolhi minhas
cinco fotos favoritas e achei que
seria natural colocar o nome do
autor. Mas, em vez de só acrescentar a sua assinatura, fiz um
layout para o nome, pois achei
que ficaria mais interessante.
FOLHA - As obras que a sra. escolheu são dos anos 40 e 50. O que elas
têm a dizer a nossa época?
KAWAKUBO - Penso que a verdadeira beleza é atemporal.
FOLHA - A sra. gosta de gatos?
KAWAKUBO - Eu tinha cinco gatos. Eu adoro animais.
FOLHA - A sra. já esteve no Brasil?
KAWAKUBO - Nunca estive, mas
adoraria visitar a Bahia e o Norte do país, entre outros lugares.
Muitas imagens vêm à minha
mente quando se fala em Brasil:
a arquitetura, a natureza, o futebol, todos os tipos de culturas
reunidas, a música, a dança...
FOLHA - Não pensa em abrir uma
loja Comme
des Garçons no Brasil?
KAWAKUBO - É muito difícil exportar para o Brasil por causa
das altas taxas de imposto. Estamos observando a situação e
espero começar a vender no
país brevemente. Talvez começando com uma Guerrilla Store
[loja itinerante da grife], se encontrarmos o parceiro certo.
Mas não temos planos para nenhuma loja no momento porque ainda não encontramos este parceiro ideal.
FOLHA - O que a sra. busca em seu
trabalho com moda?
KAWAKUBO - Desde que decidi
criar minha companhia, estou
sempre à procura de algo novo.
Criação para mim significa o
novo, o tempo todo. Sempre fui
livre para fazer o que queria,
sem precisar seguir regras ou
tendências. E
sinto que as pessoas, ao usarem as minhas roupas, também
se sentem livres para expressarem a si mesmas.
FOLHA - Por onde a sra. começa
uma coleção? Pela forma?
KAWAKUBO - Não, sempre começo por uma idéia abstrata. A
forma pode vir logo em seguida
ou bem mais tarde, mas eu inicio sempre com um conceito.
FOLHA - Que conceitos são importante na sua criação?
KAWAKUBO - Liberdade, quebrar as regras, força, começar
do zero, descartar idéias preconcebidas, a maioria está sempre errada.
FOLHA - O que o conceito de imperfeição significa para a sra.?
KAWAKUBO - Eu sempre senti a
beleza que existe na imperfeição, a beleza no inacabado.
FOLHA - O que mais a interessa na
moda e o que mais a incomoda?
KAWAKUBO - Neste momento,
nada mais é muito interessante, infelizmente, e o que não é
muito bom é o poder da mídia e
das grandes companhias que
tendem a ditar o que uma pessoa deve vestir. Gostaria que
houvesse mais designers que
assumissem riscos e não tivessem medo de fazer uma moda
mais criativa.
com VIVIAN WHITEMAN
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