São Paulo, terça-feira, 15 de fevereiro de 2005

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"Serão mais de 16 horas de música"

DA REPORTAGEM LOCAL

A produção do "Ring" em Manaus terá mais de 16 horas de espetáculo. Para a estréia, em maio, seu regente, o paulistano Luiz Fernando Malheiro, fará os primeiros ensaios com a orquestra já no início de março.
Em entrevista à Folha, Malheiro fala sobre a experiência de trabalhar com músicos e cantores brasileiros no reino, até então desconhecido para estes, de Wagner.
Segundo o regente, nas mãos de gente daqui também está toda a criação dos figurinos e dos cenários do espetáculo, desenvolvidos por artesãos da região em uma central técnica de produção criada pelo governo amazonense.
(JBN)

 

Folha - Há registros de uma montagem integral das quatro óperas do "Ring" no Brasil?
Luiz Fernando Malheiro -
Não. Em São Paulo e no Rio foram feitas algumas tentativas há muitos anos. Os paulistanos ouviram muito Wagner em italiano, por companhias vindas da Itália. Companhias estrangeiras se apresentaram no Rio. Mas eram produções integralmente importadas, não produzidas por aqui.

Folha - Como explicar mais encenações de Wagner no Rio?
Malheiro -
Havia uma tradição vinda do Segundo Reinado. D. Pedro 2º era um grande wagneriano e amigo de Wagner, que o cita em sua autobiografia, "Minha Vida". O público do Rio é ainda hoje bem mais participativo e informado que o de São Paulo.

Folha - Das quatro óperas do "Ring", uma só é ainda inédita em Manaus, "O Ouro do Reno". Como é produzir um ciclo tão longo?
Malheiro -
Pelas minhas previsões as quatro óperas darão mais de 16 horas de música. Quando começamos com "As Valquírias", em 2002, o terreno era para nós desconhecido. Foi como um teste, até para saber como as vozes brasileiras iriam funcionar.

Folha - As vozes responderam então a contento?
Malheiro -
O que me encorajou a produzir "As Valquírias" foi uma experiência anterior, ao reger no Rio um "Tannhäuser", com cantores brasileiros (Laura de Souza, Lício Bruno). Por isso que levei adiante o projeto do "Anel" em Manaus. Em 2003, com a montagem de "Siegfried", já estávamos em território conhecido. Não havia mais tanto mistério para a orquestra e para o elenco.

Folha - Por que a insegurança quanto aos cantores brasileiros? Malheiro - Era uma insegurança no fundo injustificada. Havia uma espécie de preguiça e desconhecimento dos maestros e programadores. É preciso conhecer bem as vozes, saber o que elas podem fazer de melhor, e não encaixá-las a esmo nos papéis.

Folha - Qual sua avaliação sobre as gravações integrais do "Ring"?
Malheiro -
A versão de Herbert von Karajan é quase camerística. Os cantores não trabalham a potência da voz; preocupam-se com a interpretação de cada palavra do texto. A versão Georg Solti é mais extrovertida, com elencos maravilhosos. Não sou muito atraído pela versão Baremboin. Gosto muitíssimo da versão de Marek Janowsky e com a Staatskapelle de Dresden, com uma sonoridade muito particular.

Folha - Como está a programação dos ensaios do "Ring"?
Malheiro -
O elenco brasileiro já ensaiou "O Ouro do Reno", agora em janeiro. Eu retomarei os ensaios entre 10 e 20 de março, com vozes e piano. O Aidan [Aidan Lang, diretor cênico] chega no dia 21 de março, e ensaiaremos até a véspera. Quanto à orquestra, começaremos os ensaios já no começo do mês que vem. É cansativo. Em Bayreuth, faz-se o "Ring" com mais de 200 músicos. Há um rodízio. Somos bem poucos por aqui.

Folha - Quantos músicos estarão no fosso do teatro?
Malheiro -
A orquestra tem 75 músicos. Mas teremos extras. Serão, por exemplo, quatro as tubas wagnerianas que virão da Alemanha, o trompete baixo, trombone contrabaixo.

Folha - Cenários e figurinos foram feitos em Manaus?
Malheiro -
Há dois anos fazemos tudo por aqui. O governo do Amazonas criou uma central técnica de produção. Estamos criando uma geração nova de artesãos e pessoas capacitadas.

Folha - Já tem gente de fora comprando ingressos?
Malheiro -
Há sempre muita gente que vem do Rio e de São Paulo. Mas este ano, como haverá o ciclo completo, temos recebido pedidos de reserva da Europa. Há um clube de associações wagnerianas da Escócia, e outros 30 que chegarão da Áustria.


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